Jardim de Dandelions

Gelado

Se passou um semestre após o anúncio de Diluc, o ano estava na metade e tudo corria bem, o  grupo permanecia unido apesar do estresse trimestral além dos treinos de kendo depois da aula, o que mesmo que fosse a parte mais divertida do dia, ainda assim era cansativo, pelo menos para o trio já que Lisa estudava para a prova teórica e não prática, mas isso não a deixava mais excluída. Enquanto Diluc, Kaeya e Jean lutavam com suas espadas, a morena sentava em arquibancadas próximas e lia imensos livros que para qualquer um que olhasse, pareceriam absurdamente exaustivos, mas para ela, ler um livro de mil páginas por dia era algo extremamente divertido e prazeroso, além de que seu foco não se dissolvia nem por um milissegundo. 

- Você anda frouxo. - Diluc lançou para Kaeya que caía de costas no chão naquele momento após ter sido acertado pela espada do ruivo, atordoado com o golpe. Precisava achar mais formas para desviar de seus ataques incisivos, não tinha muito tempo para raciocinar e precisava melhorar consideravelmente o tempo de reação. Uma mão lançou-se em frente aos seus olhos, uma mão incrivelmente delicada para tamanha força que carregava seguida de um sorriso gentil.

- Seu tempo de reação precisa melhorar, assista um pouco eu e Diluc lutando - Jean sorria de forma lânguida e ela sabia. Foi nisso em que Kaeya pensou, "ela sabia", sabia que para ele era muito mais simples estudar observando os passos do inimigo e Diluc era o oponente mais forte que conhecia, não deixando ela para trás, na verdade a dupla era a mais forte que já vira. Segurou a mão estendida gentilmente e foi levantado com aquela força suave carregada pela garota. Jean era conhecida como a dama dandelion, seu aniversário era no período em que a montanha ficava tomada de dentes de leão e parecia, na verdade,  estar coberta por neve, além de ter uma suavidade em sua forma de lutar que remetia à brisa que levava as pelugens da flor para longe, não precisava ser um vento destrutivo e nem fraco demais. Era como o vento de verão na virada de tempo, agradável, gentil, caloroso. Kaeya sempre se sentia abraçado por aquele sorriso amigável e por isso, do fundo do coração, almejava abraçar Jean todas as vezes possíveis. Não o fazia em consideração ao seu melhor amigo, mesmo que não admitisse era um fato consumado seu amor pela loira. Ignorando os pensamentos, foi em direção à Lisa e sentou-se ao seu lado para observar aquela luta. Pareciam que dançavam, mesmo sem música tocando. O ritmo de batalha era impecável.

- Ela é realmente encantadora - A fala foi seguida de um risinho abafado, Kaeya olhou para a face da garota que tinha deixado os livros de lado por alguns segundos e observava a batalha também. Lisa seguia cada passo da melhor amiga de forma curiosa. - Você também se sente diferente, não? É o efeito Jean.

- Efeito Jean?

- Não necessariamente você se apaixona por ela, mas ela tem alguma coisa que prende, você se sente diferente. Ela é gentil e calma como uma brisa de verão, mas no emocional ela é como um furacão. Mexe tudo, revira tudo sem avisar, deixa uma confusão e você sabe que ela deixou algo ali. Só não sabe o que. - encerrou olhando para o amigo e lançando um sorriso como se dissesse "é, eu te entendo". 

- É.... acho que sim... - Voltou a se ater à luta e sentiu que compreendeu melhor os passos do ruivo e também sentiu que compreendeu melhor o que sentia. Não era como Lisa descreveu, Jean não era um furacão. Furacões são passageiros e os danos podem ser consertados. A loira não era passageira e muito menos, o que ela lhe causava não era reparável. Felizmente era capaz de ignorar cada terremoto emocional causado com sua aparência usualmente debochada e seu divertimento de costume. Na verdade sim, em determinado momento qualquer um se apaixonaria pela Jean, a grande questão era como isso seria nutrido e quais frutos geraria. Levantou-se aplaudindo o final da luta de Jean e Diluc, Jean mais uma vez vitoriosa, reverenciou os aplausos e apontou a espada para o garoto de cabelos azuis. Ele não esperava pelo convite de batalha e se surpreendeu que tivesse sido desafiado justamente pelo seu alvo de afeição. Sorriu, dessa vez não com deboche, mas sim com satisfação, respondendo com um rápido avanço com a espada na direção. A luta começou e Kaeya se desconcentrava sempre que os rostos se aproximavam, mas ignorava e lançava um pequeno sorriso debochado que inegavelmente desconcentrava Jean. 

