Bilhetes para um amor perdido

Depois da morte de Henrique, Olívia se tornou uma figura invisível no edifício em que mora. Silenciosa, metódica, ela observa o mundo pela janela da sala como quem tenta decifrar um código - ou resgatar a própria existência.

A mulher do 204 sempre desce para colher plantas do canteiro às terças, mas nunca parece ter pressa. A gata do 214, independente e altiva, passeia pelos corredores com mais liberdade do que os próprios moradores. O rapaz do 208 sai todos os dias no mesmo horário, olhando sempre para o chão. A vida alheia virou um diário secreto que Olívia alimenta em seu caderno de capa azul, onde registra gestos, horários, movimentos - como se aquilo pudesse preencher o vazio deixado por Henrique.

Mas tudo muda quando um buquê de flores frescas aparece em sua porta. Depois outro. E outro. Sem bilhete. Sem explicação.

Em seguida, começam a chegar as cartas. Escritas à mão, com uma caligrafia firme e elegante. As palavras são íntimas demais, como se viessem de alguém que conhecia Henrique. Ou pior: de alguém que conhece ela por dentro. Não há assinatura. Nenhuma pista.

Enquanto isso, vizinhos novos se instalam no 210. Um casal calado, que raramente é visto, mas que parece sempre atento demais. Olívia, que já observava, agora passa a vigiar. Cada flor, cada carta, cada detalhe vira uma pista. Seu caderno se torna mais que um registro: é o mapa de um quebra-cabeça que ela precisa montar - mesmo sem saber se deseja realmente descobrir o que está por trás de tudo.