Pequenas Bençãos No Inferno

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Betada pela querida Tai (by_taejin).

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Enquanto Namjoon seguia em um seu cavalo, numa marcha lenta e preguiçosa em direção ao Sul, sentia como se o Sol o devorasse da cabeça até a sola de sua bota gasta.

"Verão no Oeste é como encarar a face do diabo". Lembrava-se bem de ouvir a avó repetir aquela mesma frase várias e várias vezes todos os anos, quando tinham que deixar a pequena estalagem administrada pela família e seguir para qualquer canto que não fosse aquele. 

Namjoon gostaria de ter uma última conversa com a matriarca falecida, uma breve troca de palavras, apenas para perguntar a ela para quais coordenadas ele deveria fugir agora que encarava o diabo todas as manhãs no reflexo das águas sagradas da pia.

Kim Namjoon morreu em uma tarde de verão como aquela.

Vinte e cinco anos recém-feitos, todo feito de ossos magros e melancolia. A avó doente escarrando vômitos azedos e desgraça no andar de cima. Ela teria pedido a ele que partisse, se não estivesse tomada pelas torções dolorosas da cólera. Era temporada de caça e o jovem Kim era presa fácil, coberta pelo dourado mel de sua pele inocente.

Não era estúpido, já era homem o suficiente para saber do que a avó tentava fugir todos os anos. Homens de olhos vermelhos, Sugadores.

Vampiros vinham todos os anos na primeira luz do dia de solstício de verão. Bandos inteiros atrás de seu direito de guerra. Todos os que tinham algum juízo deixavam as terras secas do Oeste, alguns permaneciam apenas para se humilharem feito cães com o fronte babujado pela carniça, implorando para que se tornassem carne podre também.

Anos antes daqueles, as terras de todo o país tinham passado a sofrer com um mal vindo diretamente das profundezas infernais; aqueles que não acreditavam em demônios, os tiveram batendo em suas portas. Não se sabe de onde surgiu o primeiro Sugador, nem ao menos se sabia como poderiam ser mortos, mas eles sabiam matar. E quanto sangue foi derramado até que o primeiro soldado do Rei decidiu decapitar aquele ser repulsivo que tinha acabado de matar cinco de seus amigos.

Depois que a fraqueza dos vampiros foi descoberta, o massacre se tornou guerra e nenhuma alma que presenciou sua gloriosa carnificina teria coragem de chamar aquilo de vitória.

Quando ambos os lados já se encontravam em total decadência, um acordo foi firmado: no Oeste eles só poderiam pisar no verão, e qualquer humano que escolhesse segui-los teria que fazer junto deles sua peregrinação anual de Norte a Oeste. No Sul, se poderia ter paz.

Era um acordo tolo, e não teve como resultado paz, mas sim uma insegurança medonha que assolava qualquer um que tivesse sangue rubro em suas veias. Namjoon, nascido no Oeste, quebrou a mais elementar das regras por um motivo tolo e nobre.

Ficou porque o outro caminho era abandonar sua avó para trás, e isso não era opção. Se arrependeu, é claro, quando na primeira tarde de sua lealdade teve o corpo marcado por dois pares de presas sedentas.

Teria morrido de verdade se a avó, no seu último ato em vida, não tivesse cortado a garganta do vampiro com a faca que Namjoon usava para descascar suas laranjas.

Não foi o suficiente para matar a criatura, mas deu tempo suficiente para que o Sugador não fosse mais uma ameaça para sua fuga. Teve que lutar por noites demais dentro de seu próprio coração amortecido, para não odiar a avó por ter o condenado daquela forma.

Ela o amava, por isso o salvou da morte o lançando em uma vida de completa miséria, e Namjoon aprendeu que o amor era o mais egoísta dos sentimentos.

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