Único

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- Trimmmm! Trimmmm! Trimmmm! Trimmmm! Trimm! – tocou insistentemente.

Sim. O som do telefone ultra famoso dele era um que causava nostalgia a quem o escutasse (não sei se boa ou ruim). Para ele, sem procurar justificativas competentes, aquele toque era algo irrelevante (por isso não alterara, mesmo não sendo um aparelho desenvolvido nos anos noventa).

O telefone tocou por quase cinco vezes completas.

- Alô?

- Olá, boa tarde.

- Quem é? – indagou.

- Boa tarde.

- Boa. Quem fala?

- O senhor Alexandre Passos se encontra?

- Sim.

- Pode chama-lo, por favor?

- É ele.

- Olá, Alexandre. – saudou.

- Me chamo Ana Paula, falo da empresa Teleline. O motivo do meu contato é referente a uma pendência...

Antes que a mensagem pudesse ser concluída, no rito costumeiro daquela profissão, a estupidez manifestara-se, revoltantemente.

- Cobrança? Sério? Eu já não aguento mais vocês me cobrando. Todo dia eu recebo ligações. O tempo todo enchendo o meu saco. – manifestou.

- Já afirmei para várias colegas suas que não tinha interesse no produto. Por fraqueza, fui convencido e agora, meses após, agem como se eu houvesse escolhido isto, mas EU NÃO EXCOLHI. – continuou, enfático e visivelmente irritado.

- EU NÃO QUERIA! VOCÊS ME ENGANARAM! AGORA QUE JÁ CONSEGUIRAM ATINGIR A META, NÃO PARAM DE ENXER O MEU SACO COM MAIS COISAS. – concluiu, em um tom bem mais explosivo, em um único respiro, acabando a revolta quase sem ar.

Os berros no telefone despertariam qualquer sono, do mais leve ao extremamente pesado. Os sons daquela conversa pareceram uma discussão entre familiares rivais por uma moral rompida.

A sala estava qualquer que totalmente vazia. Não haviam objetos naquela casa. Não havia mais vida ali.

A história de Alexandre começou bem antes de tal ligação. Na realidade, a nova cidade era uma tentativa desesperada de evolução, pessoal, mas principalmente profissional. Apesar da grosseria explícita naquele momento, este não era o comum na personalidade. Em seus vinte e cinco anos de existência, nunca havia desrespeitado nenhuma mulher daquela forma. Os problemas financeiros, principal responsável pelas mudanças de humor nele, finalmente alcançaram o ápice da raiva. Ao contrário do ocorrido, os sorrisos eram rotineiros em seus dias. Sempre acreditou que deveriam brindar os caminhos apresentados, visto que uma análise mais geral do contexto do país onde residia não traria esperança a ninguém.

Após alguns segundos ensurdecedores de um silêncio absoluto, capaz de fazer com que as frenéticas asas de uma libélula compusessem uma sinfonia tempestuosa, seguido por uma reflexão profunda, a conversa ganhou um novo tom.

- Me perdoe, Ana Paula. Peço que me desculpe. Eu não...

Tum! Tum! Tum! Tum! – ligação encerrada.

- Inferno! – vociferou para si.

O jeito desajeitado e extremamente preocupado com o cenário em qual estava inserido fizera com que, após um toque nem tão sutil, a chamada fosse súbita e enganosamente encerrada.

- Além de fracassado, sou estúpido. – lamentou, como se conversasse com o diabinho em seu ombro.

- Inferno! Inferno! – repetiu, insistentemente, revoltado com a própria desatenção.

Marcos A. Junior - Por um fioOnde histórias criam vida. Descubra agora