Deitado na cama, sozinho, respirando com calma para não tossir e acordar o gato do vizinho, lembrando aqui do teu vestido cor de anil, violeta não margarida na linha esmeralda do metrô de São Paulo. O gelo, o vazio, atacam a batata da perna, que agora no meio da noite não me acorda mais com o formigamento causado pelo peso da sua perna entrelaçada na minha e meus braços sem ter o que abraçar vão buscar um travesseiro para servir de companheiro, um aconchego, o problema é que o travesseiro é frio e não tem o calor do teu corpo além disso ele é barato, não é macio como a sua pele de seda, sinto sua falta, mas falta de carência não de amor. Não durmo, fico zapeando os canais da tevê até as 4:30 da manhã enfim tomo coragem para sair do quarto, vou para a cozinha ler o jornal da semana passada, bebo o meu café recém passado e vou para o quarto me vestir para o trabalho, devo admitir a solidão me veste bem, o terno preto e gravata igualmente preta, uma camisa branca, bem passada, com sapatos velhos, rasgados e remendados, o cabelo bagunçado e uns óculos escuros de quem acabou de acordar de uma ressaca, o que me faz perguntar "Eu entrei em alguma banda de rock?" Falo de frente ao espelho do banheiro que foi rachado no meio, como um raio no céu, por um misterioso ar que deve ter ficado preso, que na fuga, de madrugada, o fez rachar, pelo menos é o que minha vó diz, já eu, acho que foi o demônio fazendo graça tentando me acordar de um sonho que não lembro mais. E apesar de não ter dormido prevejo que chegarei tarde, de novo, para o trabalho, então com apenas um café quente como café da manhã eu parto, desço as escadas do meu apartamento na vila Madalena e pego o meu pequeno corcel 75, em uma vaga apertada entre dois sedãs pretos, debaixo da sombra de uma árvore centenária, esse carro é meu orgulho, azul como o céu limpo do verão, como uma iluminação de tungstênio.All Rights Reserved
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