Capítulo único

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Hinata não nutria mais esperanças, fazia anos que tentava engravidar. Só que nenhum tratamento sozinha ou com o marido, a possibilitou de realizar tal sonho.

Frustrada, chorou tudo o que podia e não podia enquanto preparava a ceia de natal. Sua família e a de Naruto viriam passar alguns dias com eles e ela não queria demonstrar estar tão abatida. Mas estava.

Naruto dizia para Hinata ter paciência e não perder a fé, mas ela sentia-se cansada de sempre receber negativo para o sonho de ser mãe. Não havia o que fazer além de aceitar, gastara todo o dinheiro que dispunha em tratamentos e a cada não foi dessa vez, seu coração afundava um pouco mais no peito.

Afastou o cabelo que caiu no rosto e levou ao forno o pernil que fez com todo o amor para ambas as famílias. Seria bom tê-los por perto, ainda que precisasse fingir estar tudo bem para não preocupá-los. Seria apenas alguns dias e depois tudo voltaria ao normal, quer dizer, deveria se acostumar com a tristeza de não poder gerar um filho. Haviam outras possibilidades, certo? Podia adotar... Naruto sugeriu isso duas noites atrás, quando acordou de madrugada com a esposa chorando baixinho.

Era a solução, adotaria uma criança e ofereceria todo seu amor para ela. Não era porque não podia gerar, que não podia ser mãe. 

Sorriu consigo mesma, limpou as lágrimas traiçoeiras que escorreram sem que percebesse e terminou os preparativos para a ceia. Naruto ainda não chegara, trabalharia até tarde naquele dia, do contrário estaria ajudando-a com o trabalho de alimentar tantas bocas naquela noite. Infelizmente a família dela e a do marido moravam longe e chegariam em cima da hora para a ceia. Por isso ela acabou sozinha na tarefa de ajeitar tudo, mas Hinata estava satisfeita com o esforço. Precisava de algo com que se distrair, já que ficaria boa parte do dia sozinha. Era quando os pensamentos ruins a assombravam.

Chegou a cogitar se Naruto a deixaria por não conseguir ter um filho, depois se repreendeu por pensar algo assim do marido. Naruto sempre fora compreensivo e a animava quando ela estava afundada em tristeza. Mas até quando seria assim? Quando ele se cansaria daquela situação?

Afastou-se da cozinha, indo em direção ao quarto, decidida a tomar um banho. Gostava da sensação da água morna caindo, se misturando às suas lágrimas. Era como se seus anseios fossem embora, a medida que a água escorria pelo ralo. 

Há algum tempo, quando ainda sentia-se esperançosa. Fazia testes de gravidez sempre que sua menstruação atrasava um dia ou um enjôo suspeito aparecia. Hoje, no entanto, já não ligava mais para isso. Olhou no calendário, constatando que estava há semanas atrasada. Franzindo o cenho, mostrou a língua para a data circulada em vermelho e foi para o banheiro. Se despiu e ligou o chuveiro, permitindo que, como de costume, a água levasse para o ralo sua melancolia. Precisava estar disposta para a noite, tinha de estar. Pois não aguentaria os olhares de piedade da Kushina, ela não fazia por mal. Só que Hinata já estava fragilizada e qualquer coisa a deprimia ainda mais. Sentia-se menos mulher por não poder ter filhos e, por mais que a intenção de todos fosse confortá-la. Naquele momento, o silêncio era o melhor que podiam fazer por ela.

Ao sair do banho, resolveu usar seu perfume favorito para aguardar Naruto chegar. Queria estar bonita para ele, como se isso compensasse o fato de não conseguir lhe dar uma criança. Era boba por pensar assim, sabia disso, mas não conseguia evitar. Ao borrifar o perfume, entretanto, a bile subiu até a garganta e um enjôo horrível a acometeu.

