Eu estive pensando em como a vida me machucou, no quanto ela pode ser cruel, talvez estivesse se vingando por eu ter tudo, sem restrições, talvez quisesse que eu sofresse um pouco, como todo mundo, claro que quando tudo aconteceu, eu era pequeno e frágil o suficiente pra não me importar, ou ser alheio a situação, mas agora percebo minhas limitações. Todo dia agradeço a Deus, por poupar meus olhos, a surdez é algo ruim, mas se eu não pudesse enxergar, se eu só presenciasse escuridão, do mesmo modo que não sou capaz de ouvir um ruído, talvez desmoronasse. Eu estava no carro aos oito anos de idade, um fim de semana em que o filho deles, conseguira, tira-los do universo administrativo em que são emergidos, claro que eles ainda boiavam nele, mas pra mim era o suficiente, simplesmente faze - los sair comigo, eles estavam tentando, eu sei. Eu estava com meus fones ouvindo algo, eu não lembro oque era, estava chovendo muito, então queria faze - los ir casa da vovó, brincariamos, e seríamos uma família unida por um tempo, pra mim estava bom, logo estaria com eles e minha avó num ambiente quente, e longe da imensidão da nossa mansão, afinal, minha avó gostava de casas pequenas e eu particularmente me achava seguro em um lugar como sua casa. ouvia a chuva bater forte contra o carro, elas conseguiam ultrapassar o som dos meus fones, então resolvi tira - los. - estou feliz que arranjaram um tempo pra ficar comigo - digo já ansioso, minha mãe sorria, enquanto meu pai atendia uma ligação com seu foco na estrada. naqueles segundos, entre o sorriso da minha mãe, e a concentração do meu pai, eu ouvi o barulho das rodas tentarem freiar de algo, ou talvez a pista estivesse muito molhada. nunca pude imaginar que sentiria tanta falta, de ouvir o barulho da chuva de novo.
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