Entre Luz e Trevas

II

"Quando o brilho dos olhos de alguém faz cintilar também a luz dos seus, apagam as luzes do que era só amizade e acendem as do amor"

- Rodrigo Nogueira

     Os primeiros raios de sol ultrapassavam as tábuas presas às janelas, iluminando o local quase que vazio, ocupado apenas por poucos móveis, feitos de madeira maciça de pinheiro, e duas criaturas, de almas corrompidas.

- Shh calma, nem arde tanto assim, deixa eu limpar direito...

- Ai, ai... vai com calma, isso é puro álcool, óbvio que arde!

- Prontinho, asinha de frango, viu? Nem foi tão ruim assim, melhor do que pegar uma infecção.

- Meu nome é Azriel, sou da Legião, sei que não sou bem vindo aqui, mas garanto que é melhor me ter como aliado...mas, pensando bem, acho que no faz diferença, se qualquer um dos celestiais me achar aqui você vai estar morta antes de poder sequer se explicar.

     Silêncio.

- Então saia - se escora na mesa, ainda com o pano sujo de sangue do anjo - vá em frente, pode ir, só não garanto que chega vivo até o palácio, não sei se você sabe, mas por essas bandas vocês celestiais são tão odiados quanto nós demônios... e de nada por ter salvado sua vida!

     Joga o pano encima da mesa, pega o arco, aljava e sai da casa para uma área coberta por árvores. A floresta ficava praticamente no jardim já que era a construção mais longe da cidade, o que pelo menos facilitava a caça.
     Heleanor coloca o capuz e adentra a mata, voltando alguns poucos minutos depois, segurando dois coelhos.

- Decidiu ficar, asinha? quer dizer, Ariel

- Meu nome é Azriel, zzzz

- Ok, Azzzzriel - começa a preparar a refeição, rindo do tal anjo

     Enquanto acendia o fogo, Heleanor começa a se sentir fraca, parando um pouco, mas ignora, culpando a caça e o esforço para acender a lenha úmida.

- Então não vou poder sair daqui tão cedo, certo? - Azriel ri sozinho

- Certo... o que foi?

- Um anjo dependendo dos cuidados de um demônio me parece algo quase suicida, mas de qualquer forma não tenho pra onde correr, ainda mais com a perna machucada...

- Não tenho muita coisa a perder mesmo

- Na verdade tem sim, sua vida.

     Ela se levanta, olhando em sua direção.

- Insinuou que vai tentar me matar? Mesmo depois de tudo que estou fazendo?? Hã, eu mereço, além de ter que aguentar os aldeões ainda tenho mais você...

- Eu? Não, não, se enganou, gostei de ontem, mesmo quase tendo morrido, só que você é um demônio, demônios são...

- Repito, não tenho NADA a perder, ok? - diz num tom alto, interrompendo Azriel que desvia o olhar, permanecendo quieto por um bom tempo.