Minhas lágrimas caíam, despencavam como um rio maldito de meu rosto na falha tentativa de ser puro mais uma vez, de abandonar meus pecados carnais e me submeter a um Deus que se diz todo poderoso e pior ainda, que se diz bondoso. Meu quarto, agora iluminado apenas pela suave luz da lua cheia, era um misto de trevas e confusão em meus olhos graças a LSD que havia ingerido numa falha tentativa de esquecer de nós, de esquecer de você, mas principalmente esquecer de todas as minhas falhas como humano. Eu não posso errar, eu preciso sempre ser o melhor, é o que todos, conscientemente ou não, esperam de mim. Esperam que eu sempre esteja disposto a sorrir, que fale baixo, que use roupas caras mesmo sendo pobre, que alise meu cabelo, que deteste meu nariz largo e minha mandíbula nada definida. Querem que eu seja branco, para que em sua supremacia eu possa ser errado e que com toda sua fidelidade protegido até da morte. Mas não sou branco e muito menos um forte guerreiro, sou um humano, um pedaço vivo de sentimentos e dores, de cansaço e de medos e com traumas tão profundos que eu nego a mim mesmo os menores resquícios de afeto, me sentindo indigno, e me isolo em um puro vazio, onde eu imploro por uma penitência que me permita nunca mais acordar de novo. O tanto de vezes que passei noites em claro, sem ar e sentindo meu corpo se tremer inteiro sem forças para se manter. O tanto de vezes que chorei para mim, sem ninguém para me proteger, seja por não se importarem ou por meu puro orgulho masoquista. O tanto de vezes que procurei e implorei por amor, mas tive que aceitar que não passava de um pedaço de carne preta para os desejos profanos dos homens. Não sou errado porque quero, mas porquê escolheram que eu fosse, porquê escolheram não me ver como um humano.
Meus olhos pesavam, a LSD não fora a única coisa que eu havia usado. Maconha, álcool e anti depressivos vendidos sem receita numa farmácia no Paranoá. Eu não sabia se eu sairia vivo, eu muito menos queria. Acreditei que consumir tudo isso me mataria rápido, mas estava sendo sufocante e desesperador, que mesmo entre as alucinações eu só via você. Cabelos pretos perfeitamente arrumados, olhos claros, barba delineada e uma pele tão clara que o minimo de Sol o deixava completamente corado. Lindo para qualquer um que te olhasse e ainda mais para mim, onde me seduzia com os contrastes entre nós, pedindo meu grande pau preto dentro ti onde era macio e rosado, sentando por horas e nunca me deixando esquecer das diferenças entre nós. Você me amava enquanto me tinha todo em sua boca, me arrancando gemidos e bebendo toda gota do mel que tirastes de mim. Ali, suados e gozados, ouvi promessas que ficaram gravadas a fogo em minha alma, promessas tão mentirosas que eu me ceguei acreditando que serias meu como eu era teu. Acreditei que sairíamos de mãos dadas por ai, que chuparia sua língua escondido no banheiro na casa de sua mãe e que anunciaria ao mundo nosso amor, mas, como a cobra que seduziu Adão, em meus ouvidos você cantava que o que tínhamos era bom de mais para que os outros soubessem, que o que ninguém sabia não poderia ser estragado. Só esqueceu de avisar, já que era tão bondoso, que eu que ficaria estragado, despedaçado e incapaz de seguir em frente.
Cada lugar onde te amei, onde fui usado mais de uma vez, tinha uma bela foto editada escondida entre as pastas da galeria de meu celular. No banheiro do ''Buteco da Boa'', entre as árvores do ''Parque da Cidade'', dentro daquele seu fiat uno exageradamente laranja, nas piscinas do ''Clube dos Previdenciários'' e tantos outros lugares que eu poderia ficar horas comentando. É tão cômico reparar que de tão exibicionista que você é, nunca quis, nunca cogitou me exibir como um de seus belo troféus que tanto ouvir falar e que eram despejados por suas palavras em meu rosto com tamanha luxúria. Acreditei que eu lhe tivesse valor, por menor que fosse, mas quando te vi beijando aquele outro, aquele tão parecido consigo, pela primeira vez entrei em frenesi. Não fui até sua casa incendiar seu quarto, não quebrei o estúpido carro e muito menos marquei seu angelical rosto com socos, marquei a mim e a meus pulsos, marquei minha alma tão fragilizada e minha mente enevoada com narcóticos e orações vazias, marquei tudo desde que não fosse você e para que? Nunca realizei trabalhos como o grande fotógrafo que sou, nunca passei no ENEM, nunca tive um trabalho satisfatório e muito menos deixarei a vida para entrar na historia como um grande fascista filho da puta. Fui um humano animalizado, um ser odiado pela sociedade e um pobre adulto que continua preso nos próprios medos infantis. Sou um Lúcifer, que ninguém recordará o nome, um profano atirado do céu dos tolos e uma criança que nunca pode acreditar em contos de fada, porquê morria pelo seu próprio apocalipse chamado fome. Então me odeie, diga me como fui eu que estraguei tudo, como fui um idiota, como fui um pequeno brinquedo nas mãos de Eros que cruzou seu caminho, porque aqui deixo a vida, este pequeno e frágil conceito tão aclamado, tão fútil, para abraçar a morte como a velha amiga alada que nunca deixou de se espreitar por nós.
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Curtos Poemas e Prosas Poéticas
Short StoryLivro com coletâneas de poesias originais com a temática de amor ferido.