- Vamos, você tem mais força que isso. - Desafiou o garoto estendendo a espada 

- Tudo bem, você que manda. - Kaeya deslizou como se andasse no gelo, acertando a espada de Jean calculadamente, a jogando para o alto,  sua luta era como se estivesse patinando no piso congelado. A espada da loira voou longe e ela estendeu os braços em sinal de rendição, sorrindo com satisfação. Lisa tirou brevemente os olhos do livro mais uma vez e igualmente sorriu, impressionada. Diluc cruzou os braços e empunhou a espada, dessa vez sendo o desafiante. 

- Muito bem. Continue me surpreendendo. - Jean buscou a espada e se aproximou do garoto, colocando uma das mãos em seu ombro esquerdo seguindo logo depois para um breve cafuné em sua nuca. Seguiu para arquibancada, sentando ao lado de Lisa que se encontrava absorta nos livros novamente, algumas vezes olhando para a amiga sentada ao seu lado de relance. Jean era inegavelmente linda. 

- Vamos. - Diluc lançou com certa frieza (e não entendia por que soara tão desagradável) enquanto Kaeya ainda estava desconcentrado pelo afago recebido e tentava recuperar a postura. Sentiu coisas que de fato não gostaria de ter sentido e com dois tapinhas na face, se recompôs para lutar contra seu usual parceiro de todas horas. 

- Você pediu. - Sorriu para o ruivo, deslizando no chão como se fosse gelo novamente com uma velocidade altíssima e cruzando espadas, sentindo a força bruta do adversário e recuando por alguns minutos, após receber um novo ataque, do qual desviou com maestria. Conseguiu contornar o amigo e lhe acertar nas costas, conseguindo mais uma vitória no dia. Apertou a mão estendida do ruivo e ambos sorriram.

- Melhorou. Parabéns. 

- Eu me dou melhor como observador - coçou a nuca - Vamos então? O sol está se pondo. 

Diluc correspondeu com um tapa na cabeça do amigo, Jean e Lisa levantaram da arquibancada e o quarteto foi em direção a um café próximo para comer alguma coisa. Para ser mais exata, um lamen apimentado, o preferido do grupo. Comeram a refeição em meio às risadas, mas mesmo assim, um membro em particular não estava exatamente feliz. Em meio a comemoração, Jean desviou o olhar para a rua e observou a noite chegar, nutrida de estrelas e com uma linda lua cheia. Só conseguia refletir o quanto sentiria falta daqueles momentos quando Diluc fosse embora. Se esforçava para ficar feliz pelos amigos. mas não conseguia manter aquilo o tempo inteiro. Sabia como sentiria falta do rapaz ruivo e como ele era importante para ela, de uma forma diferente das outras pessoas. Sabia como se sentia e que precisava fazer algo sobre isso antes que fosse tarde. Não era como se as emoções da garota passassem despercebidas. Kaeya a encarou por alguns segundos vendo claro como a luz do dia sua tristeza e ficou sério por alguns segundos, o que não era do seu feitio. Deu um pequeno toque na mão da loira que sentava logo em sua frente e entregou um origami feito com o guardanapo do café, a fazendo sorrir novamente. Não completamente feliz, mas era um sorriso e isso por hora, o satisfazia pois sabia que era o que era possível naquele momento. Diluc viu de canto de olho, optou por ignorar, bem como Lisa e seguiram conversando e rindo entre sí. Algumas horas depois, foram para casa. Cada um morava em uma direção então se separaram logo em seguida no meio do caminho. 

Jean observava as estrelas enquanto caminhava sozinha, envolvida pelo vento gelado. Afinal, mesmo que se afastassem, o céu sob suas cabeças ainda era o mesmo. Ainda seria possível se reencontrarem. Não era um absurdo. Logo depois, olhou o pequeno origami que segurava na palma da mão e sorriu. Aquele pequeno presente realmente havia aquecido seu coração. Apenas agradecia mentalmente por ter tido a oportunidade de ter vivido aquele momento e implorava por mais daquilo. As relações afinal, não deveriam ser temporárias como chuvas de verão.