DIA 1
As malas em minha frente nunca foram motivo de felicidade para mim, eu nunca gostei de viagens longas ou viagens para lugares sem cidades grandes. E cá estou eu, indo para um lugar no meio do nada a pelo menos 5 horas de distância da minha casa.
Minha mãe murmurava no meu ouvido quão bom o acampamento de verão seria para mim, segundo ela eu veria a vida com mais clareza ao entrar em contato com a natureza.
Eu sou o Mike, e eu sou gay. De que isso importa?
Meus pais descobriram e resolveram que isso era falta de vivência. Decidiram que eu precisava de um tempo sozinho para "me encontrar", "acabar com a escuridão que me corroía", palavras deles.Não que eles tivessem brigado comigo ou algo do tipo, mas eu me lembro de ter ouvido algo como "Você nunca namorou uma garota, como pode saber que gosta de garotos?".
Talvez eles estivessem certos, eu nunca namorei uma garota, aos 17 anos e nunca tive nada nem próximo se um relacionamento. Sem querer me gabar nem nada do tipo, mas, não foi por falta de escolha, só quero que isso aconteça com alguém especial, faz sentido? sem realmente me importar se a pessoa certa tem um pau ou não.
E por decisão de ambos eu vou para um acampamento em outra cidade para "conhecer pessoas novas e me encontrar", o que exatamente eles acham que eu vou encontrar lá? Minha paz interior? Tá de brincadeira não tá?
Mamãe e papai se conheceram no acampamento de verão "Blue and Grey".
-Mike? Se já está pronto vamos logo, o carro já está te esperando. - disse minha mãe mexendo no celular, provavelmente sobre coisas do trabalho.
-Claro, já estou indo Emy. - aviso enquanto pego minha mochila a colocando sobre meus ombros e me despeço em silêncio do meu mundinho particular que também era meu quarto.
-Vai pelo menos uma vez na vida me chamar de mãe? - ela diz fechando o celular e me acompanhando até a porta.
Mamãe era uma pessoa difícil de se lidar, meu pai então, nem se fala. Mas eles em geral eram ótimos como pais, sempre me deram tudo. Talvez de vez em quando tenhamos algumas desavenças, mas quem não tem afinal?
-Quem sabe um dia Sra. Evans - eu digo com um sorriso debochado nos lábios e paro em frente a porta principal.
-Quero que saiba que isso é para o seu bem, eu e seu pai só achamos que você precisa de um tempo pra você. Se decidir que gosta de garotos, então pra mim tudo bem. Eu vou sempre te apoiar em qualquer coisa Mike. - Emy disse vindo em minha direção e me abraçando forte.
-Eu te amo mamãe. - retribuo o abraço ainda mais forte enquanto luto para não chorar, eu sou extremamente sensível a quase todos assuntos e mamãe se importando comigo era um deles.
-Se cuida, Jean vai te deixar lá. Eu te amo Mikezinho.- Ela disse se desvencilhando do abraço e depositando um beijo em minha testa.
Depois da dramática despedida, entrei no carro abaixando a janela e acenando para Emy, até Jean dar partida no carro e eu então me acomodar no banco traseiro, abaixando meus óculos escuros que se encontravam no topo de minha cabeça para meu rosto.
Jean era o motorista de confiança da nossa família a anos, lembro dele sempre existir. Ele era meu fiel cúmplice, de vez em quando eu o subornava para me levar em lugares no meio da noite, na maioria das vezes funcionava.
O caminho foi silencioso, o único barulho ouvido no carro era o do rádio o qual eram reproduzidas músicas horríveis que diziam muito sobre o péssimo gosto musical de Jean, pego meus fones e os conecto no meu ipod, a paisagem da cidade era simplesmente linda, os incontáveis edifícios, sejam eles residenciais ou corporativos, mas quando me dou conta a bela paisagem é totalmente engolida por mato. Talvez eu tenha entrado em desespero. Mato, como as pessoas conseguem se sentir seguras? Tenho a sensação de que a qualquer momento um tigre vai aparecer e me atacar. Fechei a janela com o pensamento de algum animal entrando por ela e me mordendo como um pedaço de carne ambulante.