cap 2

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GABRIELA
Reprovei.

Não acredito que reprovei

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Não acredito que reprovei.
Por quinze anos, Timothy Lane distribuiu notas dez como se
fossem balas. Mas justo no ano em que eu faço a matéria, Lane bate
as botas e tenho que me contentar com Pamela Tolbert.
É oficial. A mulher é minha arqui-inimiga. Só de ver sua
letrinha rebuscada — que preenche cada milímetro das margens da
minha prova — quero dar uma de Incrível Hulk e destroçar o
papel na minha mão.
Tirei dez em quase todas as outras matérias, mas, a partir
deste exato instante, estou com zero em ética filosófica. O que,
combinado com o seis em história da Espanha, faz minha média
cair para cinco.
E preciso de média seis para jogar hóquei.
Em geral, não é difícil manter minhas notas lá em cima.
Apesar do que muita gente imagina, não sou uma atleta burra. Mas
não me importo de deixar que as pessoas pensem isso.
Principalmente as mulheres. Acho que elas gostam da ideia de ficar
com um mulher das cavernas musculosa que só sabe fazer uma
coisa, e como não quero nada sério por enquanto, rolos com
garotas que só querem sexo são muito bem-vindos. Sobra mais
tempo para me concentrar no hóquei.
Mas se eu não melhorar a nota não vai mais ter hóquei. A pior
coisa da Briar? O reitor exige excelência — tanto acadêmica quanto
atlética. Diferente das outras faculdades, que são mais
condescendentes com os atletas, a Briar tem uma política de
tolerância zero.
Maldita Tolbert. Quando perguntei antes da aula se poderia
fazer algum trabalho extra para melhorar a nota, ela me mandou,
com aquela voz anasalada, participar das reuniões com a
professora assistente e frequentar o grupo de estudos. Já faço as
duas coisas. Então é isso aí, ou contrato algum garoto prodígio
para usar uma máscara da minha cara e fazer a prova para mim
ou estou perdida.
Expresso minha frustração com um suspiro audível e, de
canto de olho, vejo alguém levar um susto.
Também me assusto, porque achei que estivesse aqui com
minha tristeza sozinha. Mas a menina que senta na última fileira
continua no auditório e está descendo até a mesa de Tolbert.
Mandy?
Marty?
Não lembro o nome dela. Vai ver é porque nunca me dei ao
trabalho de perguntar. Mas ela é interessante. Bem mais do que eu
pensava. Rosto bonito, cabelo loiro,

gostosa — cacete, como nunca prestei atenção nesse corpo antes? Mas agora reparo

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gostosa — cacete, como
nunca prestei atenção nesse corpo antes?
Mas agora reparo. Calça justa acompanhando as curvas, a
bunda arrebitada e implorando “me aperta”, o suéter de gola V
abraçando uma comissão de frente de respeito. Porém, não tenho
tempo de admirar nenhuma dessas qualidades, porque ela percebe
meu olhar encarando-a, e seus lábios se franzem.
“Tudo bem?”, pergunta, com uma expressão mordaz.
Murmuro algo incompreensível. Não estou a fim de
conversar com ninguém agora.
Ela ergue uma das sobrancelhas escuras para mim. “Desculpa,
em que língua foi isso?”
Amasso a prova e empurro a cadeira de volta para o lugar.
“Falei que tudo bem.”
“Então tá.” Dá de ombros e continua a descer os degraus.
Enquanto ela pega a prancheta com a escala da professora
assistente, visto o casaco do time de hóquei, enfio a prova ridícula
na mochila e fecho o zíper.
A menina de cabelos loiros volta até o corredor entre as
cadeiras. Mona? Molly? Acho que o M está certo, mas não tenho a
menor ideia do restante. Traz sua prova na mão, mas nem perco
tempo tentando ver a nota, porque imagino que tenha ido mal
como todo mundo.
Deixo-a passar e saio da minha fileira para o corredor.
Poderia dizer que foi o meu lado cavalheiresco, mas seria mentira.
Quero dar mais uma conferida nessa bunda, porque é mesmo uma
bunda bem gostosa, e, agora que já vi, posso muito bem olhar de novo. Sigo-a até a porta do auditório e, de repente, me dou conta de
como é baixinha — estou um degrau abaixo dela e consigo ver o
topo de sua cabeça.
Assim que chegamos à porta, ela tropeça em absolutamente
coisa nenhuma e seus livros se espalham no chão.
“Droga. Sou tão desastrada.”
Ajoelha-se, e eu também, porque, ao contrário do que acabei
de dizer, posso sim ser uma cavalheira quando quero, e a coisa
educada a fazer é ajudá-la a pegar os livros.
“Ah, não precisa. Pode deixar”, insiste.
Mas minha mão já pegou sua prova, e meu queixo despenca
assim que vejo a nota.
“Cacete. Você gabaritou?”, me espanto.
Ela me lança um sorriso autodepreciativo. “Pois é, nem
acredito. Tinha certeza de que tinha mandado mal.”
“Caramba.” Começo a me sentir como se tivesse acabado de
topar com o próprio Stephen Hawking, e ele exibisse os segredos
do universo bem debaixo do meu nariz. “Posso ver suas
respostas?”
Ela ergue as sobrancelhas de novo. “Meio atiradinha da sua
parte, não? A gente nem se conhece.”
Reviro os olhos. “Não estou pedindo para você tirar a roupa,
gata. Só quero dar uma olhada na sua prova.”
“Gata? Tchau, atiradinha; oi, presunçosa.”
“Você prefere senhorita? Ou madame? Usaria seu nome, mas não
sei.”
“Claro que não.” Ela suspira. “É ”, Hannah e, após uma pausa
forçada: “Gabriela.”
Tá, eu tinha errado feio com o negócio do M.
E também não me passou despercebido o jeito como ela
pronunciou o meu nome, como se dissesse: Está vendo, eu sei o seu,
babaca!
Ela pega o restante dos livros e se levanta, mas não lhe
entrego a prova. Em vez disso, fico em pé e começo a passar as
páginas. Ao correr os olhos por suas respostas, meu humor
despenca ainda mais, porque se esse é o tipo de análise que Tolbert
espera, estou ferrada. Caramba, estou estudando história por um
motivo — lido com fatos. Preto no branco. Tal coisa aconteceu a
tal pessoa e aqui está o resultado.
As respostas de Hannah giram em torno de baboseira teórica
e de como os filósofos responderiam a diversos dilemas morais.
“Obrigado.” Devolvo a prova e, enfiando os polegares nos
passadores da calça jeans, arrisco: “Ei, escuta. Você… acha que
poderia…”. Dou de ombros. “Você sabe…”
Ela treme os lábios como se estivesse fazendo força para não
rir. “Na verdade, não sei, não.”
Solto um suspiro. “Topa me dar umas aulas?”
Seus olhos verdes — os olhos verdes mais escuros que já vi,
delineados por grossos cílios pretos — vão de surpresos a céticos
em segundos.
“Eu pago”, acrescento, às pressas.
“Ah. Hmm. Bom, é claro que eu cobraria. Mas…” Ela balança a
cabeça. “Desculpa. Não posso.”
Disfarço a decepção. “Vamos lá, quebra essa pra mim. Se eu
me sair mal na segunda chamada, minha média vai pro saco. Por
favor?” Abro um sorriso, o que faz minhas covinhas aparecerem, e
isso nunca falha em derreter corações.
“Isso costuma funcionar?”, ela pergunta, curiosa.
“O quê?”

