Do Fogo e da Rocha

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No extremo sul dos firmamentos do mundo se encontra Múspell, a Terra do Fogo, onde fumaça se ajunta nos céus e não permite que um raio de sol sequer ilumine essa terra rochosa e sufocante. Os Gigantes Flamantes, encabeçados por Surt, são a única forma de vida que lá se levanta, seres que queimam em ira e que ardem em desejo de consumir o que lá além de Múspell. Vivem em monotonia, sem conseguir arranjar afazeres que ocupem relevantemente seu tempo. Sem distrações para suas mentes, as usam para maquinar perversões, e se tornaram criaturas circunspectas.

Os gigantes temiam encontrar criaturas mais poderosas além de seus territórios, e julgaram prudente enviarem espiões para que soubessem exatamente o que esperar. Decidiram criar vida através de si. Juntaram pedrinhas com magma, dando-lhes tronco, membros superiores e inferiores, e cabeça. Lamberam-nos com suas línguas flamejantes e se fez barba e cabelo, que se estendiam até os joelhos. Satisfeitos, os gigantes disseram: 

— Eis nossos servos, que se curvarão à nossa vontade. Serão chamados Toergas. 

Essa palavra, em sua língua, se referia a amontoados pequenos de pedrinhas. Cinco deles foram gerados, e seus nomes eram: Tergar, Teur, Tirga, Toaras e Trauga. Após nomeá-los, os gigantes não se demoraram em comunicar aos toergas suas intenções, dizendo: 

— Rumareis o norte, e tudo o quanto vires além desses domínios deverá ser mantido em suas memórias, e quando considerarem ter vido tudo o quanto precisarem, retornareis para seus criadores e os informareis sobre tudo o quanto memoraram. 

E lhes deram algumas machadinhas (de rocha, é claro), para que pudessem perpassar obstáculos e se defender de ameaças, e os toergas as guardaram em suas barbas e cabelos. Se foram, e tudo o que conheciam eram a si mesmos, seus criadores, Múspell, e a sua missão. Fariam de tudo para servir ao que conheciam, e a firmeza desse propósito incendiava seus corações.


Já além dos limites de Múspell, pela primeira vez viram solo plano se espalhar por tudo onde pisavam, e era negro. Os irmãos conheciam aquilo porque viam tal solo em ínfima quantidade em Múspell. Dessa terra se levantavam colunas robustas cheias de ramos secos, e curiosos, os toergas as escalaram com suas machadinhas, e quando atingiram seu topo, puderam observar, perplexos, céus sem fumaça cobertos de pontos cintilantes que acompanhavam uma enorme bola cinzenta. Sentiriam-se maravilhados se o pavor não os tivesse tomado no lugar. 

— Há de cair sobre nós! — um deles disse — Desçamos rapidamente antes que morramos! 

Prontamente desceram das colunas e passaram a correr (sempre ao norte, naturalmente), até que foram parados por uma nova descoberta. O chão à frente deles refletia o céu, e estava sempre em movimento de trás para frente. O pior é que eles não eram capazes de pisar este "chão" como podiam pisar no solo, porque seus pés afundavam, e temiam serem engolidos por esse chão se caminhassem através dele; e de fato seriam. 

Como iriam avançar? Já esquecidos do perigo vindo do alto, andavam em volta desse... como chamariam? Não era chão, mas estava no lugar do chão; um paradoxo insolúvel para os toergas. O que quer que fosse isso, os aborrecia, porque já avançavam por tempo demais em sua volta, e isso ainda não tinha um fim. Desistiram de procurar uma forma de contornar seu obstáculo, e decidiram por atravessá-lo. Se seus pés não podiam pisar sobre esse chão, "talvez outra coisa possa", concluiu Teur. Em profunda reflexão, este tomou um punhado de terra e seus irmãos se animaram com a ideia, elogiando-o. Teur, certo de sua perspicácia, triunfantemente jogou o punhado de terra contra seu objetivo, mas afundou, e ele se envergonhou muito, sendo vaiado por seus irmãos. 

Toaras tomou de sua barba uma machadinha e renovou as esperanças de seus irmãos, mas quando a arremessou no alvo, também afundou, e seus irmãos reagiram da mesma maneira, com Teur incluso. Tirga apontou para uma coluna, que parecia ser a última via. Os irmãos se uniram para cortar as raízes expostas daquela coluna e, e com seus braços fortes, a sacudiram até que desabasse. Tomaram-na em seus ombros, levaram-na em direção ao seu foco, e ao lançarem-na, não afundou! Finalmente poderiam prosseguir. Aquela coluna não demorou para se afastar demais para que a pudessem resgatá-la, mas aquilo não era motivo para seu êxtase ser arrefecido.

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⏰ Última atualização: Aug 25, 2021 ⏰

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