Quando Laila e eu nos conhecemos o limbo de incertezas no qual a escola tinha se transformado, ficou para trás. As tardes não eram mais de conformismo letárgico, de olhar fixo no ponto na parede de tijolos na outra extremidade do pátio onde alguém tinha desenhado mais uma das obscenidades que pululavam o imaginário de garotos que mascavam chiclete excitados ao falarem sobre si próprios. A oitava série agora era resumida em: correções na fala baseadas em reforço negativo ou Laila distribuindo socos no queixo dos outros quando pronomes pessoais oblíquos eram empregados erroneamente antes de verbos ou simplesmente pelo prazer de fazer quem quer que fosse a vítima achar que tinha feito algo de errado ou como tardes de garoa voltando para casa, depois da aula, sem guarda-chuva, pois, segundo ela, a chuva era Deus ou a Deusa, não se decidia, mas fazia o devido revezamento ao explicar... Ou ainda, como o caderno de capa vermelha que chamávamos de grimório e no qual ela mantinha registros sobre pessoas por quem nutria alguma admiração ou curiosidade, além de recortes, colagens e segredos. Laila passara a ser para mim, naquele lugar aterrador, um modelo, uma referência, uma amiga a quem eu contava uma infância fictícia temendo não ser interessante para ela como ela era para mim. E então o fim iminente do ensino fundamental. O sonho recorrente no qual dançamos na nossa formatura. Descalça ela se aproxima, o hálito quente, e sussurra, diz que conseguiu, o Liceu R. F. B, que estava dentro. E então fala outras tantas coisas que não fazem sentido e eu continuo lá... Até depois de ela desaparecer completamente.
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