"Almoço com um delinquente e corações partidos"

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SOOBIN TERMINA de comer o sanduíche que comprou na cantina, observando o campo de futebol pela janela, o verde se estendendo até o limite de sua visão. Ao contrário de todos os outros alunos espalhados pelo refeitório, Soobin prefere almoçar em um corredor deserto, aproveitando o sol da manhã em seu rosto por conta das enormes janelas do colégio. Um livro já esperava ao seu lado.

A conversa do café da manhã tinha sido tensa, no mínimo. O choque de sua mãe foi enorme ao ver o olho de seu caçula quase preto e com o dobro do tamanho normal. Soobin deu uma desculpa qualquer, fingindo voltar para o quarto, quando na verdade estava no corredor, esperando para ouvir o que seu irmão diria.

Não era bisbilhotar, de jeito nenhum. Soobin era um irmão mais velho preocupado, só isso. 

Basicamente, Huening Kai se envolveu com a irmã de Kang Tae-hyun, um dos grandes encrenqueiros da escola, juntamente com o azulado Choi Yeonjun. Como um bom irmão mais velho, Tae-hyun ficou preocupado com a irmã. Mas o jeito dele de resolver as coisas eram um pouco diferente.

Encurralando e batendo em um adolescente de 15 anos até que não pensasse mais em chegar perto de sua amada irmã.

Soobin fechou os olhos, sentindo o calor do sol no rosto. Não era justo, mas ele não sabia como poderia ajudar seu irmão mais novo. Fazer uma reclamação na diretoria poderia piorar as coisas, e Soobin era fraco demais para um mano a mano. Ser um adolescente nerd era complicado. 

Justamente por estar absorvido em seus pensamentos, Soobin não reparou quando Choi Yeonjun se sentou ao seu lado, silencioso como uma cobra. 

- Cruzes! - Soobin não conseguiu segurar a reação. Imagine estar sozinho, em um lugar agradável, e no momento em que você abre os olhos a própria encarnação do diabo está na sua frente, te oferecendo salgadinhos. 

Yeonjun deu uma de suas risadas roucas, se sentando ao lado de Soobin. O garoto usava o paletó cheio de broches e desenhos por cima da blusa amassada do uniforme e calças pretas com rasgos na altura dos joelhos. Ele respirou fundo, olhando para as janelas a sua frente, como se visse algo que Soobin não pudesse ver. 

Yeonjun comeu seus salgadinhos gordurosos com cara de quem não queria conversar, então Soobin abriu seu livro, ansioso para saber o que aconteceria nos próximos capítulos. Os dois aproveitavam o sol em seus rostos e o fato de que ninguém passava por aquele corredor e ninguém os julgaria.

Nenhum dos dois falou nada durante o tempo em que ficaram sentados lado a lado. Nenhum dos dois se incomodou com isso. E nenhum dos dois queria levantar dali e sair daquele pequeno momento de silêncio que compartilhavam. Mas o sinal tocou, e os alunos inundaram os corredores como uma enchente, com pressa de ir para a próxima aula.

Yeonjun se levantou e foi embora deixando Soobin com seus pensamentos de novo. 

(...)

A biblioteca estava vazia. Todos os alunos já tinham ido embora, até a senhora Yoon. Eles já teriam ido, se Yeonjun não tivesse esbarrado com um garoto com quem tinha... assuntos. 

Uma estante inteira estava bagunçada, livros caídos no chão e fora do lugar. Yeonjun a usara de apoio para bater no garoto, que deveria ser da idade de Huening Kai. Qual era o problema dessa gente? Soobin se sentiu enjoado. 

Duas horas depois do incidente, Soobin ainda sentia a tensão em suas veias se arrastando. Sentado de frente para seu colega, ele agia com cautela ao organizar os volumes de livros. O máximo de contato que faziam era olhares rápidos de Soobin para Yeonjun, o julgando.

Yeonjun não falava nada há duas horas. Pelo menos ele estava organizando os livros direito.

- Eu sei que você tá me olhando, - Ele disse, de costas para Soobin, colocando um volume na estante  - não vou te bater.

Soobin respirou fundo, os ombros parecendo mais leves, o que arrancou uma risada anasalada de Yeonjun. 

- Pelo menos não agora.

Soobin escolheu pensar que era uma brincadeira.

- Esse garoto... por que bateu nele? - Ele perguntou, com as palmas das mãos suadas. E se estivesse perguntando demais?

- Ele... falou uma coisa um dia desses. Era uma coisa ruim, bem ruim na verdade. Mas eu não precisava ter batido tanto. Às vezes eu me excedo. - Yeonjun explicou.

Um garoto sem controle de raiva sozinho com Soobin, um fracote alto demais. Ótimo.

Pela expressão no rosto de Yeonjun, parecia algo que ele não compartilhava com qualquer um. Então por que contar para Soobin?

- Então você... - Soobin começou, sendo interrompido por Yeonjun.

- Sem mais perguntas, bibliotecário. 

Os dois ficaram quietos até o último livro ser arrumado, quando já estava escuro. 

(...)

Huening Kai estava embrulhado em seus lençóis, como fazia quando pequeno. "Aqui é seguro" ele dizia para Soobin toda vez que o mais velho chorava. Ele guiava o irmão para seu lugar seguro com sua mãozinha fofa, desesperado pelas lágrimas do irmão.

Agora, Soobin tentava consolar o irmão, sem a mínima ideia do que fazer. Ele já havia gostado de pessoas, claro. Mas o sentimento ia embora tão ligeiramente quanto chegava. E isso, sem dúvida, era diferente do que seu irmão mais novo estava sentindo.

Era como se uma parte de Kai tivesse sido arrancada e não voltaria mais, como se tivesse perdido sua bússola, seu norte.

Soobin suspeitava que o irmão talvez perdesse a inocência infantil que ainda carregava no sorriso e nas brincadeiras. 

- Ei. - Soobin chamou, tentando não pensar em seu irmão deixando de ser uma eterna criança - Quer assistir um filme?

- Não. - A voz do irmão embargada em lágrimas. Como ele chorava com um olho roxo?

- Quer gelo?

Uma mão saiu furtivamente do emaranhado de lençóis, pegando a bolsa de gelo da mão de seu irmão e logo sumindo. Soobin sorriu.

- Qual a previsão de amanhã? 

- Abafado e nublado. - Kai respondeu, bufando.

Talvez nem tudo estivesse perdido, certo?. Enquanto seu irmão ainda brincasse sobre a previsão do tempo, ainda haveria salvação. Ele saiu do quarto, deixando seu irmão sozinho.

- Como ele está? - Sua mãe perguntou, preocupada e ligeiramente descabelada. Ela não sabia o que dizer para seu filho nem o que fazer, então mandara Soobin tentar conversar com o irmão. Era melhor do que a sensação agoniante de saber que seu filho estava sofrendo e não podia ajudá-lo.

- Acho que ele vai superar. - Soobin respondeu, um pouco incerto.

(...)

Muito obrigada pelas 200 leituras e por todos os comentários, me motivam demais!

The book of you and I • YeonbinOnde histórias criam vida. Descubra agora