*** capítulo sem correção ortográfica ***
Thales
Eu não quero solta-la, sei que deveria, mas não consigo, não posso e isso me assunta tanto que sinto que vou sufocar.
Enfio meu nariz nos seus cachos, inalo seu cheiro e sinto meu peito se acalmar, estou em casa, aqui, segurando essa garota em meus braços, sentindo o seu coração batendo contra o meu, sabendo que não tenho direito nenhum de estar aqui.
Depois de longos e infernais oito meses eu estou de volta ao único lugar onde me sinto em paz, e por mais que eu saiba que toda a minha coragem está camuflada pela escuridão da noite e do ciúmes que senti ao vê-la conversando com Duda, eu não me importo, decidi que hoje vou me permitir sentir, vou baixar minha guarda e vou deixar Ayla entrar, só por hoje, eu preciso disso.
Minha vida nunca foi uma maravilha, ao menos desde que minha mãe escolheu colocar aquele homem na nossa casa, mas os últimos oito meses foram horríveis, por pouco não deu um basta em tudo e por muito menos não cometi um crime e silenciei a porra daquele coração maldito, mas eu fui forte, mais do que eu imaginei que poderia ser e durante todos os dias em que eu a vi e não pude falar com ela, por mais que eu quisesse, e agora depois de ouvir toda a mágoa em suas palavras, por achar que eu a afastei, só eu sei a força que tive que ter para protege-la da maldade e inveja, da sujeira e tudo o que de pior pode existir no mundo.
Eu a protegi e o preço que paguei para isso foi alto, mais alto do que achei que poderia suportar. Não sou mais o Thales que ela acha que sou, não vejo mais a beleza no mundo, não tenho mais sonhos, apenas objetivos e embora possa parecer que sejam a mesma coisa, hoje eu sei que sonhos são desejos da alma que nos fazem sorrir enquanto objetivos são metas estipuladas para que tenhamos um motivo para lutar.
Hoje não sonho mais, hoje eu apenas luto.
Com todas as minhas forças, com todo o meu coração, não por mim, por Ayla e por Tati, alguém que não pode se defender e que mesmo que não pareça, só tem a mim nessa merda de mundo.
Sinto meu corpo estremecer ao pensar nelas, e em um movimento impensado, aperto Ayla para mais perto de mim e beijo seus cabelos uma e outra vez, ela enfia o nariz em meu peito e tenho vontade de parar o tempo para que possamos ficar assim para sempre.
— Senti falta de te abraçar. — ela sussurra com o rosto ainda enterrado em meu peito.
Deus... parece tão certo estar assim com ela. Como isso é possível mesmo depois de tudo?
— Eu também. — admito, baixinho quase inaudível, como se o mal estivesse aqui e pudesse ouvir minha confissão. Por hábito olho em volta, mesmo sabendo que estamos sozinhos, olho para a janela só para ter certeza de que ela continua fechada e que continuamos seguros aqui dentro, apesar de saber que eu a conferi umas dez vezes antes dela entrar. O medo tenta me atingir e a aperto ainda mais, Ayla parece não se importar e eu agradeço silenciosamente.
— Não faz mais isso. — ela diz com o rosto ainda pressionado em meu peito, sei que ela está ouvindo o meu coração acelerado e não me importo porque também consigo sentir a força com que o seu está batendo. Mesmo que eu saiba que seja por motivos diferentes.
— Me desculpe. — é tudo o que consigo dizer porque não posso prometer nada a essa garota, todas as minhas promessas já foram dadas a alguém que não as merece, tudo o que tenho e o que sou foi arrancado de mim e hoje só me resta a dor da culpa e da saudade que sinto dela, mesmo que ainda estejamos abraçados.
É tudo minha culpa.
Se eu tivesse sido mais forte, mais corajoso...
Ayla parece sentir minha agitação e se afasta, sinto falta do seu toque e seguro suas mãos para garantir a mim mesmo que ela não fuja, ela sorri enquanto seca o rosto e quero morrer por faze-la chorar.
— Como vão suas notas? — ela pergunta enquanto olha para nossas mãos entrelaçadas, fingindo que está tudo bem.
— Uma bosta.
— Thales... — ela chama minha atenção.
— Tudo bem, não ligo, ano que vem vou abandonar a escola. — ergo os ombros como se não fosse nada demais, mas no fundo cada vez que penso na minha incapacidade de aprender algo, me sinto fraco e envergonhado.
— De jeito nenhum! Não vou permitir que você faça uma coisa dessas. — ela eleva o tom de voz um pouco e olho para a porta lembrando-a que é muito tarde e provavelmente somos as únicas pessoas acordadas nessa casa.
— Você não pode me impedir.
— Ainda podemos tentar. — ela espalma uma mão em meu peito e meus olhos caem sobre elas. Um ato que sempre me deixa nervoso, mas que hoje acalenta meu coração. — Se você quiser eu...
