Capítulo IV

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Cansado e triste, Kael chegou a casa de Dionísio cedo, e assim que entrou na cozinha assustou-se com seu chefe, debruçado sobre a bancada e comendo o prato que havia preparado para o jantar da noite anterior, ouvindo sua chegada, Dionísio levantou a cabeça e o viu se aproximar, e a primeira coisa que Kael percebeu foi o corte que começava em sua têmpora e chegava a sobrancelha, rapidamente guardou a chave no bolso da calça para que não esquecesse quando fosse embora e foi com preocupação para Dionísio.

– Você está machucado. Precisa limpar se não pode inflamar, onde ficam os remédios? Não vi nada nesses armários ontem, tem curativo? – Kael disse apressadamente, atropelando-se com as palavras, e puxando o rosto de Dionísio para si numa tentativa de ver melhor o ferimento, sequer notou quão estranho tal gesto pareceria aos olhos de seu patrão ou mesmo de quem os observasse, mas Dionísio não se afastou e pela proximidade pôde ver que ele não era o único machucado, que ao contrário de si, tinha o lado do rosto esquerdo repleto de manchas que misturavam-se em vermelho e roxo, seu lábio já antes machucado agora estava ainda mais inchado e tirando a perfeita proporção carnuda que Dionísio se pegava a admirar sempre que estava muito próximo do rapaz.

– Tu não tava com todos esses machucados ontem. – Dionísio estreitou os olhos avaliando-o.

Kael estremeceu e desviou seu olhar para o chão. – V-você sabe que eu me machuquei, viu quando cheguei naquela noite. – Kael gaguejou inseguro, não queria levar mais um de seus problemas para Dionísio, talvez dessa vez ele finalmente o achasse uma carga muito grande e não quisesse mais ajudá-lo, pensava buscando por uma desculpa, mas como nunca foi bom em mentir nada lhe vinha a mente.

– Garoto, não sou otário, vi teu rosto ontem e não estava assim, tem muito roxo que não tava aí antes. O que aconteceu? No que tá metido? Já te vi machucado duas vezes, e uma atrás da outra, nem se recuperou da outra e agora tá ainda pior!

Kael não sabia o que responder e como da outra vez permaneceu em silêncio e depois de um tempo sob o olhar inquisitivo de Dionísio, resolveu se afastar em busca do que precisava para cuidar dele, mas antes que pudesse dar mais de um passo, Dionísio agarrou seu braço freando-o, mas assim como seu rosto, seu braço também estava machucado e pela dor do aperto, um arquejo sôfrego escapou de seus lábios, atraindo a atenção de Dionísio para onde o segurava, que retirou a mão lentamente e franzindo o cenho o pegou pelo pulso com uma mão e a outra subiu a manga da blusa, descobrindo as marcas roxas exatamente no formato de dedos, Kael se encolheu ainda mais, envergonhado, seus olhos ardiam, e sabia que estava prestes a chorar, sentiu-se fraco e incapaz de se defender, recriminava-se, pois se não conseguia se proteger como faria com seus irmãos.

– Quem fez isso? – O olhar de Dionísio queimava sobre Kael.

– Me deixa procurar por algo pra cuidar de você. – Respondeu com a voz trêmula.

– Me parece que é você que precisa de cuidado.

– Eu já limpei o corte do meu lábio, vai sarar logo, o resto só está machucado. Seu rosto está ferido, tem que limpar o corte. – A voz doce e suplicante de Kael dançava aos ouvidos de Dionísio, que via o quanto ele queria distanciar-se de qualquer questionamento, e vendo seu completo desconforto, o deixou ir.

– O que tá procurando, normalmente deixo no meu banheiro, acho que ainda tem. – Dionísio disse sem tirar os olhos da figura pequena que assentiu e subiu apressado, intrigado permaneceu sentado à bancada, buscando controlar a raiva que não entendia teimar em brotar no seu peito, ao ver o rosto do garoto marcado daquela maneira.

Minutos depois, com uma caixa em uma das mãos e na outra uma toalha de rosto, se aproximou de onde seu patrão estava e colocou tudo sobre a bancada, dedicando-se novamente a examinar o rosto de Dionísio.

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