Estímulo

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Às vezes, tudo o que precisamos é de um estímulo. Um gatilho, um ponto de partida. O estopim, aquilo que gira a chave e faz o pensamento surgir.

Quando se tem um pensamento é difícil se esquecer. Pensamentos não são como ideias, ideias são passageiras, borbulhantes... Vem e vão. Um pensamento pode durar horas, dias, semanas, pode nunca mais ir embora. E quando achamos que ele se foi ele volta a partir de um estímulo.

Tudo pode ser um estímulo. Estímulo é um conceito amplo e quando é negativo se torna muito pessoal. O que te estimula a viver pode também estimular a dor ou o prazer.
Se sentir impulsionado a algo é pior que a dor. A dor é fácil, inexplicável. Se auto inflingida é até amável, justificada, perdoada. Se provocada é entendida, concentrada. Quando se é impulsionado o que se compreende é a influência, algo te fez fazer.
Fingimos que o motivo é o estímulo, talvez seja apenas transferência de culpa, mas faz muito sentido. No instante em que nos deixamos ser guiados pelo estímulo, o instinto deturpado pelos desequilíbrios químicos tomam conta. E então tem-se o resultado:

Outra crise, outra briga, outra afronta.

Estimulados. A vida, para alguns, é uma questão de resposta. Se você responde bem aos estímulos diários e assediadores, talvez, você mantenha. Se você não responde aos estímulos diários, perturbadores, talvez, você aguente. Se você responde mal aos estímulos diários, arrasadores, talvez, você deteriore. Conflitos começam com estímulos. Pílulas estimulam. Massagens estimulantes. Pessoas estimulavam.

Naquela noite ele não quis sair com suas amigas. Não se sentia estimulado a ir. Ele se deitou no sofá da sala pouco iluminada, percebeu que não sentia nada. A apatia era engraçada. Seus olhos quase se fecharam, mas um gatilho trouxe à tona aquele pensamento "De novo não" ele retrucou, enquanto pensava naquele pensamento. De repente se sentiu estimulado, as pílulas tinham acabado e as opções eram poucas, mas ele tinha um motivo - aquele estímulo. Caminhou até o banheiro, acendeu a luz que o cegou por um instante. Abriu a gaveta que, como se soubesse de suas intenções, se relutou a abrir. Ele quase desistiu, mas outro estímulo fortaleceu seu pensamento, ele tinha péssimos vizinhos, a vizinha da vez ligou inesperadamente o rádio. As paredes finas da pensão fizeram com que ele ouvisse cada palavra daquela música. Engraçado, aquela era A música. O som que ele ouviu quando fez o seu primeiro corte horizontal. Aquele era o indício, estimulado, ele forçou e finalmente abriu a gaveta, tirou dela uma navalha antiga que seu pai usava para se barbear em tempos remotos, ela tinha sido um presente, agora, era um estímulo.
Ele voltou a sala, com a navalha em suas mãos. Sentou-se, ereto, levantou a manga de sua blusa azul marinho e, sem nenhum propósito, desenhou estradas tortuosas em seu braço esquerdo, coloridas de vermelho ferro. Estava estimulando algo palpável, algo que te fizesse sentir algo, qualquer coisa.
Estava estimulado.

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