Vai ter que rebolar.

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_Parabéns para mim, parabéns para mim.... Parabéns para.... Para...
Eu cantando depois de quatro doses de vinho, nunca fui de beber muito, na verdade a única bebida que me desce é vinho e muito pouco.

Nos reunimos no apartamento de Jonas que era maior que o meu e o de Dália e onde meus pais tinham um quarto só para eles. Não ficava muito longe, passamos o fim de semana juntos, para minha família não importa conforto, importa que estejamos juntos, passei dois dias dormindo no chão da sala do meu irmão junto com Nathany e Felícia, elas sentiam-se num acampamento e me acordavam fazendo cócegas no nariz.

Aqueles dias e as palavras de senhor Ícaro me ajudaram definitivamente superar as feridas que Kalleb causou. Quando Ricardo e Dália ficaram sabendo o que aconteceu entre nós, pediram mil desculpas, os confortei, afinal, não está escrito na testa de ninguém quem presta e quem não.

Dália e mamãe encomendaram um bolo para mim na forma de livro. Estava muito lindo e gostoso, comi muito, decididamente preciso voltar a aeróbica.
Foi um aniversário bem diferente, mas sinto que não serei a mesma a partir de agora, tomarei mais cuidado, não vou ficar ansiosa por um namorado, nem vou ligar se alguém se incomodar com meu peso ou com meu jeito, os incomodados que se retirem. Tenho vinte e quatro anos agora e sou uma nova mulher.
_ Tia vai mais para lá, a senhora toma o sofá todo! Disse Felícia.
_ O que garota, tá me chamando de gorda, me respeita!
***

_ Oi bom dia! Falei com desânimo.
_ Bom dia! Faz tempo que você não aparece, a gente já começou a meia hora. Disse Gabriel o Professor de aeróbica, que tem a bunda mais dura que já vi, nem Georgina ganha dele.
_Ai Gabriel, que horas você começou, as quatro da manhã? Perguntei.
_ Não querida as seis em ponto. Disse ele.
_ Nossa, eu tenho que acordar às cinco e meia para chegar a tempo, é muito cedo Gabi.
_ Porque você não vem a noite Mona, temos aula de dança. Disse ele animado.
_ Que dança? Perguntei
_ Do ventre, imagine você de odalisca, um arraso! Disse ele.
_ Tá brincando né?!
_ Não querida, a dança do ventre é ótima. Venha a noite, e não quero um não, agora volta pra casa, vai dormir e dá um jeito nesse picumã. Disse ele voltando para a coreografia.
... Quem dera eu dormir, tenho que ir trabalhar, dança do ventre? Gabriel está louco, eu morro de vergonha de mostrar meu corpo. Espera, mas agora eu sou uma nova mulher e não tenho vergonha de mim. Eu vou fazer essa dança.

***

_Filha você vai voltar com a gente, já que, nas férias você não vai trabalhar? Perguntou mamãe.
_ Ainda não sei mãe, na verdade queria conseguir um emprego temporário nas férias. Falei.
_ Antoniete, você tem um Curso de Inglês não é? Perguntou Jonas ao ouvir nossa conversa. Respondi que sim.
_ Lá no hotel vão precisar de gente nesse período de alta estação, você poderia deixar seu currículo lá. Disse ele.
_ Nossa, Jonas! Seria ótimo. Vou fazer isso sim.

Faltavam duas semanas para as férias do meio do ano, normalmente, os pais viajavam e as crianças queriam que estudos, professores e escola fosse tudo para o espaço, e eu iria para a rua se não tivesse dinheiro para pagar o aluguel.

Deixei meu currículo no hotel Imperium um dos maiores da cidade, nem que fosse como camareira, mas eu precisava de um bico nessas férias. Graças ao meu curso de inglês que fiz a força durante a faculdade, já que, eu não era muito boa e só fiz porque tínhamos que somar horas a mais para nos formar, eu tinha mais chances, segundo Jonas que também já trabalhava lá a algum tempo como manobrista.

