CAPÍTULO 9: Echos

60 12 11
                                    


Voltei gente. Desculpe o atraso mas a vida se meteu no caminho. Tivemos uma perda na família e infelizmente não consegui parar para escrever e nem tive cabeça para isso. Mas cá estou eu. Espero que a espera valha a pena para vocês, vamos lá.


____


– FUTURO –


O calor está tão forte que quase não há ninguém na rua. Estão todos escondidos dentro de suas casas, aproveitando o conforto do ar condicionado.

As poucas pessoas que se aventuram do lado de fora passam com olhares concentrados, como se estivessem cumprindo algum tipo de objetivo inadiável. Todos suam, afinal não há como não suar com aquele calor estagnado, abafado, que cobre a cidade.

Ainda sim, a menininha de cabelos escuros parece não se incomodar com o clima. Ao contrário, ela brinca com sua cachorrinha, correndo de um lado para o outro no jardim, completamente alheia ao mundo ao seu redor.

Sua risada jovem e os latidos de sua companheira quebram o silêncio da vizinhança aumentando a sensação de paz proporcionada por mais um dia completamente normal.

Enquanto ela brinca com o cachorro, uma Golden Retriever batizada de Picasso, sua mãe observa a cena pela janela de sua casa com absoluto encantamento.

Ainda era uma sensação estranha para ela se sentir tão viva e plena ela graças à normalidade da vida comum que substituiu o peso dos anos da sua existência anterior. Ela nunca se imaginou vivendo uma vida tão doméstica, jamais imaginou que teria oportunidade de experimentar algo assim.

Todos os anos de luta a tornaram uma mulher dura, introspectiva. Seus desejos e vontades sempre foram voltados à proteção do seu povo, do seu país, dos seus companheiros. E por muito tempo ela se resignou a acreditar que o único fim possível para si era a morte. Ela poderia alcançar a paz, mas jamais realmente a vivenciaria, afinal ela não era digna disso. Não com tudo que fez.

Durante a guerra, a vida da mulher não tinha sido nada senão luta, sobrevivência, horror, desespero e morte. Agora? Essa realidade era tão distante que mais parecia um pesadelo.

Um pesadelo que marcou sua alma e seu coração de tal forma, que ela sabia que nunca seria realmente completa. Não com tudo que perdeu, viu e fez massacrando sua consciência e sentimentos.

Ela tinha sido agressora, mas também foi agredida.

Ela foi monstro, mas também foi vítima.

Ela tirou, mas também perdeu. Muito.

Mesmo agora, depois de tanto tempo, os sonhos daquele tempo ainda tomavam suas noites. Ela ainda acordava gritando e chorando e mesmo acordada sua mente às vezes divagava, a arrastando para um tempo de dor, sangue e fogo.

Coisas simples como fazer compras, comer, andar pelo seu jardim podiam subitamente arrasta-la de volta para aquele dia. Aquele maldito dia.

Então, de certa forma, ela continuava a lutar. Mas sua guerra era interna, espiritual, emocional. Continuar vivendo foi uma das escolhas mais difíceis que ela tomou. Depois de tudo que aconteceu ela quis morrer, tendo se convencido que o mundo seria um lugar melhor sem ela. Afinal, ela era uma figura de passado finalmente superado e como tantas coisas daquele tempo, ela sentia que também precisava desaparecer.

Aquela menininha no jardim, que rodopiava alegremente pela grama, jogando uma bolinha rosa para a cachorra buscar, foi quem salvou sua vida. Ela tornou-se seu propósito, sua razão de ser e, de certa forma, completou o vazio deixado por tantas perdas.

GUERRA INTERNAOnde histórias criam vida. Descubra agora