Único.

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— E assim vos declaro, marido e mulher — a voz do envelhecido padre ecoa por toda a igreja, e, junto aos olhos esbaforidos de todos os presentes no local, continua: — Pode beijar a noiva.

A igreja, que tinha uma decoração toda em tons rosados, estava lotada; tantas pessoas, das mais variadas. Mas assim que aquelas palavras são ditas pelo padre, uma salva de palmas dessincronizada se inicia, e até alguns assobios são ouvidos — todos unidos e felizes em prol do casal. Tudo diante a cena do homem retirando cuidadosamente o véu do belo rosto da mulher e a beijando de forma calorosa em seguida.

Senti-me assistindo a mais um dos clássicos filmes de romance que minha mãe adorava. No entanto, naquele momento, era uma das personagens. Obviamente não era a personagem principal dessa história, estava mais para coadjuvante, mais precisamente a melhor amiga da principal, que aparece totalmente em pró de ajudar a mocinha em sua jornada amorosa. Na verdade, acredito que sempre fui essa pessoa na vida de Heloísa, uma das minhas melhores amigas da época de escola.

Nos conhecemos quando ainda tínhamos apenas quinze anos e estávamos começando o ensino médio, e mesmo após dez anos ainda mantinhamos o contato — não tanto quanto antes, mas ainda era algo significativo diante de nossas vidas ocupadas. Desde que éramos mais novas, Heloísa era a garota que chamava toda a atenção para si, e não era para menos. Era linda, inteligente e tinha uma personalidade que encantava a todos; eu tinha quase cem por cento de certeza que era impossível não cair de amores por ela. Já eu sempre fui a mais tímida, que escolhia ficar mais quieta e evitar que a atenção fosse voltada para mim, os holofotes não eram para mim. E mesmo com nossas diferenças, nossa amizade desenvolveu-se de maneira saudável e forte, o apoio era mútuo e o afeto que tínhamos era inigualável, e nos mantivemos assim desde então.

Estava feliz de Helo estar se casando. Principalmente por saber que minha amiga estava ao lado de alguém que a amava tão profundamente quanto ela merecia, e que, obviamente, o amava na mesma proporção. Conseguia sentir a felicidade da outra de onde estava, o sorriso bonito que ostentava em seu rosto demonstra bem isso. Era reconfortante lhe ver assim, no entanto, não podia negar que me sentia um tanto deslocada na situação que me encontrava.

Beirando meus vinte e seis anos, ainda não havia encontrado ninguém; não era casada, não estava noiva, não namorava e nem ao menos tinha algum flerte no trabalho ou coisa do tipo. E, aparentemente, era a única da época de escola que ainda estava solteirona e isso ficou ainda mais visível agora que estamos na festa de casamento. Todas as presentes na mesa estavam com algum acompanhante, seja lá o que fossem delas. E mesmo que estar sozinha não fizesse lá grande diferença para mim, era meio constrangedor; principalmente por conta de algumas perguntas importunas que me eram lançadas sobre minha — inexistente — vida amorosa.

Agradeci quando uma música lenta se iniciou, acreditei ser Destiny do Jim Brickman, e todos praticamente correram até o centro do salão para dançarem junto ao casal da noite. Era uma das poucas que continuava sentada, além de mim deviam ter só algumas crianças cansadas de correr por aí e uns idosos cansados da vida mesmo. Continuaria ali até dar minha hora de ir embora, minha presença era unicamente para presenciar a alegria da minha amiga, não havia mais nada que me prendesse a ocasião se não isso. Peguei a garrafa de espumante no centro da mesa, o abri e despejei parte do líquido em minha taça vazia, e enquanto fitava Heloísa e Cláudio — seu recém-marido — dançarem, acabei com toda a bebida dali.

— Clarissa?

Estava pegando a garrafa de espumante mais uma vez, quando ouvi me chamarem. Não reconheci a voz de primeira, apesar de achá-la estranhamente familiar. Virei-me à procura da dona e sorri com quem havia encontrado às minhas costas.

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