NOS RUÍDOS DA POESIA Nasci e fui criado na cidade de São João del-Rei, Minas Gerais. Em pequeno, gostava de ouvir histórias contadas e recontadas por meu avô, Geraldo Corneteiro. Homem invisível, desimportante e de pouca escola, mas ilustrado e cercado de palavras e sabedorias do passado. Retireiro, criador de porcos, bezerros e passarinhos, acreditava que a instrução dava um colorido no cinzeiro da vida. Meu avô era um matuto que gostava de desembrulhar a vida guardada nos livros. Lia e escrevia de um tudo. Aliás, não podia ver uma folha de papel plantada de letrinhas que recolhia todas elas no calor da hora, mas dizia que nunca tirou diploma. No depois da Guerra, quando chegou o Grupo no povoado, vovô contava 16 anos, mas já lia desembolado desde os 6. Aprendeu a tirar leitura com sua madrinha, normalista diplomada, que passava suas férias na zona rural. Com o fim da Primeira Guerra, em 1918, vovô foi convocado a tirar tarefa na escola do povoado vizinho. Sua missão era civilizar a mata, desfazer serpentes e guardar cuidado da criançada. Acabou aprendendo aritmética e herdando um embornal de livros e material escolar da professora, pouco antes dela se casar e mudar, em definitivo, pra cidade. Isso só foi possível porque Geraldo Corneteiro, meu avô, além de zelar pela segurança deles todos no Grupo, lia e encenava palavras quando era convocado a contar histórias na sala de leitura - um refeitoriozinho arranchado ao ar livre, voltado para o nascer do rio e o brotar luminoso do Sol. Poesia é um "trem danado de ruidoso." - dizia meu avô. Ah, ia me esquecendo! Vovô Geraldo foi Maquinista de ofício. E os apitos da locomotiva, sua corneta e ganha pão. Mas vamos deixar de prosa, que o tempo é de poesia. Barbacena, 25 de abril de 2020. ANO DA PANDEMIA DE COVID-19
22 parts