caos.

34 7 6
                                    

Todas as manhãs são como fogo atravessando o vazio. Acordar diretamente dos sonhos de outra pessoa é como se toda a sua vida seja apenas uma infinidade de incertezas e razões fúteis de existência. O céu não acordou tranquilo como todos os dias, despertou como se o próprio Lúcifer personificado estivesse entre nós e isso nem aconteceu hoje, foi semana passada. Um ser capaz de me causar arrepios e nem estou falando do próprio e sim de seus secretários. Aqui onde eu moro não é muito comum receber a parte ruim dos anjos, mas as vezes acontece uma visita de rotina para fazer uma algazarra. Eles dizem que o céu é um lugar tranquilo demais e a calma não traz emoção. Ultimamente tenho vivido tantas emoções que desconfio a minha capacidade de ser tão angelical do jeito que fui treinado.

"Anjos não têm sexo" - foi o primeiro módulo do treinamento.

Fazer duas pessoas totalmente desconhecidas se encontrarem para sempre não é a função mais fácil do mundo e hoje mais do que nunca até mesmo meu apetite pelas frutas mais gostosas do mundo estava escassa.

Então antes mesmo de me levantar um dos meus irmãos malvados invadiu o meu quarto para atormentar a paz de quatrocentos anos de um anjo.

- Vamos acordar, Marvie! Ou você acha que as flechas que você espeta nos outros serão lançadas sozinhas?

Era Godness, sua capacidade de ironia partia do seu nome e atravessava os limites da paciência. Carregava o fardo de ser o demônio dos conflitos. Outro dia posso jurar que vi o monge Falco quase desistir do paraíso por causa dele. Godness não sabia, mas aquele era o meu último dia no céu. Hoje seria o meu julgamento.

O pecado? Me apaixonei pela alma mais bela e singular de toda a Terra. E a Terra para o chefe era o lugar mais precioso para ele e sendo sincero, aquele lugar estava uma bagunça por tanto tempo que a última coisa que ele precisava era de um dos funcionários se apaixonando por uma humana.

Eu basicamente me apaixonei pela filha do chefe!?

Após enxotar Godness e me preparar para meu julgamento, calcei os sapatos mais limpos que tinham no meu armário e caminhei vagarosamente até o gabinete principal.

Estavam todos lá para o marco inédito.

Naye ficava na minha cabeça 24 horas por dia. Eu ouvia os seus pensamentos, as piadas ruins que ela acabava não falando em voz alta, a obsessão por comidas salgadas e o desespero na aula de matemática. Era como se as milhares de faces que já tive esperassem apenas um propósito: encontrá-la. Me vesti com a minha melhor roupa. Talvez eu pudesse vê-la pela última vez, mesmo que seja apenas em um de seus sonhos abstratos.

Ela sabe que existo. Uma vez tropecei nos meus próprios pés quando fui à Terra para procurar a sua alma gêmea e descobri que sua cor favorita é azul. Também é a minha cor favorita. Acabei me personificando e nos encontramos algumas vezes. E por mais que seja errado, poucas coisas são tão boas quanto amá-la ou comer pizza.

- Protesto! - ouço um dos anjos acusadores dizer me tirando do transe em que me encontrava desde que o julgamento começou. - Onde já se viu um ser divino se apaixonar por um ser mortal? Talvez seja uma piada para vocês, mas a vida eterna não é uma brincadeira. Marvie é culpado!

- Por Deus, Leon! O amor é uma das coisas mais belas já criadas. Se somos capazes de fazer com que sintam amor, também podemos sentir. - diz Kavi em minha defesa.

- Então assuma seus próprios atos e desça para o inferno. Queime todos os dias pensando em seus próprios pecados, Kavi. Não queira mudar as regras desde o início dos tempos.

- O início dos tempos é passado! Se pode amar à mim, pode amar um ser humano.

- Nós não somos humanos! - esbraveja Leon.

Chaos.Onde histórias criam vida. Descubra agora