-Veritty
Os cortes no rosto dele não me arrepiam, mas sua presença me dilacera. Quase faleço todas as vezes que o encaro; os olhos mentirosos continuam a me observar como se não fossem.
Quando eu tinha dezoito anos, Darlan fez uma coisa ruim comigo. Apesar de detestá-lo por isso, fico pensando se eu não seria capaz de fazer o mesmo com outra pessoa, e isso estraga minha cabeça.
Passaram-se três anos desde a última vez que o vi. Nosso fim violento me marcou. Ele era a razão pelo meu passado ser tão presente; ele era o cara que carregava o título de culpado pela minha dificuldade em ingressar no balé profissional; ele era o causador do meu remorso mais insistente...
...mas sempre que seus dedos alcançam as teclas do piano, entrego meu coração em suas mãos para que ele o devore como quiser.
O sentimento azedo que alimento por Darlan no silêncio, acaba quando ele toca para mim, isso porque um dia, fizemos um trato, e todas as vezes que ele toca, eu danço.
O pior mundo para se estar, é o dos artistas. Eu e Darlan somos a prova disso. Não podemos nos machucar, porque nossa arte já nos machuca; ela nos consome e nós consumimos um ao outro.