Medo de sapos

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Existe uma razão, pela qual tenho medo de sapos até hoje. Um acontecimento, que ocorreu na minha infância e parece arrastar um sentimento repugnante com apenas a figura daquele pequeno ser asqueroso, uivando e observando com os seus dois enormes olhos.


Antes de falar, sobre o porque de tudo, preciso listar os acontecimentos antes até que chegue ao ponto principal. Então, vamos lá.


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Sempre fui filho único, morei com os meus pais e não conhecia nada, além das suas maneiras de agir, com uma forte e respeitosa educação, vivíamos somente da venda de peixes. No caos da crise dos anos sessenta, estávamos conseguindo sobreviver e batalhar contra a fome, distante da zona urbana e sendo felizes por assim dizer. O ponto mais forte do meu pai, era que ele fazia questão de me alertar quase todas as semanas que existia apenas uma regra. O velhote não precisava dizer duas vezes, para seguir com seus olhos fervendo em fogo: "Durante à noite, nas ocasiões em que ouvirmos os barulhos de sapos coaxando ao luar, não podemos sair de casa, nem olhar pela janela e muito menos abrir a porta, é claro?".


Poucas vezes mamãe cochichou sobre isso. Em algumas ocasiões, explicou que era algo herdado do pai de meu pai, do vovô e aí por diante. Uma tradição e um costume que deveria ser respeitado, até mesmo do que o valor que um filho, tem pelos seus próprios pais.


O meu pai fazia questão, nesses momentos particulares, de passar a madrugada toda acordado, sentado na poltrona da sala, segurando a espingarda e nos observando descansar na cama. A mamãe nunca falou nada sobre isso da maneira mais clara possível, além de coisas batidas em ocasiões raras. Ela nunca sentiu insatisfação da minha parte ou curiosidade. O papai repetia ocasionalmente que precisamos apenas obedecer, nós tínhamos a vida perfeita e suspirava com orgulho, puxando o ar dos seus pulmões que não iremos passar fome ou ter dificuldades. A mamãe repetia as suas palavras, apoiava o seu companheiro e se orgulhava das suas explicações, para o segundo homem da casa, ao longe.


Com o passar do tempo, longe de qualquer tipo de distração, diversão ou curiosidade para alguém da minha idade; foi quando dei atenção no que acontece, os sapos estão cantarolando ao luar, ficou tentador. Por que, o papai não deixa a gente observar, e sempre fica como um guarda sanguinário, pronto para impedir nossas tentativas de caminhar na casa tarde da noite? O seu grito ou berro seco, para voltarmos para os nossos quartos era tudo que precisamos para fugir como um cachorro com o rabo entre as pernas. É claro que fiquei curioso, como não ficaria!? No meu próprio quarto não há janelas, no aposento dos meus genitores nenhuma. A única exceção, era na cozinha por causa da fumaça do fogo à lenha e outra na sala com sua porta trancada com mais de um ferrolho.


Não é só isso, acho que nunca me incomodou quando era mais novo, mas quando estamos trabalhando e ajudando meu pai a capturar os peixes no criatório, para colocar nos baldes e serem transportados para a cidade, é a presença dos sapos... Os malditos anfíbios, se apresentando com a sua pele rugosa, semelhantes a verrugas. Eles sempre estavam por perto e o pai disse, para não mexer com eles porque poderiam dormir na minha cama, superstição do povo do sítio - pessoas regionais.


Eu só precisava ignorar, porque eles estavam nos ajudando, explicava ele, espantando os insetos e tudo mais. Sempre pareceu como se fizessem parte dos nossos trabalhos, como alguém que ignoramos e sempre está lá, nos observando e conversando um com outro na língua dos pequenos.

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