A Hera

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"É melhor que seus olhos estejam em outra coisa assim que eu olhar para você novamente." - a voz de Bellatrix soou distante, como se ela estivesse embaixo d'água. Andrômeda esteve encarando - fixamente, sem piscar - a porta oposta a de sua cabine. A cabine em que Ted Tonks estava.

Quando finalmente criou coragem o suficiente para desviar o olhar, nenhuma de suas irmãs estava prestando atenção nela. Bella estava absorta lendo um livro de Magia das Trevas que provavelmente havia roubado da sessão reservada da Biblioteca ou comprado por um preço exorbitante em algum lugar suspeito na Travessa do Tranco, e Narcisa parecia ocupada demais admirando os próprios sapatos para dedicar um pouco de sua atenção a irmã - ou talvez apenas não tivesse coragem de o fazer após trair sua confiança.

O Expresso de Hogwarts ainda estava muito longe de completar sua jornada e chegar a King's Cross e encerrar o pavoroso quarto ano em Hogwarts de Andrômeda. 

Ela havia beijado um Nascido-Trouxa. E sido pega o fazendo. Narcisa havia estragado tudo. Mas ainda assim, ao olhar para a irmã mais nova, Andrômeda não sentiu nem mesmo uma gota de ressentimento.

Algo estava errado nela. Tinha de estar. Nem sequer um Black de verdade havia se apaixonado por um Nascido-Trouxa.

Ela nem podia dizer com total certeza que estava de fato apaixonada. O que ela sabia sobre amor? Tudo o que os Black amavam era sua Pureza de Sangue e então casavam-se por isso, por dinheiro ou por qualquer outra conveniência, mas raramente por amor.

Tudo o que Andrômeda conhecia era o amor familiar. Aquele que toda criança é ensinada a sentir. Começa quando te ensinam a dizer "eu te amo". Você repete aquilo tantas vezes nos primeiros anos de vida que passa a acreditar e realmente sentir aquilo no seu coração. Mas o quão diferente aquilo poderia ser de amor de verdade? O quão diferente era de amar alguém a quem não se conheceu por toda a vida, mas que gostaria de passar o resto dela ao lado?

Para Andrômeda, descobrir custaria um preço muito alto a se pagar.

Viver no Largo Grimmauld era quase como estar presa em um daqueles dispositivos trouxas que reproduziam imagens gravadas - televisões, era isso que os trouxas as chamavam -como se tudo estivesse em preto-e-branco

Tudo era sempre o mesmo: Rumores da Elite de Sangue-Puro, boas maneiras e o repúdio diário a qualquer um que não tivesse o sangue tão puro quanto o deles.

Com Ted era diferente. Era como se tivesse estado presa em uma noite escura por mais de uma década e então finalmente alcançasse a luz do dia, tornando tudo o que antes era preto-e-branco em cores vibrantes.

Como se o mundo mudasse e mostrasse novas e melhores versões - das coisas, e dela mesma - imaculadas pelo peso de pertencer a Mui Antiga e Nobre Casa dos Black. Sem o peso da pureza de sangue controlando sua vida.

Mas viver nesse mundo ainda custava um preço muito alto a se pagar.
Ted fazia parte dela agora, enraizado como hera ao redor de uma casa de pedras.

Mas aquela era uma hera que ela teria de matar

*

"Onde você estava?"- Bellatrix perguntou, assim que a porta se fechou atrás de sua irmã.

"No Beco Diagonal." - Andrômeda respondeu rapidamente.

"Está mentindo." - Bella não perguntou. Tinha certeza de que a irmã havia mentido. - "Estava se esgueirando por aí com aquele Sangue-Ruim, não estava?"

"Eu estava no Beco Diagonal!" - Andrômeda repetiu, mais firmemente. - "Você pode perguntar aos Prewett. Eles me viram lá."

Bellatrix não pareceu convencida, mas decidiu que apenas perguntaria aos Prewett da próxima vez que os visse. 

