Jimin sempre foi uma pessoa artística. Desde que era uma pequena criança pintando aquarelas em seu papel ofício — que desmanchavam em segundos assim que entravam em contato com os pincéis molhados em uma mistura de tinta guache e água. Fazia colagens usando revistas que vinham junto com o jornal de domingo, criando suas próprias revistas de moda como se fosse um editor mirim da Vogue e com a certeza de um profissional da área. Mas como sempre foi muito expressivo, se encontrou na dança e era ali que seu pequeno espírito em formação se sentia livre. Qualquer preocupação parecia se diluir como tinta em água.
Se preocupar já era necessário desde muito cedo, não entendia um mundo onde não pudesse estar na turma de jazz assim como suas colegas do ensino fundamental. Fazia do quarto o seu próprio estúdio, assistindo clipes no TVZ, criando coreografias enquanto sua visão periférica vigiava a porta para parar assim que fosse preciso. Seu mp3 prateado era a companhia perfeita no caminho até a escola, quando já tinha idade o suficiente para pegar o ônibus por conta própria. E assim que sentava nos bancos mais altos, no assento ao lado da janela, criava os cenários mais cinematográficos dentro de sua cabeça até o momento de "puxar a corda" e descer no ponto próximo à sua escola.
Hoje a maioridade já pesa em seus ombros e costas enquanto coloca a mochila pendurada como se carregasse a barriga de uma grávida na esperança de que não fosse furtado em seu primeiro dia no emprego novo. Foi uma oportunidade que surgiu aleatoriamente, quando já tinha perdido as esperanças. Parecia bom demais pra ser verdade e a sensação eminente de que uma catástrofe aconteceria, o metrô parando em meio aos trilhos, as luzes se apagando e ele sendo demitido antes de dar qualquer motivo plausível para isso, faziam sua respiração pesar. Mais de um ano em uma busca incansável por uma oportunidade, enviando currículos para vagas que queria, que não queria e que nem entendia qual trabalho seria. A playlist do Spotify com Lofi Hip-hop, o melhor refúgio para afastar a nuvem de pensamentos nos quais ele convivia todos os dias, já não funcionava mais.
Dividindo a barra de ferro do trem com mais 60 pessoas — uma hipérbole que poderia muito bem não ser exagero nenhum — e segurando com o máximo de dedos que era possível, Jimin ouve alguém cantando atrás dele e em milésimos de segundo tira seus fones. Quando vira devagar para não parecer desesperado, vê um menino posicionando um pedestal com microfone enquanto tinha uma guitarra transpassada em seu corpo. Poderia ser um baixo também, mas ele não sabia diferenciar e era pouco relevante naquele momento.
"Olá passageiros! Meu nome é Kim Taehyung e esse é meu amigo/parceiro de trabalho Jung Hoseok. Somos do Coletivo À Prova de Balas e hoje estaremos aqui para ser o entretenimento da viagem de vocês. Se qualquer pessoa se sentir incomodada, é só levantar a mão que vamos embora sem problema algum."
Silêncio no vagão e praticamente todos olhando, como se estivessem esperando por algo que valesse a pena prestar atenção. Ótimo sinal quando, todos os dias, você corre o risco de ser detido pela polícia, furtado ou simplesmente ignorado, afetando a auto estima de qualquer artista autônomo.
Logo, os primeiros trechos de Final Feliz de Jorge Vercilo começam a ser cantados
e Jimin sente que uma onda de sentimentos engoliu ele por inteiro, como se tivesse bebido 5 copos da bebida mais duvidosa do bar mais pé sujo que existe. Como se o tempo tivesse desacelerado o suficiente pra não parecer uma manhã de Segunda-Feira dentro da linha Santa Cruz, à caminho da Central do Brasil. Tímido, pega seu celular pra filmar a apresentação com um sorriso que não parava de crescer. Por alguns segundos, talvez minutos, parecia que Kim Taehyung cantava olhando diretamente nos olhos de Park Jimin. E ouvir alguém que está próximo do que poderia ser a representação de um anjo, cantando sobre dar a permissão de abraçar ele sem medo e segurar sua mão, fez a mente de Jimin criar cenários que deram borboletas em seu estômago. Como se estivesse dentro do seu próprio filme de romance adolescente, apesar de já estar na casa dos 20.
VOCÊ ESTÁ LENDO
descarrilhado | pjm + kth
FanfictionSair ou tirar dos carris, dos trilhos; descarrilar: o acidente descarrilhou o trem; com a tempestade, o trem descarrilhou. A tempestade em forma de doçura era Kim Taehyung. Cantor independente que, enquanto se apresentava no vagão de um metrô que ia...