Sentado em seu sofá, um velho observava as gotas de chuva se chocarem contra a janela, trazendo o som perfeito para um momento de tanta melancolia. Com o coração apertado, Frederik segurou o antigo pião contra o peito. Era a única forma de aproximar dela...
Sempre que fechava os olhos, a nítida imagem de Miranda exibindo o novo pião para as outras crianças da rua vinha à sua mente, fazendo-o sorrir. Em seguida, porém, as lembranças de todos os vizinhos procurando a menina, que desaparecera em uma manhã de outono, o destruíam por completo. Sentia-se culpado por não estar com ela quando tudo aconteceu. Graças à sua negligência, passou 44 outonos sem a sua amada filha. Graças à sua negligência, viu a sua família ruir como um castelo de areia.
Agora, juntando-se aos sussurros dos ventos, o som do toque agudo e irritante do telefone ecoou por toda a casa, mas Frederik não se abalou: só queria pensar em Miranda, e nada o atrapalharia.
De um segundo para o outro, tudo mudou.
O céu repleto de nuvens escuras, carregadas, foi substituído por um belo tom azul; as árvores, antes verdes e molhadas, tornaram-se alaranjadas e secas; sua perna esquerda, quebrada e dolorida, voltou a funcionar normalmente, como se nada tivesse acontecido.
Uma coisa, porém, simplesmente não mudava: o telefone não parou de tocar. Nem por um segundo.
Assustado com a situação, o velho, ainda segurando o pião, caminhou até o objeto e o atendeu:
— Alô? — perguntou, receoso.
Do outro lado da linha, os ruídos quase o ensurdeceram, mas não o atrapalharam em reconhecer instantaneamente a voz doce e feminina que falava com ele. Uma voz que o fez desabar em lágrimas saudosas.
— Papai? Não chore... Estou indo te buscar. Vamos para casa.
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44 Outonos
Short StoryFrederik acabou de completar 72 anos, mas sente que sua vida parou ao 28, quando sua filha desapareceu sem deixar rastros. Agora, tudo que lhe resta são lembranças e um velho pião. Em seus últimos suspiros, o velho embarca em uma jornada ao pa...