Prólogo

436 14 1
                                    

Eu estava voltando.

Sim, depois de meses tentando convencer minha mãe a não me levar de volta para o inferno, ela fez questão de me ignorar e me jogar para os logos novamente. Tudo bem, talvez não fosse exatamente para o inferno e muito menos para os lobos no sentido literal da palavra, mas o fato de ser tudo metaforicamente falando não torna aceitável. Ela sabia tudo que eu havia passado naquele lugar e mesmo assim ela insisti dizendo que eu estava pronta.

Naquele exato momento, eu estava no banco do carona do carro da minha mãe, à caminho de Englewood Cliffs. A cidade que eu não visitava há três anos. Eu não merecia aquilo, merecia? Sempre fui uma pessoa boa e a vida finalmente estava dando certo para mim. Só porque eu estava aproveitando a vida ‘um pouco demais’ na cidade, como minha mãe havia dito, não queria dizer que eu merecia voltar para o subúrbio e morrer de tédio num lugar cheio de gente que eu não gostava e com mato para tudo quanto era lado. Como eu sobrevivi lá quatorze anos da minha vida eu não sabia.

Mas eu não ia deixar barato.

Todas as pessoas que um dia me machucaram iriam ver como eu mudara. Estava praticamente irreconhecível. Havia jogado uns vinte quilos no lixo, depois de vários Spas para emagrecimento, eu havia mudado. Sim, completamente. Meu rosto estava de outra pessoa e como se não bastasse, meus cabelos, que sempre foram de um louro claríssimo, agora eram de um castanho. Ainda claros, mas era uma grande mudança. Nem me deixe começar com o fato da puberdade ter me atingido em cheio. Eu não reconhecia a menina nas fotos de anos atrás; não era mais eu. E algo dentro de mim, dizia que ninguém me reconheceria também. Não era como se meus amigos me reconhecessem, porque para que isso acontecesse era preciso tê-los, algo que eu já tinha perdido anos antes de ir embora desse buraco.

Não que houvesse tido uma vez sequer que eu tivesse pensado nessas pessoas enquanto estava na cidade. Não, lá minha vida era perfeita. Tinha meus amigos, tive meus namorados e tudo estava correndo bem. Até que um dia minha mãe achou que talvez tudo estivesse saindo do controle. Tá, como se estivesse tudo as mil maravilhas aqui. Englewood Cliffs era meu inferno astral e eu nunca deveria ter aceitado me mudar de volta para lá. Além de que eu teria que encarar tudo de novo sem meu pai e meu irmão. O primeiro não estava mais com a gente porque minha mãe e ele se separaram logo depois de nos mudarmos; ok, ‘se separaram’ não era a melhor maneira de colocar. Meu pai na verdade nos deixou. Sim, a cara dura para ir viver com a mulher que nos vendeu o apartamento de Manhattan, que era cinco anos mais velha que eu e vinte e seis anos mais nova que meu pai. Ótimo. E o meu irmão já estava na faculdade há um ano. Ele tinha sido um grande amigo para mim por toda a infância; pode parecer idiota, porque quem seria tão amiga do próprio irmão (não é?), mas ele era perfeito comigo.

Minha mãe embicou o carro na nossa casa antiga. Uma casa que deveria ter sido vendida há anos já. Como eu tinha péssimas lembranças de lá. Não só na escola minha vida tinha que ser importunada, mas as pessoas não deixavam barato nem na minha própria casa.

Saí do carro sem nem mesmo olhar para minha mãe e, como uma criança de cinco anos, bati os pés pelas escadas de madeira e todo o corredor até o meu antigo quarto. As paredes ainda tinham a cor de antigamente: rosa salmão. Fiz uma careta para meu quarto completamente vazio e desci novamente até o carro. Atrás de nós estava estacionado um caminhão gigantesco com todas as nossas tralhas. Sim, mesmo que fossem coisas minhas que eu amasse, eu chamava de tralha. Me processem, eu estava com um mal humor terrível.

Usei todos os meus anos de academia e tênis para conseguir abrir a trava da porta da carreta do caminhão sem ajuda de ninguém. Consegui, não sem um esforço grade, porém o importante era que tinha conseguido entrar. Comecei a vasculhar por entre os móveis e, atrás da nossa gigantesca geladeira , encontrei as latas de tinta que eram do meu antigo quarto; peguei a branca em uma mão e a vermelha em outra e pulei do caminhão sem um arranhão. Marchei de volta à casa, ignorando as sobrancelhas franzidas da minha mãe.

Havia dito para ela que arrumaria meu quarto sozinha do jeito que queria. Não precisava da ajuda de ninguém, uma vez que também havia feito a mesma coisa na em Manhattan. Tudo bem que meu quarto agora era consideravelmente maior que o do apartamento que tínhamos na ilha, mas não seria problema, demoraria um pouco mais só.

Depois da minha drástica mudança de aparência, minha mãe ficara muito mais animada em me comprar roupas novas. Ela havia percebido que eu conseguia vestir qualquer tipo de peça, com manga ou sem, curto ou logo, mostrando a barriga, as pernas, ou não, e por aí vai. Foram três anos de puro sufoco para atingir o que eu era naquele momento. Quem não se sentiria orgulhoso do resultado? Eu, com certeza, estava. E eu nem precisava comentar de como minha mãe estava; eufórica seria a melhor palavra.

Durante o final de semana inteiro fiquei arrumando meus móveis. Todas as paredes foram pintadas (por mim) de branco, menos uma, que era a que estaria com a cama encostada, que tinha sido pintada de um vermelho sangue. Todo o resto era branco, menos o móvel de baixo da televisão que eu havia tingido de preto com spray de grafite preto; era muito comum na cidade as pessoas pintarem seus próprios móveis. Meu armário ocupava uma parede inteira e tinha duas portas deslizantes, com espelhos que as tomavam por inteira. Era bom poder andar pelo quarto e se ver sempre. E não me levem a mal, não era para ficar vangloriando minha imagem; eu gostava de examinar como seria se tivesse alguém olhando para mim. Como seria a vista quando eu estivesse estudando, ou lendo, ou até assistindo TV.

Ao lado do meu armário, coloquei minha cama de casal branca, que ficaria de frente para a televisão e a mesinha preta. Do outro lado da cama, eu tinha uma janela enorme e uma escrivaninha para estudos (tá, claro) e afins.

Eu não tinha muita certeza de como encararia quase um ano inteiro letivo naquela cidade, com as pessoas que eu mais odiava no mundo. No entanto, eu tinha certeza de uma coisa: não tornaria a vida deles nem um pouco fácil.

a/n Então gente, essa qui é uma história nova que eu comecei e to muito animada! de verdade, to escrevendo pra caramba dela. "Alguém pra dizer bom dia" ainda vai continuar sendo atualizada e espero que quem ainda nao tenha ido dar uma olhada, agora fiquei mais curioso! Eu escrevo há muitos anos e finalmente achei um lugar para divulgar, eu to muito feliz! rsrs De qualquer jeito, muito obrigada por darem uma chance para minhas histórias, quem sabe eu nao posto uma mais antiga que eu já escrevi boa parte também! bjsss :333

Ele pediu por isso EM PAUSAOnde histórias criam vida. Descubra agora