Capítulo Único

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A cruz de madeira do outro lado da parede de seu quarto a encarava impiedosamente. O corpo cálido e pálido de uma representação ocidental de Jesus Cristo, seu sangue escarlate se destacando por seu tronco alvo.
Grace olhou para os olhos sôfregos do homem, que olhava para baixo, olhos tristes e lacrimosos. Ela fechou os olhos e afastou qualquer pensamento de sua cabeça.

O relógio na parede anunciava que já era meia noite. Ele viria em alguns instantes. Sabia que não demoraria muito. Não dormiria aquela noite, assim como nas outras em que o via. Pela manhã iria direto a capela, acenderia uma vela e pediria perdão a Deus. Imaginava o senhor revirando os olhos todas as vezes que a via entrar no recinto como uma Madalena arrependida.

Não sabia dizer o que ele era. Nunca lhe disse, mas a perseguia como seu pior sonho e melhor pesadelo.

Por favorme perdoe por isso Senhor.”

Grace dizia ao que guardou a imagem de Jesus Cristo na gaveta de sua cômoda. Fechou os olhos ao ouvir passos atrás de si.

A perdoe pelo o que ela sabe, não pelo o que faz”

A voz grave falou atrás de si, causando arrepios pelo seu corpo. Seu cheiro preencheu o quarto, sua presença era inigualável. Era ele. 

As velas imediatamente se acenderam, iluminando seu pequeno quarto da escola de freiras.

Ele era um demônio. Talvez o próprio diabo, era o que Grace acreditava. Não havia janelas onde ele pudesse entrar, muito menos ouviu o bater da porta. Sequer sabia se ele era real, ou fruto de sua imaginação fértil e corrompida.
Sentiu seu calor atrás de si. As pontas dos dedos de suas grandes mãos dedilhavam seu pescoço. Grace tinha os olhos fechados, deixou que uma lágrima escorresse ao se entregar a seu toque. Não precisavam de muitas palavras, era como se suas mentes estivessem conectadas. Se entendiam por olhares, toques, e linguagem alguma poderia ser mais poderosa que essa.

Virou -se para ele, encarando seu peito desnudo. A luz banhava seu corpo, que parecia ter sido esculpido por deuses, com um único intuito, corromper almas. Tocou seu peito e olhou em seus olhos verdes, que refletia as chamas das velas.

Ele se curvou para beijar o pescoço alvo de Grace, que pendeu a cabeça para trás, dando mais espaço para suas carícias. Os caninos pontudos por seu pescoço. Era agora.

A lua cheia brilhava aquela noite, em algum lugar por cima das densas nuvens, se recusando a presenciar aquele ato.

A longa e modesta camisola branca rasgada em seu peito, permitindo a ele chupar e morder a carne que antes dele aparecer, era intocada. Ela o sentia por inteiro dentro de si, ao subir e descer sobre sua masculinidade. O prazer em suas feições vampíricas. O fogo em seu olhar estava ali mais uma vez, não refletindo, mas o fogo próprio.
Grace não podia mais segurar os gemidos. O calor entre suas pernas aumentava, esperava poder gozar de novo, o pecado parecia fazer sentido quando estava com ele. Aquele ser sem nome, sem casa, sem destino. Que sempre partia antes do sol surgir no horizonte.

O suor escorria por seu peito, ele a puxou pela cintura, trocando as posições e ficando por cima. Fazendo o corpo dela sumir sob o seu. Tinha os olhos fixo nos dela, ao vê-la se contorcer em um orgasmo. Seu gozo logo depois derramou naquele útero mortal.

Ele ergueu seu corpo, vendo-a o olhar com o cenho franzido, mas logo relaxar o olhar e tocar seu rosto. As mãos delicadas foram beijada apaixonadamente por ele.

“Você quer?”

