Depois de tirar algumas fotos - e não gostar de nenhuma - me peguei pensando em meu sorriso. Desde pequeno sou uma pessoa sorridente, qualquer gracinha sempre me tirou um sorriso. Eu arriscaria até mesmo dizer que a posição natural de minha boca é um leve sorrisinho.
Porém, de alguns anos pra cá, comecei a evitar meu sorriso. Por que? Bom, à época meus dentes eram separados por verdadeiros abismos de gengiva vazia, e isso, que nunca me incomodara muito na infância, começou a me tirar o conforto do espelho e da fotografia. Prático como sou, e sortudo com um pai cirurgião dentista, logo coloquei meu aparelho. Era de mármore, quase transparente. À distância, invisível. Mas por mais um período deixei de sorrir, já que aparelhos eram feios, é claro. Como é que seria bonito aquilo que os nerds dos filmes americanos, constantemente maltratados, invariavelmente tinha em suas bocas?
Pois bem, passado algum tempo meus dentes se juntaram e tirei meu aparelho. Logo antes de ir para a Irlanda, foi puro êxtase. Devo ter sorrido a viagem inteira. Não só pela alegria, mas também pela crença em minha beleza e em meu lindo novo sorriso. Mas isso também logo me deixou. Agora, olhava meu sorriso e achava meus dentes pequenos demais. Curioso! Eu, que sempre tinha chamado atenção por ter dentes grandes, cresci para naquele momento achar meus dentes pequenos. Mais uma vez me aproveitei da profissão de meu pai e fiz próteses de resina. Enfim um sorriso perfeito. Nem eu, como sempre, meu maior crítico, conseguia achar defeitos. Dentes alinhados, do tamanho certo, brancos como neve.
E então voltei a não gostar de meu sorriso. Mas por que? Podes me perguntar incrédulo, caro leitor. Então lhe digo: percebi que eu sorria demais. Demais de frequência? Certamente não. Demais de modo. Os cantos da minha boca se abrem muito; um sorriso "coringado", como sempre disse minha mãe, ao me elogiar. Meus olhos se estreitam, meu rosto se deforma e deixo várias galinhas sem apêndices locomotores (afinal de onde viriam os pés que se formavam nos cantos dos meus olhos?). Sorria em demasia. E de novo voltei a não sorrir mais.
Até o dia de hoje, em que num momento de percepção mais aguçada, me pergunto se isso tem cabimento. Será mesmo que não gosto do meu sorriso? E por que só do meu? Pergunto isso lembrando de uma professora de minha escola. Uma professora muito simpática, sempre sorrindo, sempre rindo, mas com dentes tortos, que pena. Pena? Sempre notei seus dentes tortos, mas nunca achei seu sorriso feio. Muito pelo contrário, sempre achei seu sorriso lindo. Cheio de energia, lotado de paixão; completo até a borda daquilo que é essencial: felicidade. Felicidade. Acho que agora percebo algo. Estou muito longe de odiar meu sorriso. A verdade é que sou averso à minha felicidade. E pragmático como sempre fui, decidi por expressar tal aversão em relação àquilo que representa minha felicidade, àquilo que estampa minha felicidade em meu rosto, que pena, e dessa vez, sem interrogação.
Ainda tenho um caminho longo a percorrer para aceitar a minha felicidade. Mas agora que percebo tudo isso, tentarei não me conter tanto e dar tantos sorrisos quanto puder; meus sorrisos que, de tanta emoção, não cabem só nos meus dentes, se espalham pela minha cara inteira. Talvez o mundo fosse um lugar melhor se todos nós nos permitíssemos a dar "sorrisos de rosto inteiro", como gosto de chamá-los, pelo menos de vez em quando, não acha? Então sigamos. Sorrindo, é claro.