***

Hoje encontrei Rosa no apartamento de Davi,  ele estava no trabalho, Georgina havia saído para resolver algo na loja, Marlene havia saído mais cedo e Rosa subiu para me esperar com Ana. Eles vivem jogando a menina de um lado para outro, como se fosse uma bola. Estou detestando isso. Confidenciei com Rosa enquanto a inocente fazia a atividade.

Fim de aula, fui direto para o centro cultural onde acontecia a aeróbica, será mesmo que eu vou conseguir dançar essa tal dança do ventre, me questionava o tempo todo, mas eu precisava fazer alguma atividade física para minha própria saúde, ultimamente estava me sentindo muito cansada e além do ultimo golpe que levei, minha auto estima ainda estava oscilante. 

_Bem vindas queridas! Depois de tantas pedirem, em fim, hoje começaremos a aprender a belly dance ou dança do ventre. E quem vai nos ensinar é nossa querida madame Najla. Disse Gabriel e a mulher entrou na sala.

... O que? ela é gordinha também, como assim? pensei surpresa.

_Eu sei que muita de vocês se surpreenderam quando eu entrei e viram que eu sou gorda, mas vocês vão ficar mais surpresas agora. E Najla começo a rebolar o quadril de uma maneira espetacular, os movimentos eram lindos, as mãos, as pernas, ela era graciosa e linda naquele traje cheio de pedrinhas brilhantes. Ela dançou por dois minutos e finalizou dobrando a coluna para trás que em mim doeu só de olhar. 

_ Vocês não precisam ser magras para dançar, vocês podem dançar o que quiser, basta querer dançar, só tem que se permitir na dança. Não existe o padrão que as pessoas colocaram por ai de que dançarinas da dança do ventre devem ser magra, de corpo escultural, cabelos lisos até a cintura e lindas como deusas, as vezes a mulher pode ser linda sim, da maneira que falei, mas não é uma boa dançarina. 

A dança do ventre tem origem nos países orientais e lá os homens gostam de mulheres cheinhas com as curvas macias, fartas, porque isso dá uma ideia que serão boas mães. Infelizmente em nosso país mulheres como nós, não são bem vistas e muitas de nós se acabam de tanto dançar em salas fechadas, mas não tem coragem de dançar para serem vistas, porque gorda não pode dançar e julgam dizendo: que mulher sem noção, cobre essa barriga, ninguém é obrigado a ver essa gorda dançando.  Queridas dança quem quer, dança magra, gorda, loira, morena, alta, baixa e daí se falarem, você tem que ser feliz do jeito que é, você é mulher e também é bonita, é sexy e pode rebolar na hora que quiser.

 Agora se você quer ficar parada e deixar que os outros te digam quem você é, fique, mas aqui ninguém vai dizer quem nós somos, aqui quem diz quem somos, somos nós e aqui vocês vão aprender que o primeiro passo para aprender a dançar é se amar e aceitar seu corpo do jeito que ele é.

Aquele discurso me motivou assim como a todas as mulheres que estavam lá, fiquei toda arrepiada e tive vontade de chorar e rir ao mesmo tempo, Gabriel ligou o som e nossos sorrisos foram abafados pelo som envolvente das músicas orientais , logo nos posicionamos e começamos a fazer os primeiros passos. 

***

Fazia tempo que eu não me sentia tão animada com algo, era um presente para mim. Madame Najla era muito inspiradora, ela tinha por volta de quarenta anos, mas rebolava como ninguém, perfeita. 

Cheguei em casa ainda cheia de adrenalina, me segurei para não comer besteira, fiz um lanche mais light, vi um pouco de TV e fui deitar. 

Meus últimos pensamentos da noite: 

... Vou ter que rebolar também para poder pagar o aluguel do próximo mês, espero conseguir o emprego. 

... Os homens orientais gostam de gordinhas? Porcaria, nasci no país errado.

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