"A mão que vos plantara, já não lhes tem afeto
o Deus que vos criara, já não estais por perto
aquele a quem ti vos serve, involuntariamente!
não lhe tens apreço
a ti confere um preço"
tua nova sina, nada muito além de sofrimento e carnificina
Pensam que tu dirias
"a vós vesti-lo-ei e alimentá-lo-ei
e a vossa linha maquinaria
meus detritos servirão
tal como carvão
alimentando locomotivas"
Tão abominável é sua fertilização quanto seu destino
selecionado a dedo em cada estágio
sêmen do reprodutor envelopado
estupro das matrizes
sofrimento angustiante
nem do próprio corpo tem domínio
parideiras que nunca desfrutaram os prazeres do sexo
uma emoção natural, elas clamam, seria inédito
Transações financeiras
sem ter pai nem mãe
apenas uma parideira ou chocadeira
A ti consumidor, pergunto-lhe
Imaginastes um dia ser confeccionado?
escolhido e configurado por um maquinário
ter antes de nascer, seu fenótipo selecionado
Sabes o que é teu natural?
selecionados a dedo e olhos cegos
buscam fenótipos, não ponderam
se é de nossa qualidade é aderido
se tem naturalidade é descartado
odiosas são as deturpações que tu consumidor, exige
Horrendas são as deturpações que o inimigo do mundo faz
nas criações naturais que planejou vosso pai
infantes homúnculos
tal existência é uma blasfêmia
Outrora foste Melkor quem deturpaste as obras de vosso pai
transformando seres vivos em fantoches pulsantes
tal ato jamais foi perdoado pelos deuses
Transformastes lobos em pugs por estética
desvinculastes espécies de seu habitat, onde está a ética?
criar a criatura como objeto pessoal
castrar e ignorar seu instinto natural
priva-o do que a natureza lhe planejou
Pobre fruto da seleção artificial
cromoterapia básica, privam-te do verde e azul relaxante
enquadram-te em paredes cinzas delirantes
com grades, correntes e cordas
limitando espaço e preenchendo-o de hordas
Não tem direito de escolher o que comer
nós os forçamos a comer o que dermos
de tanto sofrimento em vida
de feto in vitro a viver na estória da caverna de Platão
contemplar apenas um mundo de sombras e escuridão
nós os impedimos de evoluir
seleção artificial
de questão genética, pouca variedade real
Mesmo com sua existência sendo deplorável
a vida é dura e sofrida, mas boa de se viver
em algum lugar, fora deste quadro de paredes cinza
não parece natural, é desumano
ou melhor, é humano, pois nem o animal mais bestial
faria tal deturpação doentia
afim de mera gastronomia
A morte me parece o mais suportável até agora
mesmo em estado deplorável outrora
os seres se apegam a sua vitalidade
não precisa falar a língua dos bichos para interpretar
"eu não quero morrer" eles começam a chorar
Mesmo uma vida em vidro e sombras
ainda é uma vida aponto de se preservar
o final é sempre igual
um corte na vertical
sangue jorrando, assassinato do animal
Como é caro o preço da carne
mas a conta bate?
quem paga com sangue agora não fala
mas a comanda não virá agora
está inclusa as florestas queimadas,
os quilos de grão e os litros de água?
não seria mais inteligente
alimentar seu povo carente?
Tu consumidor, apoia essa indústria
transições financeiras
não é um mal necessário
apenas ego culinário
ter um sabor ou outro em sua mesa
Que saboroso me parece
morte, sangue, pus
buscando sabor onde a dor e sofrimento
que desalento
o sabor macio e suculento da pecuária
florestas e biomas destruídos
rios e mares poluídos
doenças e pandemias
artérias entupidas e anemias
Carne é assassinato, isto é um fato
a escolha é livre e consciente
fechar os olhos e abrir a boca
é a morte de inocentes
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Seleção Artificial
PoetrySeleção Artificial é um poema que aponta os problemas éticos e ambientais sobre a forma contemporânea de produção alimentar.