Quando criança eu me achava especial, podia afirmar que tinha poderes. Claro, era apenas a imaginação de uma criança, quando fiquei mais velho sonhava em viajar o mundo com os meus próprios pés todas as noites, ficava hipnotizado ao olhar o horizonte, era como ser seduzido pelo mundo, até mesmo a brisa suave em minha pele parecia pedir para que eu fosse até lá, a questão era, lá era lugar nenhum, ainda sim eu precisava ir, abandonei meu terceiro emprego, minha segunda faculdade com 100% de bolsa, tudo era sufocante, parecia que eu nunca me sentiria bem se não deixasse o mundo me guiar para onde ele quisesse que eu fosse, então eu fui, com uma mochila a roupa do corpo e uns trocados.
Deixei as sensações mais estranhas me guiarem, arrepios na nuca, cheiros misteriosos, mudanças de temperaturas repentinas, isso me fez andar por florestas, cidades cujo os ônibus estavam coberto por grossas camadas de poeira, atravessar montanhas que quando olhei para trás só pude pensar que havia feito o impossível, eu havia caminhado pelos picos que se escondiam na neblina do horizonte, pelas paisagens mais bonitas que os olhos podiam ver, eu havia pisado nelas, me peguei diversas vezes sorrindo sozinho em lugares isolados.
Nem tudo foi perfeito, muitas vezes precisei comer larvas entre as lascas de madeira ou água em poças de lama sem sequer ter certeza se realmente era água, e a muito tempo atrás quando ainda atravessava cidades era bem pior, não haviam poças, o chão era asfaltado, e a comida do lixo era disputada, o mas estranho foi que, eu abandonei uma casa quentinha, uma vida confortável onde eu comprava tudo no mercado ou pedia para alguém levar até a minha casa, e mesmo assim não sentia remorso ou vontade de reclamar, era ruim sim, mas era apenas necessário.
Não sei quanto tempo se passou, não sei qual foi a última vez que vi uma pessoa, na verdade parando para pensar, faz alguns dias que não vejo nem animais, às árvore estão se mostrando em menor quantidade, o ar parece diferente, as tarde parecem ser mais longas mas o sol não me incomoda, na verdade não sinto calor algum, sequer sinto frio a noite, algumas vezes me peguei pensando porque continuava em frente, para onde era frente, mas simplesmente sentia vontade de andar e por algum motivo tinha que ser naquela direção, se eu ficasse muito tempo parado fosse para outro lado ou pensasse com muita força na possibilidade de voltar incômodo se instalava em meu peito, desânimo percorria em minhas costas deixando meus ombros caídos, assim como eram antes de começar a viagem, então eu apenas continuava, ainda sorria quando olhava para trás.
Eu estava feliz, mas conforme andava meus sentimentos ficavam para trás, eu deveria ter percebido quando o sol não me fazia suar e a noite não pedia para que me cobrisse, agora o perigo não me causava medo e a caminhada não me deixava cansado, passei a dormir com a lua em seu auge e acorda antes de céu se tornar azul, algum tempo depois sequer dormia, deveria ter achado estranho mas também já não era capaz de tal sensação.
Foi então quando até mesmo a felicidade se tornou infame, que o mundo se mostrou para mim, no pico de uma montanha sem vida vegetal, sendo observado pelo sol de um lado e a lua do outro, o vento começou a balançar meu cabelo para o alto com toda força, e só assim eu pude saber o quão forte ele estava, já que não sentia, em minha frente a realidade pareceu sibilar, como o calor que sai da chamas e tornam tudo por trás dele turvo, de repente ele se abriu como um véu, mas por trás dele só havia a mesma paisagem de antes, garras enormes passaram por ele, parecia que ela estava o abrigo, como uma cortina aquela linha entre o distorcido e o normal se estendeu abrindo se até os céus e dando passagem para uma cabeça enorme, se fosse fazer uma assimilação diria que era um felina, algo entre um lobo e uma raposa, mas de longe podia ser comparado com um dos dois, não pelo tamanho mas pela aparência, ainda sim o cérebro humano é limitado nos fazendo viver de assimilações.
Talvez eu tivesse vendo a coisa mais incrível do mundo todo, mas não conseguia apreciar não conseguia sentir, um focinho maior que meu corpo se pressionava contra mim, os pelos da criatura pareciam uma tempestade que foi congelada em seu auge, cada pelugem parecia um raio e entre eles percorriam nuvens azul escuro, passei a mão em sua parte e onde alisei seu pelo ficou parecido aço derretido, rígido como concreto, mas passando a mão novamente para cima se tornava uma tempestade fofa e macia de se passar a mão.
Eu sabia que era lindo, mas não sentia nada, o sorriso não aparecia em meu rosto, a criatura que não havia posta nem metade de seu corpo para fora do véu voltava novamente para onde viera, me chamando para acompanhá-la, eu fui, pensando que se alguém me pergunta-se se valeu a pena eu não poderia resposta, afinal não estava significando nada para mim, me pergunto se é assim que os deuses se sente, vazios, se nada os faz mal, nada os faz bem.
Hoje eu sento em um troço de aço derretido, do qual pode se tornar tempestades magnífica, quem sentir meu cheiro ou a leve sensação de minha presença, irá querer o meu lugar, largará tudo para está a onde estou, o auge da sua vida, o objetivo inalcançável, a conquista final, porém, quem chegar aonde eu cheguei descobri que, aqui de cima eu nunca vive, posso existir, mas apenas isso.