🩸: a partida

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O vampiro cumpriu com sua palavra. Ao ter certeza de que o humano estava bem alimentado, devolveu-lhe a bolsa e o escoltou até o lado de fora da casa.

"Onde estão minhas coisas?" Perguntou, com uma sobrancelha levemente arqueada, nenhum de seus pertences estavam ali, a bolsa estava vazia.

"Não seria prudente da minha parte deixar você ir embora com estacas e balas de prata." Ele respondeu, e aquela pareceu uma resposta óbvia, Frank assentiu. O vampiro assumiu uma expressão séria de repente."Não pise os pés nesta floresta nunca mais. Nao medirei forças contra você, ou qualquer um que calhe de estar ao seu lado." Ele dizia aquilo num tom austero e assustador, enquanto segurava levemente as bordas de seu roupão de seda azul, afim de impedir que o tecido tocasse a terra molhada. Vários alarmes gritavam em sua cabeça; 'corra, corra, corra', 'você não está seguro'; mas algo o impedia de fazer o que sua mente mandava.


O que o motivava a deixá-lo ir? Não seria mais racional matá-lo ali mesmo? Exterminar qualquer chance de ser perseguido com tochas por um grupo de humanos ensandecidos?

"Quanto tempo você acha que vai levar até os federais mandarem outra pessoa atrás de você?"

O vampiro nada disse a princípio. Seu gato estava ao seu lado, observando tudo silenciosamente. A criatura, que antes estava meramente à porta, deu passos o suficiente para que seu corpo inteiro fosse agraciado pelos raios de sol. Frank se espantou, imaginando que coisas sórdidas fossem acontecer. Como queimaduras, ou partes de seu corpo sendo reduzidas a pó. Para sua surpresa, a luz iluminou cada uma de suas veias azul-esverdeadas como se fossem feitas de neon, linhas finas e grossas atravessando seu rosto, seu pescoço e suas mãos de maneira clara e perceptível. O fazendo parecer terrivelmente doente. E ainda sim, despreocupado e sereno, como se nada o incomodasse. Passaria-se por humano em leito de morte, não fossem os litros de sangue em sua geladeira. "Garanto que isso não será um problema para mim." Ele parecia incrivelmente certo disso, como se conhecesse o sistema e fosse capaz de dizima-lo por dentro. Frank não duvidou que isso fosse verdade, e sentiu que deveria ir embora o quanto antes. Via nos olhos dele que era hora.

Olhou uma última vez no rosto da criatura, no verde de seus olhos cristalinos e pálidos. Ele o analisava solitário, nada mais dizia, sua pele como giz de ceira branco debaixo daquele sol. Como poderia ser tão bizarramente intrigante?

Se perguntou se ele teria gravado seu cheiro, se saberia como encontra-lo a quilômetros de distância se sentisse vontade. A ideia o assustou, e o fez apressar seus passos em direção á floresta.

†††

Demorou mais que o previsto para achar seu caminho de volta, parecia que estava muito longe de onde havia perdido a consciência no dia anterior. Passou por uma pequena represa a qual não havia visto anteriormente, pois desconhecia os lados mais profundos da floresta.

Após muito andar ouviu o inconfundível barulho de pneus correndo em asfalto molhado, o maior sinal de civilização que poderia receber, suspirou aliviado, estava de volta ao cinza depreciativo da vida a qual pertencia.

Sentiu-se imediatamente só. Não sabia o que faria dali em diante. Para onde iria, se iria à algum lugar. O que diria às pessoas quando fizessem perguntas? Levantou a cabeça alarmado quando os federais vieram à sua cabeça mais uma vez. Eles com certeza fariam perguntas incisivas, e Frank não saberia como responder.

Quando descobrissem que Cave estava morto, fariam com que Frank escolhesse entre ser um caçador ou a terrível amnésia. Frank não queria ser um caçador. Ele precisava fugir.

†††

Colocou o máximo de coisas que conseguia em uma mala velha que habitava o armário de seu pai desde antes de seu nascimento. Buscou por cada dólar e moeda que pôde encontrar em casa, em cada buraco que suspeitava haver uma cédula escondida, antes esquecida.

Era quase noite, quando trancou a casa atrás de si e ajeitou o capuz em sua cabeça. As rodinhas da mala estavam quebradas, então a carregou em seu colo como uma criança valiosa. Esperou alguns minutos no ponto e pegou o primeiro ônibus para a cidade vizinha que ficava há cerca de cinquenta minutos da cidade natal; pensou que, bem, talvez pudesse se esconder no lugar mais próximo. Os federais certamente pensariam que havia ido para o México, ou o Canadá. Ninguém ia para tão perto em uma fuga. E ele não tinha em mente ser pego para virar um escravo como seu maldito pai.

Choveu como na noite anterior, e Frank se abraçou fortemente à mala enquanto observava as gotas descerem pelo vidro, e através do mesmo, observou a floresta ao longe. Ameaçadoramente vil.

Sentia que deveria estar chorando, mas não conseguia. Sua perna balançava ansiosamente, seu coração parecia afundar em seu peito e seus lábios tremiam. No momento, só três coisas permeavam sua mente. Os federais, um estranho alívio de viver num mundo onde não mais teria de lidar com Cave, e Gerard, o vampiro da floresta, com seus olhos verdes frios e seu rosto angelical, o perigo monumental que ele representava e seu roupão de seda florida, tão contrastante.

Era tudo muito caótico. Frank mal conseguia organizar seus pensamentos de maneira lúcida.

Seus olhos capturaram algo de canto, dois carros pretos se apressando ao lado do ônibus.

Ele sabia o que era aquilo, seu coração acelerou como nunca antes em sua vida.

Um dos carros parou subitamente um pouco a frente, obrigando o ônibus a estacionar. Frank abriu a janela, jogou a mala e tentou se espremer para fugir. A chuva caia forte em sua cabeça, se afastou e tentou pelas pernas primeiro, mas não ia de forma alguma, a janela era muito apertada.

Enquanto isso, o ônibus abria as portas.

Frank se forçou para baixo, de modo que arranhou algumas partes de seu corpo na descida, mas forçosamente conseguiu cair um pouco acima de sua mala. Sentiu um alvoroço dentro do ônibus, pessoas desciam, iam em sua direção.

Agarrou a mala e correu em direção á floresta, o único lugar que vinha à sua mente.

Ao olhar brevemente para trás, viu homens com melhor físico e disposição correndo em sua direção, não tinha chances. Um deles praticamente pulou em cima de suas costas, derrubando-o violentamente no chão.

Puxaram seu capuz e a água caiu em muito mais abundância sobre seu rosto, sua mão se estendeu em direção á floresta o máximo que pôde, talvez ainda existisse alguma esperança dentro de si, mas o homem agarrou seu braço e o puxou para trás, com um joelho em seu pescoço para imobiliza-lo, agarrou o outro e o algemou.

Frank pensou ter visto algo nas sombras da floresta, mas rapidamente esse algo se dissipou, como se não quisesse ser visto.

Havia sentido isso sua vida toda, olhos invisíveis que observavam o lado de fora como algo que jamais poderiam fazer parte, mas desejavam. Agora ele sabia o que era aquilo. A entidade que encarava sem parar do lado de fora de todas as janelas.

"É ele." Disse um dos homens. "Vamos levá-lo."

De agora em diante, não teria mais como voltar atrás.

†††

oiii

vai ter uma passagem de tempo longuissima desse pro próximo

my sweet vampire † frerardOnde histórias criam vida. Descubra agora