Girassol

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Fazia frio naquela manhã, o céu estava acinzentado repleto de nuvens carregadas. As lágrimas dele se misturavam com algumas gotas de chuva. A rua se encontrava cheia de carros, pessoas vestidas de preto faziam seu caminho até a igreja. Algumas choravam carregando flores em suas mãos e arrependimentos em seus corações. Ele carregava arrependimentos. Sob o teto daquela enorme igreja não havia sequer um ser humano que não tinha partido o coração dela. Girassol. Aquele homem desejava desesperadamente gritar seu nome como se isso fosse levar embora o grande vazio em seu peito.

Ele usava sua jaqueta preta , não servia direito e seus braços ficavam desprotegidos do frio, mas o cheiro dela fazia valer a pena. O perfume suave ainda estava lá e ele o sentia. Algumas vezes respirava profundamente apenas para sentir aquele cheiro e por um segundo a via parada em seu vestido florescente sorrindo para ele. Mas então Girassol ia embora, se dissolvia como açúcar. Ele estava sozinho. Ele escolheu estar sozinho.

No velório a jovem amada estava deitada no caixão feito de madeira. Seus cabelos estavam perfeitamente arrumados e lisos. Ela os odiava assim, prefira eles encaracolados e bagunçados. "Combina com a minha personalidade", Girassol dizia. Quanto mais o triste homem ficava a observando menos se parecia com a garota que amara.

As pessoas passavam por ele tocavam seu ombro e perguntavam-lhe como estava, tentavam trazer conforto com abraços e promessas de amor. "Ela te amava muito", eles falavam. Era verdade. Ela o amava muito até não amar mais e quando o amor sumiu, Girassol foi sufocada por mãos raivosas.

O homem usava a pulseira que ela lhe dera em seu aniversário enquanto a enterrava. Por um momento jurou ter a visto parada com aquele mesmo vestido rosa, seu pescoço marcado de roxo e em seus olhos haviam as mesmas lágrimas daquela maldita noite. "Por que?", ela o perguntou igual fizera antes de respirar pela última vez.

Ela foi enterrada ao invés de cremada como bem queria e ele foi para casa amaldiçoando seu nome. "Eu te amava", ele repetiu durante todo o caminho. Mas não era verdade. Ele não a amava, ele a queria e as pessoas confundem amor com posse. Girassol fingiu não ver, fingiu não sentir quando aquele homem apertou seu braço pela primeira vez do mesmo jeito que ignorou o nojo em seu peito enquanto os meninos na sexta série batiam em sua bunda e as meninas a chamavam de puta pelos corredores. Ela se afugentou em livros felizes e acreditou que a vida fosse assim, procurava pelo príncipe do cavalo branco e se jogava em mares revoltosos, deixava eles usarem seu corpo e entrarem em seu coração apenas para o quebrar em dois. Mas tudo bem, porque as pessoas dizem que para se encontrar o arco-íris é preciso aguentar a chuva. Então ela continuou acreditando em histórias felizes e no amor. Pensou ter encontrado a felicidade em seu melhor amigo da adolescência apenas para descobrir que era igual os outros. Doou seu corpo, o deixou entrar em seu coração até que ele o quebrou e a fez acreditar que era um fardo. Girassol chorou e derramou mais lágrimas quando percebeu que ele não se importava. A garota pegou seus poemas e foi embora para sempre. "Por que?", ela se perguntava, achava que era demais para eles, se doava demais  ou talvez abria as pernas rápido demais. Esses garotos a faziam se sentir usada e todas suas lembranças sensuais eram manchadas pelo desgosto que sentia ao se lembrar. Mas aí ele a viu. Girassol pensou ter encontrado seu príncipe do cavalo branco, mas Diego não poderia amá-la. Você não pode amar se quer possuir. A jovem tentou ir embora, mas ele não deixou e Girassol morreu. Ele a matou. Por que? Por que eles querem sempre possuir e nunca amar? A garota se foi e ele ainda jura que não queria machuca-lá. Mas machucou e quem vai fazê-lo pagar por isso? Ninguém. Girassol morreu junto com todos seus sonhos e sem esperança quando tudo o que queria era ser amada. Não existe final feliz, não para ela.

Por que?

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⏰ Última atualização: Feb 26, 2021 ⏰

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