— Não Ayla, está decidido. — interrompo-a e vejo seu rosto entristecer e sua mão cair ao lado do seu corpo.
Me toque Ayla, por favor, me toque...
— Porque você está fazendo isso?
— Porque é o melhor. — estico minha mão e seguro uma mecha rebelde do seus cachos enrolando-o em meu dedo e me distraindo dos seus olhos cheios de piedade.
— Para quem? Porque com toda a certeza do mundo não será para você.
Ergo os ombros mais uma vez e ela bufa.
— Qual será a próxima coisa que você vai abandonar? — ela pergunta com a voz cheia de ira. — O futebol? Sua família?
Ah se você soubesse...
— Eu não tenho família. — solto seu cabelo, sua mão e me afasto sentindo a raiva começar a ferver dentro de mim, ela não sabe do que está falando, se soubesse com certeza não estaríamos tendo essa conversa agora, ela provavelmente sequer estaria falado comigo aqui no seu quarto.
— Como assim? E sua mãe? Sua irmã?
Os olhos doces e inocentes de Tatiana surgem em minha cabeça, o medo que sinto cada vez que saio de casa e a deixo sozinha me faz sufocar e quero fazer com que Ayla pare de falar. Ela não sabe de porra nenhuma, escola não é nada diante de todas as merdas que tenho vivido.
— Eu não quero falar sobre isso. — esfrego o rosto sentindo o calor subir por minhas bochechas enquanto tento não gritar com ela. — Dá pra parar de falar sobre família e escola?
Caminho de um lado para o outro tentando me acalmar, Ayla puxa minhas mãos, estou tremendo, agitado e com tanta raiva que não consigo sequer me controlar, ela pousa uma mão em meu rosto me fazendo parar de andar.
— Tudo bem, não vamos falar sobre isso agora. — ela volta a segurar minha mão. — Vem cá, vamos nos sentar, conversar um pouco, estou com saudades de você.
Ayla me puxa para a cama e me deixo levar, olho para o lugar onde passamos tantos momentos juntos, mas hoje não sou mais o garotinho que deitava ao lado dela e ficava inventando histórias de terror, nem mesmo o moleque tranquilo e calado que adorava dormir ouvindo o som da sua voz enquanto ela lia um dos seus livros para mim, hoje eu sou o pecado e enquanto observo ela se sentar dando espaço para que eu possa ficar ao seu lado eu penso em todas as coisas que se faz em uma cama, e quando a luz alaranjada do abajur ilumina seu corpo fazendo com que ela se pareça com algo sobrenatural, eu me atento a suas pernas, ao seu shorts pequeno que sobe quando ela cruza as pernas, a camiseta branca velha puída, a luz me permitindo ver que ela está sem...
— Eu não posso fazer isso. — puxo minha mão com força me afastando dela, imagens sujas invadem minha mente e não quero pensar nisso. Vou até a janela e me apoio nela apertando a parede com força como se pudesse move-la de lugar com a força da minha raiva. — Eu não deveria ter vindo aqui. — fecho meus olhos e aperto-os com força, tentando me impedir de pensar, de sentir, de lembrar...
— Thales. — ela sussurra meu nome enquanto se aproxima colocando-se entre mim e a parede.
Deus ela parece tão delicada, tão pequena.
— Não, por favor não. — repito em uma súplica enquanto ela tenta me acalmar.
Mas meu corpo parece ter vontade própria e ele se agita com a proximidade de Ayla, algo que me deixa confuso, envergonhado... não era pra acontecer.
Não consigo entender mais nada.
— Thales olhe para mim, sou eu, sua amiga, olhe para mim.
Faça parar Ayla, por favor, faça todas essas coisas ruins pararem de me atormentar.
— Eu não posso mais fazer isso. — aperto ainda mais os meus olhos, não quero olhar para ela, não quero olhar para seu corpo, não quero sentir...
— Tudo bem, tudo bem. — ela segura meu rosto com suas mãos delicadas enquanto continua sussurrando para mim que vai ficar tudo bem. Me concentro no calor dos seus dedos em minha pele, na delicadeza do seu toque e de como ele é diferente do peso da mão que tocou meu rosto da última vez, tento não pensar, não quero pensar, não posso fazer isso aqui.
Ayla puxa meu rosto para seu ombro e me deixo levar, ela acaricia minha nuca lentamente enquanto diz que está aqui e que sempre estará.
— Meu Deus Thales, o que fizeram com você? — ela sussurra em meus cabelos, mas ela sabe que não terá uma resposta para isso, eu morreria antes de contar a ela as coisas que me tornaram o que sou hoje. Porra eu morreria se precisasse ver o seu olhar para mim se soubesse...
