Parte II - A resistência dos espinhos

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— Aymuray, você não está me ouvindo!

Ela realmente não ouvia o que dizia Oscar, seu novo amigo, filho do Ministro das Relações Exteriores. Era um rapaz borbulhante de conversa agradável, exatamente o tipo de companhia adequada para uma festa matinée. Contudo, a mente de Aymuray se encontrava ocupada com os acontecimentos das últimas semanas. Tinha se esgueirado muitas vezes até a biblioteca do palácio, lá descobriu um pouco mais sobre o que significava ser uma Rainha das Rosas. Não era infundado aquele nome, a Rainha tinha de fato rosas florindo sobre sua pele. Estas promoviam uma conexão com a terra formando um elo entre os humanos e as forças da natureza. Aymuray não compreendeu tudo que lia, mas a função da rainha lhe pareceu muito nobre.

A adolescente conseguira convencer seu pai a deixá-la participar da disputa. Salum foi vencido pelo cansaço porém acrescentou que, caso sua mãe desaprovasse, eles voltariam para buscá-la. Aymuray contava com a possibilidade de sua mãe vir a saber quando já fosse tarde demais. Seu pai partira há dois dias, porém não se sentiu deslocada sem ele. Acostumou-se com o conforto de ser servida por criados invisíveis. Era uma bênção não mais ouvir a voz da pessoa que penteava seu cabelo de manhã, como se tudo se alinhasse por mágica.

— Tenho tanta pena dela. — Oscar suspirou tirando-a de suas reflexões.

Ambos olhavam para a Rainha que estava, como sempre, embaixo do caramanchão. Aymuray nutria cada vez mais admiração por ela, queria muito conhecê-la de verdade. Não chegou a ter oportunidade de nada além de cumprimentar Sua Majestade e agradecer pela amável hospedagem. Não conseguia entender porque Aurora não seria mais rainha se cumpria o papel com perfeição. Ela era altiva, eloquente, sua postura era invejável.

— Pena? Da Rainha? — questionou visivelmente irritada.

— Sim. Você não vê? Ela pensa ser a rainha mas é apenas um peão. A Rainha não manda efetivamente em nada, quem faz isto é o Gabinete. A função dela é apenas manter a popularidade do governo, ela é, como se diz, "um algodão entre cristais".

— Está dizendo que estou disputando um título inútil? — ela se irritava mais e mais.

— Eu rezava para que mudasse de ideia...

— Eu sou, como se diz, "uma cabeça-dura".

Ele desmanchou o sorriso de repente.

— Aymuray, nossa sociedade não é igual a sua. Você é honesta e gentil. As pessoas aqui parecem honestas e gentis, só isso importa. Eles vão fazer um bolo com você sem deixar que opine sobre o sabor que deseja. Já vi muita coisa horrível mas o pior é que sei que não vi muito. — proferiu com pesar.

Ela rolou os olhos. Oscar balançou lentamente a cabeça. Baixando o tom de voz ele questionou:

— Você pelo menos sabe que as garotas nunca mais viram seus pais?

Os músicos começaram uma valsa e eles tiveram que interromper a conversa.

⊰✿⊱

No final da matinée, Aymuray foi sozinha até o caramanchão. Seu teto era grinalda da rainha e sua base eram pequenas rosas brancas. Tão perfumado e exuberante, poderia ser o altar de um casamento. Ao olhar para o chão, reparou em um objeto amarelado entre as flores, parecia uma pedra redonda, era difícil saber exatamente à luz do lusco-fusco. Havia algo mais lá dentro, ela colocou a mão para tentar tirar.

— Admirando as trepadeiras?

Ela deu um salto para trás. Era Salazar, seu tom de voz era de repreensão, como se tivesse pegado uma criança no meio da travessura, porém mantinha um sorriso amigável. Aymuray havia quebrado um espinho no dedo por conta do susto, ele ainda estava preso mas não tinha coragem de tirá-lo. Barbosa segurou a mão dela com firmeza, sem hesitar, levou o dedo à boca e arrancou o espinho com os dentes. A moça fitou-o perplexa mas não falou nada. Nem mesmo quando ele recomendou, com uma doçura cínica, que ela tomasse mais cuidado com onde colocava suas "delicadas mãozinhas".

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