Minha Pequena Tupi

Minha vida nunca foi nada emocionante.
A vila onde eu cresci é pequena, feita de casas de madeira simples, cheirando a fumaça e terra molhada. Os dias passam quase sempre iguais: ajudar nos afazeres, ouvir conversas que não me interessam e me perder em pensamentos sobre como seria o mundo lá fora.

Naquela noite, a chuva batia forte no telhado e o vento entrava pelas frestas, gelado.
Eu lia um livro antigo quando ouvi um barulho vindo do quintal, algo entre um estalo e um sussurro abafado pelo vento. Fechei o livro e peguei a lamparina.
Devia ter ficado dentro de casa, mas a curiosidade falou mais alto.

Atravessar o quintal foi como entrar em outro mundo, lama, vento e o som da chuva me cegando.
O barulho vinha do depósito de ferramentas. Empurrei a porta devagar, sentindo o coração acelerar sem motivo.

E então eu a vi.

No canto, encolhida como se quisesse sumir, estava uma garota.
Molhada, tremendo, com os olhos arregalados, como se tivesse acabado de fugir de um pesadelo.
O jeito que ela me olhou fez o tempo parar por um instante. Não era só medo.
Era como se o mundo tivesse sido cruel demais com alguém que parecia tão frágil.

Eu não sabia quem ela era. Nem por que estava ali.
Mas alguma coisa dentro de mim dizia que, a partir daquela noite, nada seria como antes.