PRAÇA

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Parte II

Revirei o papel várias vezes, não acreditando no que estava acontecendo. Tinha certeza de que era o mesmo bilhete que a mulher havia me dado. Pensei sobre todas as possibilidades, de algo ter dissolvido a tinta - o que teria deixado manchas, então descartei essa opção -, ou do escrito ter sido feito a lápis, o que descartei também, já que não haviam sequer marcas no papel.

Os dias se passaram e eu me lembrava todas as vezes que entrava no ônibus sobre o ocorrido, constatando aliviada que aquele  homem de amarelo nunca mais apareceu, pelo menos não no horário em que eu estava.

Porém, aquilo me serviu  tanto de alerta, que passei a olhar com mais cuidado para situações que pudessem ser parecidas e a 'passar pelo meio das pessoas', quando sentia alguma proximidade suspeita.

Logo a memória sobre o episódio se tornou turva e vaga, e eu cheguei até a me questionar se não havia sido um delírio muito bem executado da minha mente.

Certa tarde de sábado, resolvi caminhar ao redor de uma grande praça que havia perto de minha casa. Mergulhei como de costume em minhas playlists e dei várias voltas ao redor dela,  até que cansada comprei uma garrafa de água mineral e me sentei em um dos bancos que ficavam perto de um playground, onde várias crianças brincavam.

Fazia bastante calor naquele dia e muito tempo que  eu não caminhava, o que me conferiu um certo cansaço. Então me permiti ficar alguns minutinhos a mais naquele banco degustando minha bebida.

Pude ver quando uma garotinha arrancou a tampa do seu dedão do pé tropeçando, quando duas mães precisaram separar dois meninos que sairam na porrada porque ambos queriam o mesmo balanço.

Mas o que me chamou a atenção mesmo, foi um garoto que aparentava  ter uns 7 anos mais ou menos, sentado em um dos bancos com um caderno em mãos, parecia desenhar.

Quando um homem se aproximou, sentando-se ao lado dele sem desviar o olhar de outro garotinho que brincava no escorregador, notei que ele era um irmão mais velho acompanhando o pai.

Minha atenção logo foi desviada para o alvoroço que se formou à minha esquerda, quando um senhorzinho vendedor de sorvetes estacionou seu carrinho. Uma roda considerável de pais, mães e crianças se formou ao seu redor, e só se ouviam e viam então gritinhos de felicidade e mãozinhas carregando picolés de todas as cores pelo local.

Voltei me olhar  para minhas coisas, na intenção de reuni-las e retornar para casa. Foi quando notei uma folha  sulfite caída no chão. Uma leve brisa, forte o suficiente para fazê-la voar, a trouxe para perto dos meus pés.

Me agachei para pegá-la, não é claro, sem antes olhar para o garoto desenhista - que provavelmente estaria vindo em minha direção resgatá-la -, pensei,  mas na verdade ele não estava mais lá.

O desenho era de uma garotinha perto de um local todo rodeado de flores. Seria com certeza só mais um desenho  bonitinho, se não fossem pelos vários rabiscos ao redor da garota, alguns até atravessavam a folha, por terem sido feitos com força.

Peguei meus pertences, e decidi passar pelo bebedouro,  para encher minha garrafa de água e percebi que este era rodeado de plantas e flores como no desenho.

Me abaixei para encher a garrafa e quando me levantei um pouco rapidamente  virando-me  em direção ao banheiro, uma leve tontura e  zumbido  nos ouvidos me obrigaram a parar por alguns segundos para me recompor.

Com a visão turva, pude ver à minha frente, um homem conversando agachado com uma menina de aproximadamente 5 anos.

Pareciam estar se divertindo, devido as inocentes risadas que a menina soltava. Em certo momento homem então tocou-lhe o braço direito e foi quando minha intuição me disse, pelo olhar da menina que esta não o conhecia de fato, visto que olhou surpresa e atenta, mas sem incômodo para a mão dele.

Minha audição voltou ao normal e consegui dar um passo  que foi ouvido pelo homem,  que olhou-me rapidamente, se levantou apressado e partiu, como que se estivesse assustado.

Quando me voltei para a garota, depois de seguir o homem com o olhar, esta estava de mãos dadas com quem parecia ser sua mãe perguntando-lhe porque demorou tanto para fazer xixi.

Toda essa situação durou poucos minutos, tempo o suficiente minha intuição não "parar de me dizer" que algo muito ruim estava prestes a acontecer, e que de alguma forma várias coisas: - a sede, a tontura,  e um desenho impediram.

E claro, novamente mais tarde me frustrei, ao mostrar para minha irmã um desenho que só existiu para mim.

(Continua)

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⏰ Última atualização: Nov 18, 2020 ⏰

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