Lover, be good

Um

Why were you digging?
What did you bury
Before those hands pulled me
From the earth?
[Like Real People Do; Hozier]

James encarou a varinha em suas mãos, movendo os dedos pela madeira cuidadosamente polida. Perfeita. Onze polegadas de comprimento e mogno, flexível, perfeita para Transfiguração.

Ele faz uma tentativa; agarra a varinha, sacode, desenha e agita uma segunda vez. Nada. Sua situação é humilhante.
É o pior dos sentimentos, o da impotência. Ele conhece a magia e ele sente a magia, mas não consegue acessá-la. Não vem dele.
É como tentar olhar através de um vidro embaçado ou sentir a água em um aquário, sem, no entanto, poder tocá-la.

James guarda a varinha cuidadosamente abaixo do travesseiro e deita na cama. Ele cuida da varinha uma vez por semana desde os 12 anos, uma prática um tanto inútil, já que James mesmo não vai usá-la, mas que ele não consegue largar.  Seu quarto é limpo, organizado e claro. Ele adormece em algum momento antes das dez horas da noite, cansado de um longo dia de trabalho.

A manhã seguinte é exatamente como seus outros dias. James acorda com o raiar do sol, se apronta para trabalhar numa biblioteca trouxa. A casa é sempre silenciosa, seja nas manhãs iluminadas ou nas noites frias. É possível ver Londres através da janela de sua cozinha.
Ele bebe um café logo cedo, então trabalha até às 13 horas, tira 30 minutos para lanchar algo na St. Beans, uma cafetaria que fica logo na esquina. Seu emprego não é ruim. Ele gosta de conversar com as pessoas e organizar as prateleiras.
Não é como se James realmente precisasse do dinheiro de verdade.

O dia seguinte é uma quarta-feira. Ele não trabalha nas quartas, mas mantém uma rotina. James acorda com o Sol, se apronta e saí para correr. Quase duas horas se passam até ele voltar para casa, tomar um café da manhã e tomar banho.
Uma edição do jornal trouxa e a diária do Profeta Diário descansam em sua mesa, ambos intocados. Ele pega o The Guardian primeiro para ler. Quando terminado, James dá uma olhada na manchete do Profeta Diário, que consta: "MILLICENT BAGNOLD ASCENDE; MINISTÉRIO DA MAGIA GANHA NOVA CARA..."

Com um suspiro, James abandona o papel. O relógio na parede marca 10 horas da manhã. Ele tem um compromisso para às 11:30.

Em seus 19 anos, James só visitou a Sociedade de Apoio aos Abortos quatro vezes na vida, todas elas na companhia de seus pais. Um ano e 4 meses mais tarde, hoje é a terceira vez que irá sozinho. Ele não se sente confortável de volta ao mundo bruxo desde a morte de seus pais, Fleamont e Euphemia Potter. Não resta nenhum outro Potter e ele perdeu contato com seus amigos próximos. Os encontros da S.A.A são sua última conexão com o mundo da magia.

James viveu no mundo bruxo até pouco menos que 2 anos atrás, mas teve muito contato com trouxas. Seus pais acreditavam que ele era, sim, um bruxo, mas os 11 anos descobriram que ele era um bruxo abortado. Seu único herdeiro, um Aborto! Euphemia e Fleamont o amavam, James sabe disso, mas é difícil. Abortos não são bem vistos pela sociedade bruxa, em particular uma tão purista quanto a atual.
Ele gostaria de ter frequentado Hogwarts, sonhara com isso por anos. E, no entanto, a realidade é cruel, pois aqui está ele, a caminho do encontro da S.A.A.

Lily não sabe se tomou a decisão correta. Ela confia em Dumbledore e confia em seus companheiros, Marlene McKinnon, Dorcas Meadowes, Sirius Black, Remus Lupin e Peter Pettigrew. Ela confia na Ordem.

Todavia, Lily se sente extremamente desconfortável nesse lugar. O prédio é, de longe, um edifício antigo, mas seu interior é limpo e bem cuidado, pintado em cores como branco gelo e violeta. Lustres decoram os corredores e os salões.
Ela sabe que abortos são desprezados pela sociedade bruxa, mas a S.A.A é tão elegante quanto qualquer mansão de sangue-puristas – Lily pode confirmar, ela já esteve em uma porção dessas trabalhando disfarçada.
Se não surpreendente, ela quase pode entender as intenções por trás de todo o glamour. É como se quisessem passar que não precisam de pena e que estão muito bem. Abortos são minorias e marginalizados na sociedade bruxa, mas a Sociedade de Apoio aos Abortos parece querer mostrar uma realidade diferente para esse grupo.