autoracrazzy
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O desfile era um porre.
O típico circo montado pra alimentar o ego de gente fútil, patrocinado - é claro - pela gloriosa e decadente família Vladimir. Dinheiro velho, influente, cheiro de caviar, perfume de poder e roupas feitas pra esconder monstros.
Sentado na primeira fileira, eu brincava com meu isqueiro dourado, acendendo e apagando, desejando estar em qualquer lugar que não envolvesse gente plástica sorrindo forçado. Ao meu lado, um velho ministro russo dormia com os olhos abertos. A plateia era um mausoléu em movimento.
Até que ela entrou.
A ruiva.
Não era o tipo de beleza que se espera num desfile patrocinado por nomes que tratam mulheres como objetos decorativos. Ela destoava. Como uma nota errada numa sinfonia perfeita e, por isso mesmo, era hipnotizante.
Pele clara, salpicada de sardas minúsculas que mais pareciam constelações. O cabelo, ruivo como vinho derramado, volumoso como se o vento morasse dentro dele. As curvas... ah, as curvas. Um corpo real, escandalosamente vivo num mar de esqueletos andantes.
Ela era tímida. Isso dava pra ver. Os ombros um pouco tensos, o olhar que evitava o público... mas havia algo. Um lampejo. Uma faísca que gritava "eu não vou me curvar". Não era medo, era força contida. Orgulho disfarçado de silêncio.
E, naquele exato segundo, eu senti.
Uma dor aguda. No peito? Não. No ego.
Meu corpo traiu minha alma ajoelhei-me. Literalmente. Cai de joelhos.
"Merda", sussurrei, enquanto as pessoas ao redor fingiam não perceber o escândalo que era um Vladimir se ajoelhar por uma mulher.
Ela não me viu. Mas eu vi tudo.
Vi a forma como a luz tocava os fios do cabelo dela. Vi como as sardas formavam um mapa que eu queria estudar por noites seguidas. Vi o desafio nos olhos castanhos quando encarou a câmera no final da passarela. Vi uma tempestade inteira escondida em uma garota que mal sabia o próprio impacto.
E eu soube, ali mesmo, entre os flashes e a música ambiente ridícula
Ela era minha. Só