As vezes me pego tapando o sol com a peneira. Como se impedisse, propositalmente, de deixar a luz entrar. Sabe aquele calor que aconchega? Que esquenta o peito, acalenta a alma, traz um sorriso solitário e sincero. Esse calor que às vezes some e um frio desaforado invade, tira o azul do céu, esconde os pássaros que cantam perto da janela, traz preguiça em viver. A gente coloca no fundo do armário os projetos que antes, repletos de ânimo, se mostram impossíveis e distantes. A gente se sabota dizendo que não é bom o suficiente, íntegro o suficiente, nós mesmos o suficiente. Tudo parece inalcançável e os propósitos murcham, as vontades se dilaceram e os questionamentos cruéis de uma mente agora apagada, consomem o ser. Por ora até penso que pelo trabalho constante para que a luz seja contínua na vida, o esforço não se paga, que é mais fácil deixar tudo escurinho, entrar pra debaixo de uma manta e por ali ficar. Engano meu, engano seu, engano nosso. No escuro nada se vê, não se percebe, não se faz. O escuro ensurdece e tudo que ouvimos são as vozes ainda cruéis da mente traiçoeira. A mente que ficou descuidada enquanto a luz sumia, que não recebeu carinho e atenção, que não foi ouvida com paciência e zelo. A mente que uma vez tão ativa e potente, se coloca como um abismo de perguntas que levam ao preto completo. E o preto, bom, o preto confunde. O preto engana - e quando digo isso, lembre-se das roupas pretas que usamos para "parecer" mais magro ou mais confortável. O preto conforta uma mentira.
Sabendo disso, tire a manta e trabalhe dia após dia para alcançar o branco, o amarelo, o dourado, ou qualquer outro tom que reluz aos seus olhos já tão cansados e que precisam de repouso no calor aconchegante. Alcance a clareza da verdade.
Essa luz que às vezes se apaga, por mais estranho que pareça, é renovável e inesgotável. Façamos nosso trabalho para que, ao menos uma fresta de luz entre nos dias cinzas. Ilumine-se.