Sheila Heiko

Nós não aprendemos a ser bons. A amar. A gente não muda, não aprende nada novo. Está tudo conosco. Sempre esteve. Adormecido, mas estava lá. Vem de dentro. Até o momento em que alguém nos dá uma faísca pra reacender a chama e fazer-nos ser pessoas melhores. Sheila Heiko foi esta faísca para uma família e mais de trezentos jovens e adolescentes quando resolveu tentar uma última alternativa que custaria a sua vida. Embarque nesta história baseada em fatos reais da minha e da vida de todos aqueles que passaram por isso, através de memorias que, certamente, perdurarão para sempre.

[...] eu queria mesmo é poder viver tranquila na escola, em casa, na rua. Mas o que encontro acaba sendo pior que todos os pesadelos que as pessoas dizem ter. Ontem mesmo ouvi meu pai estressado gritar da cozinha que tinha nojo de mim, que se pudesse me mandaria para um orfanato, só pelo fato de eu não ter nascida totalmente de acordo com a genética dele; só porque puxei os olhos da minha mãe. E na escola chamo atenção por ser uma das garotas mais bonitas que estudam lá, mas chamo mais atenção ainda por ser uma japonesa mestiça dos olhos azuis igual aos da minha mãe. Eles me zoam de tudo o que é nome. Me ameaçam. E as outras meninas dizem que irão cortar todo o meu rosto com lâminas de barbear. O diretor não se importa, só visa o dinheiro e não quer atrair os olhos da mídia para sua escola. Meus pais? Minha mãe não sabe de nada, não consigo contar pra ela, tenho medo da maneira que ela possa querer resolver e medo de acabarem ameaçando-a também. E se meu pai já não se importa comigo em casa, imagine com assuntos da rua. Ontem me multilei, tentei cortar os pulsos mas sem sucesso por falta de coragem. Só quero dar um fim a esse pesadelo. Não sei o que faço. Alguém me ajude!? [...] ROCHA, Emmerson. Sheila Heiko - trecho. 2016.