— Me desculpe. — digo agarrando a barra da sua camiseta em meus punhos e puxando-a para mais perto de mim com tanta força que sinto o tecido se rasgar. — Me desculpe mas eu não posso.
— Tudo bem. Tudo bem... — ela beija meus cabelos e apoia a bochecha na minha, estamos tão perto um do outro que posso sentir o calor do seu hálito enquanto ela continua me dizendo que está tudo bem.
Ficamos um longo tempo assim, sua mão em minha nuca, me sustentando e me acalmando, minhas mãos em sua camiseta, como se ela fosse o que me mantem em pé e o som da sua voz preenchendo meu corpo e me ajudando a ficar calmo.
Sinto meu coração voltar ao normal lentamente enquanto as imagens das quais não consigo fugir dão lugar a ela, apenas ela.
— Ayla. — sussurro seu nome em seu pescoço quando finalmente me acalmo.
— Hum. — ela diz baixinho e o som soa quase como um gemido.
— Você poderia ler para mim?
Sinto a risada se formar em sua garganta e quando ela me empurra para poder olhar em meus olhos tenho a doce ilusão de que tudo pode ser diferente, que eu ainda posso ser o garotinho que gosta de inventar histórias ruins, ou o moleque que adormece ao som da sua voz, eu posso até ser o garoto que acaba de descobrir o primeiro amor e que ainda não conseguiu esquecer o beijo que deu na sua garota porque foi o primeiro e que mesmo que tenha sido uma merda, foi o melhor beijo de toda a sua vida. sempre será.
Ayla se afasta indo até a prateleira e pegando o livro que eu estava mexendo agora a pouco. Ela volta para mim segurando-o em seus braços como se fosse um tesouro precioso, eu amo a forma como ela é apaixonada por histórias. Como ela sorri e chora, se surpreende e passa dias falando sobre pessoas que sequer existem e nesse momento sinto ciúmes de seus livros, pois eles podem dar a ela muito mais do que eu jamais poderei dar.
— Senta aqui. — ela bate no chão ao seu lado e faço o que ela pede me sentando no piso frio e apoiando a cabeça na parede enquanto sinto a familiar sensação de ouvi-la folhear as páginas e limpar a garganta antes de começar a ler.
— Um dia eu serei um homem muito rico e comprarei todos os livros do mundo para você. — olho para minha amiga e o brilho nos seus olhos é algo que dinheiro nenhum no mundo paga, e nesse instante enquanto ela revira os olhos sem acreditar no que estou dizendo eu guardo esse momento em meu coração.
— Eu não quero livros se eu não tiver você para poder ler eles.
— Mesmo assim, eu o farei.
Ela respira fundo e vira uma página ignorando a verdade de que não estarei aqui para que ela leia para mim.
— Seu bobo, fica quieto senão eu não leio.
Ela se ajeita e vira a folha parando no início de tudo.
“A cabeça da garota estava apoiada em uma pequena pilha de folhas de tom marrom-alaranjado. Os olhos amendoados estavam fixos na copa de figueiras, faias e carvalhos, mas não enxergavam os raios de luz que tentavam atravessar os galhos, salpicando o chão do bosque de dourado...”
Fecho meus olhos e me concentro em sua voz, percebo nesse momento que ela sempre foi meu bote salva vidas, minha conexão com o mundo, minha paz. Enquanto ouço o som das páginas sendo viradas sinto sua mão se aproximar da minha, seus dedos se entrelaçarem aos meus e seu polegar fazer longos e preguiçosos círculos na minha mão, o tempo passa e ela continua lendo, já não consigo mais saber o que está acontecendo e não tem problema, amanhã ela vai me contar tudo enquanto vamos a escola juntos como dois adolescentes normais, ela vai me xingar por ter adormecido mais uma vez e vai jurar que nunca mais vai ler para mim, eu vou sorrir, talvez seja o único sorriso do dia, mas será com certeza o sorriso mais feliz do mundo.
Ao menos é assim que eu quero acreditar que será.********************************
Olá pessoal!!!
Finalmente segunda feira chegou e mais um capítulo cheio de emoção e amor, muito amor.
Pouco a pouco os sentimentos de Thales se tornam mais claros para nós, embora ainda sejam uma incógnita para Ayla.Será que nossa garotinha vai conseguir trazer nosso menino machucado de volta através das palavras?
Beijos e acho que essa semana teremos capítulo Extra de 6k.
Então... até lá.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Um Milhão de Promessas - DEGUSTAÇÃO
Romance*** ATENÇÃO! POSTAGENS INICIADAS NO DIA 21/09/20 *** SINOPSE: As vezes, quando o caos ameaça me enlouquecer, quando minhas pernas ardem pelo esforço exigido por mim, quando a dor já não é mais capaz de silenciar o ódio que pulsa em minhas veias eu...