Antes do primeiro sopro, eu era o Silêncio. A pausa entre as batidas do coração do universo. Conhecia o peso de cada estrela que se apagava, o último suspiro de cada império, o frio elegante que habita entre os átomos.
A existência desfilava perante mim, e eu era o portão pelo qual tudo, inevitavelmente, passava.
Era o Fim, e o Fim era tudo.
Até que um som trespassou a minha quietude eterna. Não foi um rugido ou um canto. Foi um grito. Um único, teimoso, furioso grito de início. E no instante em que quase o extingui, ele fitou-me. E viu-me.
Uma semente de curiosidade, venenosa e doce, plantou-se no meu vácuo. E começou a crescer.
Tornei-me a sombra nos seus passos, a geada que acalmava a sua febre, o sussurro na escuridão que sussurrava de volta. Aprendi o nome do seu cabelo ao sol, o mapa das suas cicatrizes, o sabor do sal nas suas pétalas quando chorava. Das minhas mãos, que só conheciam o ato de ceifar, brotaram flores.
Ela chamava-se Agatha. E através dos seus olhos, o mundo ganhou textura, calor e cheiro. Aprendi que a pele pode ficar quente sob um toque, que os lábios podem saborear a doçura e a amargura ao mesmo tempo, que um coração pode bater com um ritmo que não é o do tempo, mas o do desejo. Por ela, o meu próprio rosto, outrora apenas uma forma no escuro, aprendeu a cor do rubor.
Ela ensinou-me a viver.
E, no fim, ela ensinou-me a morrer.
Esta não é a história de como a Morte amou uma mortal. É a história de como a Morte, por um momento fugaz, viveu.
Meu amor descansa agora, não no esquecimento, mas no único lugar que sempre lhe pertenceu: no silêncio do meu coração, que um dia ela ensinou a bater.