Só um garoto

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Meus dedos escorrem pelas nuvens de seus cabelos. Uma mecha sedosa se enrosca em meu indicador; macia e reluzindo em azul sob a luz da TV. Mordo o lábio contendo um sorriso, faço um cafuné e o sinto se inclinar mais para meu toque. Não me lembro do porquê escolhemos um filme de terror, mas Jungkook parece entretido. Eu me interesso muito mais em acariciá-lo, massageando a base de sua nuca, explorando a pele quente sob meus dedos. A neve lá fora ainda não parou de cair, não há a menor chance dele ir para casa com as pistas bloqueadas. Silenciosamente agradeço por isso.

 Encolho-me quando alguém grita no filme e Jungkook explode em risadas. Bate palmas e toma fôlego, se deliciando no meu desespero. Bufo jogando uma almofada em sua direção, droga de filme!

 — Ri aí, não é o seu coração que parece prestes a sair do peito — faço um tsc quando viro fingindo estar chateada. 

 — Quem disse? — seus olhos de galáxia brilham, quando ele senta com o rosto próximo demais ao meu.

 Engulo em seco, deixando que pegue minha mão e a leve até o próprio peito. O calor se espalha por minha palma; mesmo coberto pelo moletom aveludado ainda posso sentir os batimentos fortes. Jungkook tem as bochechas coradas quando ergo o olhar para encará-lo, uma pintura da inocência e travessura fundidas. Inclina a cabeça, como numa pergunta silenciosa, um convite.

 — Se assustou também? — nega e eu deixo que o sorriso me tome, ciente do que a alteração de pulsação significa. 

 — Você causa isso.

 Moldo seu rosto com minhas mãos, acariciando as bochechas avermelhadas. O gesto leva cor a suas orelhas também e rir é inevitável. Ao lado dele, a felicidade me enche, transborda até que tentar conter se torna inevitável. Este momento é tudo o que importa, a forma como a ponta de seu nariz desliza contra a minha e seus lábios crispam contra os meus. O frio já não parece tão ameaçador, calor toma cada parte de mim, aquecendo até o coração endurecido. 

 Abraço Jungkook, afundando na maciez de sua vestimenta e me embebendo no perfume floral. Quando ele me aperta contra si, tão apertado que os temores vazam por meus poros, soluço, deixando a primeira lágrima cair. Me sinto segura, não preciso de nada além de sua companhia e xícaras de chocolate quente. Queria que a vida não corresse, que o tempo fluísse em gotas, me dando mais momentos ao lado dele. Eu jamais seria capaz de traçar o contorno perfeito de seu rosto ou pintar a nebulosa em seus olhos. Mesmo assim tentaria, passaria a eternidade memorizando a maneira como Jungkook cobre as orelhas ao se envergonhar e encolhe o nariz.

 Sua voz já me fez companhia em muitas noites, o sono vinha envolto nas melodias de Jungkook. Um afago em noites difíceis, um sorriso em noites tranquilas.

 — Obrigada, por hoje — sussurro me afastando. 

 Os últimos dias têm sido difíceis, me fazendo sentir que no mundo ninguém jamais me entenderia. Aqui todas as aflições somem, ao seu lado não sou solitária, Jungkook me faz gostar de ser quem sou, até as partes estranhas. 

 — Não precisa agradecer, eu não vou a lugar nenhum — seu sorriso é como os primeiros raios de sol iluminando a manhã.

 Gostaria de acreditar que sim, mas sei que não será desse jeito.

   Me inclino, lhe selando de maneira rápida. Traço a linha de seus lábios rosados, como pode ser tão lindo? A imagem de seu sorriso nunca deixará minha memória. Seu rosto deveria estampar galerias, esculpido com a perfeição de um profissional. É surpreendente que alguém tão atraente possa ser tão amável. Apesar de tudo, no final ele ainda é um garoto que gosta de meias do Homem de ferro. Encaro a TV, não consigo mais distinguir o que está passando e meu peito dói. Lágrimas rolam quando volto a fitá-lo, odeio a expressão de preocupação em seu rosto.

 — Eu te amo, nunca se esqueça — sorrio lhe abraçando. 

 Sei que Jungkook não vai me soltar, que não irá a lugar nenhum, mas, eu vou. O som estridente fica mais alto e os cantos da minha visão começam a borrar. O aperto uma última vez antes da escuridão me tomar.

 Rolo até alcançar o celular, desligo o despertador e a tela de bloqueio aparece.  Uma foto de Jungkook num ensaio da Fila, a luz vermelha cobrindo toda a pele. Os olhos fechados e o rosto voltado para cima. Lindo.

 — Você não me conhece — sussurro tentando me agarrar aos detalhes do sonho. 

 Lá fora o sol brilha e o meu coração ainda parece pesar como uma pedra. No entanto, sorrio ao ver um vídeo de Jungkook cantarolando, ele ainda é só um garoto numa tela, mas um que me faz muito feliz.

Just a boyOnde histórias criam vida. Descubra agora