"É melhor que seja verdade. Farei com que se arrependa pelo resto de seus dias se trair essa família, Andrômeda!" - a bruxa disse, subindo as escadas e deixando a irmã, com o coração aos saltos, para trás.

É claro que ela já havia dito a Molly Prewett que confirmasse a história de que a havia visto se perguntassem a ela.

Todo o tempo que tinha com Ted agora eram momentos roubados em tempo emprestado, se escondendo das irmãs que pareciam estar sempre um passo logo atrás dela.
 
No fim das contas, ela não pôde matar a Hera, e agora as raízes cobriam a casa de pedras.

*

"Quem?"- Andrômeda perguntou, incrédula.

Era seu aniversário de 16 anos. E por mais que ela soubesse que em algum momento do dia seus pais a chamariam para contar que haviam prometido a mão dela em casamento a algum Sangue-Puro qualquer, ela não podia imaginar quem haviam escolhido.

"Rabastan Lestrange!" - a mãe repetiu, impaciente.

"Mas por quê? Vocês já tem uma Black se casando com um Lestrange!"

"Acreditamos que fará bem as duas dividirem uma casa, além desta. Você e sua irmã podem fazer grandes coisas pela nossa Causa se estiverem juntas na mesma família." - o pai respondeu.

"Como o que? Ter filhos?" - Andrômeda perguntou, irritada. 

"Querem que eu fique de olho em você." - Bellatrix respondeu, com um sorriso zombeteiro no rosto - "Para que não faça nada que nos envergonhe. É por isso que temos de dividir uma nova casa.".

Ela estava sentada ao lado do noivo, olhando a todos da festa com ar de superioridade. Desta forma, ela mal parecia tão desgostosa com o seu noivado quanto Andrômeda com o dela. Ela parecia feliz. Orgulhosa, até. Mas nada passava de fachada.

"Você deveria ir se sentar com ele." - Druella sugeriu, e Andrômeda obedeceu, arrastando lentamente os pés em direção ao assento vago ao lado de Rabastan.
Ele não disse nada além de "olá", o que Andrômeda respondeu rapidamente sem sequer olhar para ele. Não trocaram nenhuma outra palavra, o que permitiu a Andrômeda tempo o suficiente para imaginar um futuro em que passaria o resto de seus dias junto ao bruxo que se sentava a seu lado.

Mesmo que pudesse se livrar da Hera, jamais poderia amá-lo. Não como amava Ted.
Talvez não houvesse algo de errado nela. Talvez houvesse algo de errado na Mui Antiga e Nobre Casa dos Black.

*

"Vai se casar com quem?" - Ted perguntou, em uma voz que soava como uma mistura entre uma risada e um quase grito de desespero.

"Rabastan Lestrange..." - Andrômeda respondeu, melancólica - "Por favor, não me faça repetir!"

Ted não resistiu à risada. 

"E morar com a sua irmã louca e criminosa pelo resto dos seus dias, ou dos dela?"

"Não tem graça nenhuma!" - a garota respondeu - "O que nós vamos fazer? Vamos sentar e observar o que nos tornaremos? Você vai ir a festa de casamento? Beber do nosso vinho e brindar?"

"Eu duvido muito que sua tia me deixaria comparecer a um evento tão importante." - Ted disse, ainda rindo.

Ainda assim, nenhuma risada saiu dos lábios de Andrômeda, então ele parou de rir também.

"Fuja, então." -  ele disse - "Comigo."

*

A primavera se aproximava tão ligeira quanto o medo iminente.

Os dias se tornavam noites rápido demais,  e traziam Março mais rápido ainda.

Deixaria aquela casa e sua família para sempre, ela sabia. Era o preço a se pagar. Um preço que ela estava disposta a pagar de bom grado.

Iniciaria uma guerra na família, ela sabia. Era a luta de sua vida.

Uma luta que valia a pena lutar.

*

// Esta história foi inspirada na música da cantora Taylor Swift, Ivy. Não se esqueça de votar e comentar! 💕

Ivy • Fanfic 10Onde histórias criam vida. Descubra agora