A flor e o sol

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" Quero que você se lembre de mim. Se você, apenas você, se lembrar de mim, não me importo que o resto do mundo me esqueça.

Haruki Murakami" 

  As mãos que a tocavam eram quentes e macias, foi a primeira coisa que Janaína pensou ainda com o coração batendo acelerado. Naquela noite de verão, banhada pelo calor do Rio de Janeiro e um céu estrelado, a garota tropeçou num dos refletores mas, jamais atingiu o chão.  Abriu os olhos, sentindo o coração disparar ainda mais ao encarar seu herói. Os olhos dele eram afiados, apenas um possuía pálpebra dupla; tornando-o mais amendoado. A música desacelerou, ganhando uma cadência mais arrastada, hesitante assim como a respiração da adolescente, por alguns segundos não existia mais ninguém no ambiente além dos dois.  Os cabelos castanhos caíam sobre a testa do garoto, uma pintinha ocupava a ponta de seu nariz e outra o canto dos lábios rosados. As bochechas dele eram fofas, a boca se curvou num sorriso brincalhão enquanto as mãos cuidadosas a ajudavam a ficar de pé corretamente.

  — Acho que o refletor entrou no seu caminho — folgou a gravata azul, deixando-a o mais folgada possível. 

   Um terno preto envolvia seu corpo esguio, os calcanhares amassando o fundo dos sapatos sociais fizeram a garota sorrir. O estranho exalava um perfume forte, com algum toque de canela, na cabeça de Janaína o cheiro combinava com a pele amarelo-acastanhada que adquiria um brilho dourado sob as luzes da festa. Em todos os seus 16 anos de vida, nunca pôs os olhos em alguém tão bonito quanto ele, poderia passar horas apenas apreciando o modo como as mãos de dedos longos repousavam na lateral da calça social.

   — Obrigada por me segurar — deu um pequeno aceno com a cabeça, tentando conter o sorriso de nervoso.

    Ele não parecia muito mais velho, o rosto ainda se agarrava às feições juvenis, era apenas um garoto, um do qual Janaína não conseguia tirar os olhos. Comparecer a festa finalmente se mostrou proveitoso, até aquele momento tudo o que fizera foi reclamar de como o vestido azul pastel esquentava; pelo menos o modelo favorecia sua cintura, deixando-a marcada. Também praguejou sobre os saltos machucarem os pés e como seria difícil remover a maquiagem mas, olhando para seu herói desconhecido, todas as reclamações sumiram, tudo o que conseguia pensar é que estava encantada em conhecê-lo.

     — Não foi nada, eu estava a caminho da mesa de bebidas — olhou na direção da cascata de coquetel. 

O ambiente da festa era amplo, pilastras no estilo grego seguravam o teto da área ao redor de onde ocorria a comemoração. Estavam num pátio a céu aberto, parte de uma casa de eventos. Mesas redondas ocupavam boa parte da área, um palco ao fundo abrigava a banda, que alternava entre clássicos da música brasileira e hits atuais. Os refletores espalhados pelos cantos, iluminavam o chão de piso polido.
 
  — Eu também — o universo estava sendo bom até demais. — O tempo está muito quente.

   Mesmo a céu aberto, o clima seguia abafado, algo já esperado, afinal Fernanda Abreu não cantava Rio 40° graus a toa. 

  — Eu te acompanho então — sorriu e os olhos se encolheram virando dois riscos.

   As feições orientais a fizeram questionar se ele possuía alguma ascendência japonesa, já que a comunidade era tão grande no Brasil; resolveu ignorar a dúvida, seria inconveniente perguntar. Seguiram para a mesa de bebidas, o enorme tampo de madeira possuía desde uma cascata de coquetel de morango até garrafas de uísque. Era o aniversário de 20 anos da empresa em que o pai dela trabalhava, as famílias dos funcionários foram convidadas, todos envoltos no clima festivo, regado a drinks e boca livre. A ideia de comparecer às festividades a princípio pareceu odiosa, agora a garota desejava que a festa se estendesse até o amanhecer, apenas para ver o Sol nascendo enquanto estendia seus raios sobre a pele dourada dele.

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