Correu para o banheiro com a mão na boca e colocou tudo para fora. Não que tivesse algo no estômago, nem lembrava de ter comido naquele dia. Tomou apenas um café preto que a sustentaria até a ceia de natal.

Lavou a boca, olhando em dúvida para o espelho. Sentiu novas lágrimas se formarem no canto dos olhos, por causa da esperança de finalmente ler positivo em um teste de gravidez.

Observou sua expressão pálida e chorou copiosamente. Enquanto dúvida e esperança duelavam dentro de si. 

Fazer outro teste, não fazer outro teste.

Não aguentaria outra negativa, o resultado a levaria ao céu ou ao inferno. Se caísse agora, ninguém mais conseguiria levantá-la. Pensou em buscar ajuda psicológica para lidar com a situação, mas ainda não tinha forças para isso. Era como assumir o fracasso e talvez não estivesse pronta para desistir. Por mais que devesse, por mais que fingisse ter desistido.

Determinada, porém, com as mãos trêmulas, Hinata pegou mais um teste.

O último

— O último. — frisou para si mesma. — Depois desse você desisti de vez. — sussurrou para a Hinata esperançosa refletida no espelho.

Balançou o teste na mão, que parecia queimar seus dedos. Olhou para o celular e pensou se devia ligar para Naruto ou enfrentar aquilo sozinha. Não queria ver a decepção em seus olhos mais tarde quando o resultado acusasse negativo. Mas não conseguiria enfrentar sozinha aquele monstro.

Discou, a mão tremia cada vez mais, até a voz suave de Naruto soar:

— Amor? 

— Oi, vida... — iniciou, a voz trêmula e chorosa. — Desculpe atrapalhar, eu só...

Naruto respirou fundo, já sabia qual era o problema. Houve uma pausa de alguns segundos, antes de ele dizer com toda a calma do mundo:

— Quer esperar eu chegar em casa, hime? Não precisa fazer isso sozinha. — a acalmou.

— Estou ansiosa demais para esperar, melhor acabar logo com isso. — despejou, tentando conter as lágrimas que escorriam abundantes. — Assim terei tempo de me recuperar até nossa família chegar. — tentou sorrir em meio as lágrimas. — Só queria te avisar.

— Vou ficar aqui no telefone então... — respondeu, o tom ainda mais gentil do que de costume. — Sabe que independentemente do resultado, eu te amo e estaremos juntos em qualquer situação.

— Eu sei... — e isso foi o estopim. — Também te amo, obrigada por me amar mesmo com... — Naruto a interrompeu.

— Não pense em dizer o que acho que vai. — afirmou firme. — Eu te amo, Hinata. Não tem que me agradecer por isso, por favor, se não estiver preparada para o teste. Espera por mim, vou tentar sair mais cedo do trabalho... — foi a vez de ela interromper.

Criou forças em meio à desesperança que ameaçava sufocá-la.

— Vou fazer o teste. — ela o pegou e, fechando os olhos, fez o procedimento necessário.

Mordendo os lábios com os olhos fechados, aguardou o tempo informado nas instruções para o resultado aparecer. Temia abri-los e constatar que mais uma vez sua esperança fora completamente infundada. Tinha medo de desmoronar e não conseguir se reerguer. Contudo, a voz de Naruto, mais uma vez à trouxe de volta.

— Seja forte, amor. Estou voltando pra casa, consegui escapar. Eu te amo, tá bom? — ela sorriu, abrindo os olhos, bem a tempo de ler: positivo.

— Positivo. — afirmou em choque. — Positivo! — gritou, chorando e sorrindo ao mesmo tempo. 

— Positivo. — Naruto sussurrou do outro lado da linha. — Espera por mim, meu amor. Estou chegando!

Aparentemente, milagres de natal ainda aconteciam.

Fim.

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Escrevi essa one que eu queria há bastante tempo, nunca fui muito de escrever histórias de natal. Mas espero que gostem ❤️

Milagre de natalOnde histórias criam vida. Descubra agora