Você vai ficar bem — disse Margarida — sei que ele era o amor da sua vida, mas é bola pra frente, né?
— É. Acho que sim — disse Bete num tom desanimador.
Trouxe uma coisa pra você se distrair — disse Margarida dando seus gritinhos de empolgação, saiu aos saltos e foi até um saco que estava na mesa da cozinha, remexeu e tirou um vaso de planta de dentro — pra você, acho que cuidar dela vai ajudar a passar o tempo.
— Você sabe que não tenho jeito pra essas coisas, Margarida, nem tenho saco pra cuidar de uma planta agora.
— Mas é por isso que tô te dando, vai ficar aqui dentro dessa casa sozinha fazendo o quê? Pelo menos vai ocupar teu tempo.
Ainda relutante Bete aceitou a planta e prometeu cuidar dela do jeito certo.
Até parece que uma planta ia ocupar o vazio que Jorge deixou, já estava para fazer uma semana que Jorge tinha morrido de um infarto e a falta que ela sentia dele ainda era forte, na verdade, acho que nunca vai diminuir, esse tipo de saudade no início é como um vulcão em erupção fica transbordando lava para todo lado, mas um dia ele vai ficar extinto e ainda vai continuar ali, virar uma montanha ou ilha, mas vai estar lá. É eterno. Ela colocou o vaso na mesa de centro que ficava na sala.
— Eu já vou. Tenho conta pra pagar e tudo mais — disse Margarida.
— Vai com Deus.
— Ah! — Margarida colocou a cabeça para dentro da casa de novo — não esqueça de molhar a plantinha, ela precisa de água, mas não muita! Se não ela morre também — fechou a porta e saiu.
Bete sentou no sofá na frente da mesa de centro onde estava a planta, o gato veio e começou a se esfregar nas pernas dela ronronando.
— Pra quê eu quero isso?
Levantou e pegou o vaso, estava decidida a jogar aquela coisa fora, quando chegou perto do lixo algo lhe veio à mente e decidiu ficar com planta.
Uma semana depois, Margarida foi visita-la.
— Há! Então você ficou mesmo com ela.
— Eu disse que ia ficar, não foi?
Bete estava molhando a planta, ela tinha criado todo um cronograma, molhava todas as terças, nada de muita água, suculentas não gostam de tanta água assim, deixava sempre ao sol toda vez que tirava de perto da janela a planta mudava de cor e ela não gostava disso, colocava adubo uma vez no mês e também já tinha trocado o vaso por um maior.
— Ela tá ficando linda! — disse Margarida enquanto se abaixava e parecia que ia tocar na planta.
Bete se levantou rápido do sofá e deu uma tapa na mão dela. Margarida ficou um pouco espantada com a reação de Bete.
— Tá bom, tá bom. Eu não vou tocar — disse Margarida — o que deu em você?
— Desculpa, desculpa mesmo.
Margarida disse que não foi nada, sentou-se no sofá e o gato pulou em cima dela para receber carinho. Do sofá dava para ver a cozinha.
— Por que tem aquele tanto de prato na pia? — perguntou Margarida.
— É que não tive tempo de lavar ainda.
— E o que te fez ficar ocupada desse jeito?
— A planta. Claro.
Margarida olhou pra ela esperando uma risada ou coisa do tipo, mas Bete estava normal, não esboçava nada no rosto cheio de rugas e pés de galinha decorrentes da idade.
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Definhar.
HorrorDepois de seu marido morrer Bete fica abalada e Margarida, sua melhor amiga, decide dar-lhe um presente, uma planta. © 2021, JOOGABRIEL890