Era um dia frio, o vento parecia querer machucar, cheguei em casa logo após o sepultamento de minha avó Maria, me senti uma estranha em meu próprio lar, o ambiente ecoava uma paz intrusa e um silêncio constrangedor.
Eu não conseguia sentir nada.
Acontece que aquela insensibilidade me assustou imensamente, eu era uma das netas mais apegadas em minha avó.
Com isso em mente caminhei dentro daquela casa enorme e sombria e me vi perdida sem saber em qual cômodo eu iria me esconder. Escolhi a sala, o sofá nunca me pareceu tão convidativo, minha mente precisava desesperadamente de barulho, fosse qual fosse, então liguei a televisão, passava "A lista de Schindler", entretanto minha alma gélida e insensível não se comoveu com a história triste do filme, foi quando adormeci.
Enquanto eu sonhava me vi em, a casa estava acolhedora e iluminada pelo Sol, a mesa da sala de jantar exalava a fragrância de lavanda do lustra móveis que se misturava ao cheiro de bolo de fubá fresco recém tirado do forno.
Na sala de estar, sentada quieta e concentrada na notícia que passava na televisão, lá estava ela, a vó Maria, com seu rosto idoso e suave, usando o lenço simples e branco de sempre nos cabelos finos e grisalhos, ela bordava um pano de prato e estava atenta ao jornal da tarde, passado algum tempo ela se levantou, colocou a caixinha de costura e o pano de prato inacabado sobre o sofá, olhou para mamãe e disse:
- Tenho que ir! Bem acredite ou não, da sala de jantar de casa onde estávamos, o sonho nos transportou para o cemitério, onde nós entramos e pelas vielas estreitas seguimos em paz e lentamente, até que chegamos no túmulo que tinha a foto da vovó.
Eu abruptamente e sem pensar disse:
- Vou com a senhora!
Ela disse com amor e decididamente:
- Agora não. Volte e viva.
Acordei com ânsia de vômito, eu sabia que agora era minha vez de escrever nossa história.
Estando pronta ou não.
DA 2021-006074