Não precisava dizer mais nada, ela já havia se decidido. Balançou a cabeça em confirmação. Como se sua pele fosse de papel, ele fincou sua unha sobre seu peito, deixando o sangue escorrer por sua pele alva. Tal imagem a lembrou a que tinha em sua parede. O filho de Deus, a sua frente, sangrando por ela. Queimaria por ele.
Grace pôs os lábios onde saia o sangue, um escuro escarlate, quase preto. Tomou de seu sangue, como tomava o vinho da sacristia. O sangue de Cristo. O gosto metálico em seu palato, o saboreou como se sentir seu sabor fosse uma dádiva. A mão grande dele segurava a nuca dela, para que continuasse a beber de seu sangue, que escorria pelo queixo dela, até seus seios, sujando a camisola branca.
Ele puxou os cabelos loiros dela e a observou, a língua pelos lábios sujos. Um último beijo, o beijou antes da morte, antes que o frio e o azul tomasse conta de seus lábios.

À segurou para si sobre seu colo, e Grace ofereceu seu pescoço.
As nuvens se abriram no céu, e a lua mostrou sua face pela pequena janela no alto do quarto, que servia apenas para ventilação.

Ele se curvou para trás, os cabelos negros caindo por suas costas. Seus olhos verdes sumiram de suas orbes, dando espaço para um branco congelante. Seus caninos rasgaram sua gengiva, ficando triplamente maiores. Olhou para a mulher em seus braços, que parecia tão miúda pela diferença de tamanho dos dois. Ela tinha a feição calma, a cabeça pendendo para trás, seus cabelos loiros como cascata no ar. A veia que pulsava em seu pescoço o seduzia.

Sem mais delongas, ficou seus dentes ali. Grace não conseguiu reprimir o grito de dor, que ecoou pelos corredores do convento. Tentava empurra-lo, mas já era tarde demais. Não tinha como voltar atrás. Ele continuava a drenar de seu corpo, como uma sanguessuga. A deixando cada vez mais fraca e sem força para lutar.

Batidas do outro lado da porta e chamados desesperado clamavam por uma resposta.

Ele segurou o corpo dela pela última vez, vendo a cor sumir de sua pele. Nada como companhia para um sofrimento eterno, a miséria adora compartilhar a caminhada.
A porta fora bruscamente aberta, a madre superiora adentrou o local, com seu candelabro de três velas para iluminar o quarto escuro, onde as velas que estavam acesas mais cedo, tinham o pavio queimado.

Não havia ninguém no pequeno quarto, além do corpo de Grace sobre a cama. Uma neblina densa surgiu do chão e escapou pela pequena janela no alto.
O padre entrou com seu longo casaco preto, olhou a situação preocupado. Mas ao se aproximar do corpo sem vida da jovem freira, deu passos para trás, fazendo o sinal da cruz com os dedos.

“ Nosferatu!”

Repetia a palavra em desespero, apontando para a marca de dentes profunda no pescoço palido de Grace.
A Madre segurava o crucifixo pendurado em seu peito ao que rezava de joelhos ao lado do corpo desfalecido. As outras irmãs saiam de seus dormitórios preocupadas, colocavam suas mãos sobre os lábios, não acreditando no que viam.
Reza alguma pode salva-la de seu destino. O limbo eterno, onde jamais veria a face do sol. Um sacrifício pela carne, pelo sangue e desejo. Deixando o sofrimento interno para o sofrimento eterno.

Precisava dele, apenas dele. Deus, seu Deus de cabelos negros. Seu desejo dentro de si, sua luxúria, sua paixão eterna.

No vigésimo oitavo dia, ao finalmente abrir os olhos, no conforto de seu leito da morte. Levantou-se como uma figura fantasmagórica. Sabia exatamente onde ir, sabia onde seus pés vagavam. Afundando sobre a terra, onde a bainha do vestido branco arrastava ao chão.

E lá estava ele. Camuflando-se na noite com seus trajes negros, oferecendo a mão pálida por entre os túmulos. Mão que segurou a sua, fazendo-a miúda em sua palma, a guiando para a caminhada eterna da morte.

Fim...

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⏰ Última atualização: Aug 25, 2021 ⏰

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