Prólogo

1.9K 179 98
                                    

2005

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

2005

— Thomas, pegue logo as suas coisas! – ouço a voz gutural do meu pai soar da porta tão nervosa a ponto de me assustar. – Você tem cinco minutos para entrar naquele carro, seu moleque!

— Não fale assim com ele – mamãe o interrompe entrando no quarto tão rápido que o seu fôlego se perde. – Thomas é só uma criança e não tem culpa de nada do que você fez!

Sinto meus olhos arderem e estou prestes a chorar. Há coisas que simplesmente não consigo aguentar e, mesmo que meu pai diga continuamente para engolir o choro, perco meu equilíbrio e deixo as lágrimas virem.

Agora era um desses instantes.

— Nós ainda temos algum tempo – mamãe diz para ele após assisti-lo socar a parede em seu nervosismo. – E não podemos simplesmente partir sem saber para onde iremos ou o que planeja desta vez!

— Você já sabe para onde iremos – ele nos encara com chamas vivas em seus olhos. – Para bem longe daqui. E se você não quiser morrer, acho prudente que venha comigo!

Minha mãe suspira e passa suas mãos em seu semblante apavorado. Sinto meu coração doer acima das suas ameaças.

— Meu amor – ela tenta me afagar a face enquanto fala. Sinto seus dedos tocando minha bochecha e desviando o meu olhar daquele homem que tanto me assusta. – Nós vamos para outra cidade, está bem? Vamos morar em outra casa.

— Vocês tem cinco minutos ou eu partirei só! – meu pai dá o seu ultimato. – Pare de tratar Thomas como um bebê, Suzanna. Ele já tem quase dez anos de idade e parece um pirralho chorão graças à você.

Ela engole em seco, mas não desvia o seu olhar do meu.

— Por que vamos embora? – pergunto com um pouco de medo.

Eu não entendia o motivo de estarmos partindo tão de repente. Até ontem eu havia ido para a escola e estava tudo conforme planejavam todos os anos, mesmo odiando cada segundo daquele lugar.

— Porque nós precisamos ir – ela me diz com a voz doce e passa sua mão em meus cabelos. – Mas, nós vamos para um lugar muito melhor do que este, está bem? Seu pai comprou uma casa grande para nós. Não vamos mais morar em um apartamento tão cinza e fechado como este. Vamos morar em um lugar onde há um quintal para você e eu irei colocar um balanço bem no meio de uma árvore para se balançar.

A encaro ainda muito confuso acima daquelas promessas.

— Mas... por quê? – questionei. — Por que nós vamos morrer se ficarmos aqui?

Ela olha ao redor do meu quarto e eu entendo que parece absolutamente perdida.

— Porque não somos felizes aqui, não é mesmo? – disfarça a resposta e eu franzo o cenho. – Nós vivemos trancados, reclusos. Você não tem amigos. Não é saudável para você ficar sozinho.

— Vocês não me deixam fazer amigos.

— Eu sei, eu sei. Mas, a partir de hoje, você poderá ter quantos amigos quiser, está bem? Nós vamos nos mudar para uma casa imensa, com um jardim para você brincar e o colocaremos numa escola onde nenhum garoto vai tentar te machucar. Eu prometo, meu amor, que poderá ser exatamente como você é e ter a amizade que desejar. Só que, para isso acontecer, nós precisamos sair daqui o mais depressa possível. Vamos tentar arrumar as suas coisas?

— Papai está me deixando com medo – sussurro para ela enquanto o vejo andar de um lado para o outro com uns homens carregando nossos móveis.

— Nada de ruim vai acontecer com você. Nós vamos ter uma vida nova. Você não queria ir a uma festa de aniversário? Não queria ir a uma escola de ônibus com os seus coleguinhas? Fazer uma festa do pijama? Então. É o que vai acontecer. Você vai poder ter tudo o que não tem.

Assinto com ela quando noto-a sorrir mesmo com lágrimas nos olhos.

Tento espantar a tristeza e me levanto um pouco mais confiante. Contudo, mesmo que minha mãe haja como se eu fosse uma criança indefesa, entendo que a situação não é nada agradável, por mais que ela tente maquiar fazendo-me promessas. Meu pai parece um demônio soltando fogo pelos olhos enquanto grita.

Ela tenta me acalmar enquanto me ajuda. Promete-me muito mais do que antes, enchendo-me de grandes expectativas.

— Nós vamos deixar tudo isso para trás para sempre e nada mais vai nos abalar, eu juro a você. Nada.

Contudo...

Quase oito anos depois a mesma cena se repete como se um buraco no espaço-tempo se abrisse diante mim e me sugasse para o mesmo dia.

Meu pai está diante mim gritando e dizendo que tenho apenas cinco minutos para partir, exigindo-me pressa, agindo como um demônio saído diretamente do inferno para me atormentar, empurrando-me e esmagando meus braços para agir de acordo com a necessidade dele.

É tudo exatamente tão igual que meu corpo simplesmente se encolhe diante ele. E eu me sinto indefeso.

Só que, diferentemente de tudo o que aconteceu há anos atrás, agora eu não sou mais criança e tinha uma história.

E um amor.

Isabelle.

Se eu sumir de uma hora para outra, será que algum dia ela irá me perdoar? Se eu partir e desaparecer por um tempo, quanto dele ela me esperaria?

Não podia simplesmente fingir desta vez que tudo ficaria bem, mesmo que me prometessem novamente uma nova vida.

Eu sabia que não iria ficar.

E sabia que meu coração ficaria para trás junto a ela...

𝑪𝒂𝒓𝒕𝒂𝒔 𝑷𝒂𝒓𝒂 𝑻𝒉𝒐𝒎𝒂𝒔Onde histórias criam vida. Descubra agora