Utopia, Nova América
14 de Setembro de 2084
Victor acordou abruptamente, pondo-se sentado em sua cama apoiando suas mãos sobre a mesma. Sua respiração ofegante e o rosto suado eram consequência de um pesadelo, ou melhor, uma lembrança de uma experiência passada. Olhou para seu relógio de pulso, ainda eram apenas 2:37 da madrugada, ele tinha que estar descansado para a reunião com o Marechal mas já havia perdido todo seu sono. Removeu o lençol sobre seu corpo, não havia razão para continuar deitado se não conseguiria dormir. Atravessou os escuros corredores e cômodos de seu apartamento até chegar na academia, talvez um pouco de exercício pudesse ajudá-lo a relaxar.Conforme as gotículas do suor eram expelidas por seus poros e os músculos de determinada parte de seu corpo tencionavam-se como as cordas de um violino, menos estressado Victor se sentia, mas ainda estava longe de estar bem. Ficou sentado por alguns minutos, ofegante devido ao enorme esforço posto nos exercícios, a toalha de rosto em suas mãos encharcada pelo seu suor parece que escorrer por entre seus dedos e cair no chão a qualquer momento. Seguiu até a lavanderia e deixou a toalha dentro da máquina de lavar, não precisava mais dela já que não iria mais se exercitar, pelo menos não na academia. Verificou as armas espalhadas pela casa, escondidas no interior de paredes e móveis, além dos equipamentos que ele guarda em seu arsenal. Verificou por mais três vezes a posição das armas e munições e se estavam bem escondidas, realizou vários testes de recarga e simulações de possíveis ataques para ter certeza de seu tempo de reação e desempenho, repetindo o mesmo processo inúmeras vezes até que não conseguisse mais mover seus braços devido a dor.
Depois de finalmente cansar-se de fazer a mesma coisa, sentou-se no grande sofá de sua sala, suspirou pesadamente numa falha tentativa de pôr o estresse para fora. Olhou novamente para seu relógio de pulso, eram a recém 5:32 da madrugada e, por mais que estivesse exausto, Victor sabia que não conseguiria dormir. Pelo visto essa seria mais uma das várias vezes onde mal conseguiu dormir duas horas, desde os seus dez anos estava acostumado com isso, raro de verdade eram as noites onde conseguia dormir mais do que isso, e mais raro ainda eram as noites onde conseguia dormir bem, se é que houve alguma.
Toda vez que seus olhos se fecham, toda vez que repousa sua cabeça sobre o travesseiro e tenta dormir, sua mente é atormentada pelas vozes das pessoas gritando desesperadas, os sons das explosões e das sirenes de alarme, a imagem de seus pais mortos surge diante de seus olhos cerrados, o cheiro do sangue e de carne queimando, tiros, fogo, gritos, mais explosões, mais tiros, mais gente morrendo, mais sangue, mais gritos. E no meio disso tudo, um menino de dez anos, encolhido num canto e chorando incessantemente cobrindo seus ouvidos com as mãos.
Essas memórias o atormentam sempre que tem a chance, fazendo-o voltar a ser apenas uma criancinha assustada e impotente diante de um verdadeiro Apocalipse. Seus sonhos tornaram-se inexistentes no dia que os Códices destruíram seu lar e mataram sua família, ele mesmo sobreviveu por puro milagre. Desde então suas noites tem sido pesadelos ma vida real, não tem idéia do porquê as noites são piores, talvez por ele estar dormindo quando tudo aconteceu ou apenas por estar mais vulnerável quando dorme.
Deitou-se no sofá e pôs seu antebraço sobre seus olhos fechados, já sabia desde que acordou que não conseguiria dormir, mas se não podia descansar sua mente ao menos tentaria descansar seu corpo. Apesar de que, diferente de uma operação de campo, a reunião exigia muito esforço e disposição mental, coisa que aparentemente ele não terá hoje, assim como não teve ontem, e certamente não terá amanhã, nem depois. A pior parte não é nem prestar atenção na reunião ou lembrar-se do que foi dito, por precaução Victor sempre gravava tudo que era dito durante os encontros dos oficiais, o mais difícil sempre é fazer parecer que está tudo bem para não alertar os outros. Queria evitar que os outros soubessem sobre seus problemas, parte por não querer preocupar aqueles próximos a eles, parte por não querer que fiquem se metendo em sua vida dizendo o que ele deva fazer para "se recuperar de seus traumas". Porém, talvez dessa vez isso não será possível, e ao chegar a essa conclusão, Victor bufou mal-humorado.
******
Victor não sabia dizer o que lhe dava mais trabalho, prestar atenção nas palavras do Marechal ou nas estáticas e dado projetados sobre a mesa da reunião, a luz delas incomodava muito seus olhos cansados e acostumados com a escuridao de seu apartamento. Felizmente a maquiagem em seu rosto esconde suas olheiras e cansaço, porém, o Marechal parecia mira-lo de canto vez ou outra. Certeza que notou que há algo de errado.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Utopia - Paraíso Distópico
Science FictionNum futuro pós-apocalíptico a maior parte do planeta foi devastada por vários incidentes nucleares. Mais da metade da humanidade morreu nesse desastre, os poucos que restaram vivem ou em enormes cidades cercadas por muralhas ou nas grandiosas Metró...