Preferia ter pedido férias para esta altura, não consegui dormir absolutamente nada, é sempre assim. Porque sou burra ao ponto de pensar que só porque nos dias anteriores a esta data estou relativamente bem, vou continuar bem após viver o luto da perda de Kevin?
Nem mesmo a maquilhagem consegue esconder os papos negros que se formaram nos meus olhos, no geral a minha aparência é deprimente, talvez o meu chefe nem repare na minha aparência.
Após deixar o café do meu chefe em cima da sua secretária, como de costume, vou para a minha e começo a trabalhar, o meu telemóvel vibra subtilmente e quando verifico quem é, ainda fico mais depressiva. Nos últimos dias a minha mãe tem-me ligado, calculo que seja por não ter ido ao jantar de família no feriado. A relação que outrora tive com a minha mãe desvaneceu-se no dia em que perdi o Kevin, eu isolei-me do mundo, afastei-me da minha família e amigos, e só quando comecei a trabalhar a minha vida social passou a ter algum movimento.
Não consigo de maneira alguma fazer o meu trabalho correctamente, o cansaço é demasiado para me manter acordada por mais de 5 minutos, os cinco relatórios das reuniões que enviei para o meu chefe voltaram para trás com notas, tive que os revisar e emendar.
No fim do dia fui para casa, finalmente podia descansar um pouco, no fim de jantar e deixar tudo pronto para o dia seguinte deitei-me no meu sofá e no preciso momento em que ia a fechar os olhos a campainha toca, levanto-me com um sentimento de irritação e cansaço a apoderar-se de mim. Sigo até à porta pronta para gritar com a Cece, mas sou surpreendida pela minha mãe e a minha irmã.
- Olá Victória, estás com péssimo aspecto. Porque não me atendeste os telefonemas? - Ela diz calmamente, entrando pela casa adentro.
- Olá Vic, não consegui evitar que ela viesse, temos estado tão preocupadas contigo. - A Cath disse dando-me um terno beijo na testa. Mesmo após ter afastado toda a minha família, de algum modo, a Cath entendia-me, continuava a tratar-me como se nada se tivesse passado. Quer dizer eu via dor que ela sentia ao ver-me assim mas não havia nada que pudesse fazer.
- Olá mãe, Cath o que vieram aqui fazer? Mãe porque estas em Nova York? - Disse na tentativa de que elas se despachassem e se fossem embora.
- Vim ver como a minha filha está, já que não me atende as chamadas e não aparece sequer no jantar de feriado. - Disse como se eu não entendesse uma única palavra do que ela dissera.
- Não estava com espírito para jantares de família e felicidade. Eu sou feliz aqui.
- Sim Victória, tens dito isso nos últimos quatro anos, não te vejo melhorar ou feliz. - Veio em direcção a mim. - Tu não te esforças para viveres Victória, o Kevin não está mais aqui, há quatro anos que ele partiu! - Estas palavras apesar de serem verdade foram como um soco no estômago, tentei manter a calma antes de dizer o que quer que fosse, esforcei-me para conter as lagrimas. A Cath foi na direcção da nossa mãe agarrando-a por um braço e dando-me um olhar que dizia para não dar importância ao que ela acabara de dizer.
- Mãe!! - Cath advertiu-a.
- Não faz mal Cath, eu não quero discutir. Se foi isso que vieste aqui fazer mãe, então... podes ir-te embora. - Disse com uma voz calma.
- Victória já chega! Tens vivido assim - ela apontou a toda a sua volta acabando em mim. - Por quatro anos, já chega de luto! Já chega Victória! Tens que viver e ser feliz, és tão jovem. - A voz dela baixou várias oitavas ao proferir as últimas palavras com pesar. - Eu quero a minha filha de volta.
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Uma Vida de Memorias
RomanceVictória e uma jovem de 24 anos que vive presa no passado e nas memórias do grande amor que outrora viveu com Kevin. Mas não sao só as boas memórias que perduram, também as memórias de como uma vida feliz e completa pode acabar de um momento para o...