“Esse sorriso de menina pidona… te ajuda a conseguir as coisas?” “Sempre”, respondo, sem hesitar

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“Esse sorriso de menina pidona… te ajuda a conseguir as
coisas?”
“Sempre”, respondo, sem hesitar.
“Quase sempre”, me corrige. “Olha, sinto muito, mas
realmente não tenho tempo. Já estou conciliando trabalho e estudo,
e com o festival de inverno chegando, vou ter ainda menos tempo.”
“Festival de inverno?”, pergunto, sem entender.
“Ah, esqueci. Se não for sobre hóquei, então você não sabe o
que é.”
“Quem está sendo presunçosa agora? Você nem me conhece.”
Após uma pausa, ela solta um suspiro. “Estou cursando
música, entendeu? E o departamento de artes organiza duas
apresentações por ano, o festival de inverno e o de primavera. O de
inverno garante uma bolsa de cinco mil dólares. É um evento
grande, na verdade. Gente importante do mercado viaja o país
inteiro para acompanhar. Agentes, produtores, caça-talentos… Então,
por mais que adore a ideia de ajudar você…”
“Adora coisa nenhuma”, resmungo. “Você está com uma cara
de que nem queria estar falando comigo.”
O movimento de desdém que ela faz com os ombros é de
tirar do sério. “Está na hora do meu ensaio. É uma pena que você
vá reprovar nessa matéria, mas, para você se sentir melhor, todo

 É uma pena que você vá reprovar nessa matéria, mas, para você se sentir melhor, todo

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mundo vai.”
Estreito os olhos. “Menos você.”
“Está fora do meu controle. Tolbert parece gostar do meu tipo
de baboseira. É um dom.”
“Bom, quero esse dom. Por favor, mestre, me ensina a arte da
baboseira.”
Estou a dois passos de me jogar de joelhos no chão e
implorar, mas Hannah segue até a porta. “Tem um grupo de
estudos, sabia? Posso passar o telefone…”
“Já estou no grupo de estudos”, murmuro.
“Ah. Nesse caso não posso fazer muito mais por você. Boa
sorte com a segunda chamada. Gata.”
Ela dispara em direção à porta e me deixa para trás,
encarando o vazio, frustrada. Inacreditável. Todas as meninas da
faculdade dariam um braço para me ajudar. Mas essa? Foge como
se eu estivesse sugerindo que a gente matasse um gato e fizesse um
sacrifício ao demônio.
Agora estou de volta ao ponto em que estava antes de
“Hannah que não começa com M” me dar um lampejo mínimo de
esperança.
Totalmente ferrada.

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⏰ Última atualização: May 23, 2021 ⏰

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