Único

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Semi não conseguia respirar. O ar não entrava nem saía de seus pulmões, mesmo que ele concentrasse todo o seu esforço naquilo.

Ele tentava fazer as coisas funcionarem, mas elas não funcionavam. Seu peito doía, se comprimindo cada vez mais.

Semi não conseguia respirar.

Suas mãos tremiam, e ele sentia o tremor subir por seus braços e se espalhar, apesar de não conseguir enxergar nada.

Tudo o que ele via eram borrões, muitos e muitos borrões.

E a imensidão lá em baixo.

Semi não conseguia respirar. E ele também não queria olhar para baixo.

Ele se perguntava quando suas pernas iriam sucumbir aos tremores incessantes. Ele se perguntava quando elas iriam falhar e quando iriam fazer com que seu corpo perdesse o equilíbrio.

Ele se perguntava quando iria cair.

Não que Semi quisesse cair, ele não queria; ele só sabia que seria inevitável.

Semi não conseguia respirar.

E ele também não queria olhar para baixo.

Semi não queria cair.

Ou talvez ele quisesse.

Talvez ele quisesse cair. Se ele não quisesse, por qual outro motivo estaria ali, de pé no estreito muro do viaduto?

Na realidade, Semi estava só tentando se convencer de que ele não queria cair, e de que aquilo era temporário.

A falta de ar era temporária.

O mal estar era temporário.

O aperto no coração era temporário.

O vazio na sua cabeça era temporário.

A imensidão lá em baixo era temporária.

Tudo tinha uma duração e então acabava, e tudo que ele precisava fazer era esperar. O fim sempre chegava.

Tudo tinha uma duração e então acabava; aquilo incluía sua vida também?

Semi sentiu os tremores se intensificarem quando ele olhou para baixo, para a imensidão desfocada.

Ele sentiu vontade de abrir os braços, que nem a Rose em Titanic.

De abrir os braços e sentir o vento. De abrir os braços e voar.

Ele se perguntou o que aconteceria se ele se inclinasse um pouco para frente. Só um pouquinho, nada demais. Só para ver o que acontecia.

Não era como se Semi quisesse cair, para início de conversa.

Semi se perguntou se as pessoas também faziam aquilo. As pessoas normais, quer dizer.

Ele se perguntou se elas ficavam de pé no muro dum viaduto no meio da madrugada, sem motivo algum.

Semi achava que as pessoas normais não faziam isso, porque era estranho.

Ele não queria cair, não mesmo.

Semi se perguntava se as pessoas normais sentiam as coisas do mesmo jeito que ele.

Ele se perguntava muitas coisas, todas ao mesmo tempo. E mesmo assim, ele sentia como se sua cabeça estivesse constantemente em branco.

Ele pensava muito e sentia muito. Ele pensava tanto e sentia tanto que não pensava em nada e não sentia nada.

Semi vivia sua vida como se ela fosse uma montanha-russa, cheia de altos e baixos sem intervalo algum.

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